Jodie Foster, Kate Winslet,
Christoph Waltz e John C. Reilly estão no elenco. Em longa claustrofóbico, Roman
Polanski critica a sociedade contemporânea.
Adaptando em "Deus da carnificina" a peça homônima da francesa Yasmina Reza, encenada no Brasil em 2011, o diretor franco-polonês Roman Polanski extraiu o melhor da qualidade do texto, aliando-se à própria autora como corroteirista e a um notável quarteto de atores: Jodie Foster, Kate Winslet, Christoph Waltz e John C. Reilly. O longa estreia no Brasil nesta quinta-feira (7).
Tirando
bom partido do confinamento previsto no texto original, cuja ação se passa na
sala de um apartamento, Polanski desdobra as muitas nuances de um duelo verbal
feroz entre dois casais. Um deles, formado pelos pais de um garoto que agrediu
o filho do outro com um pau, quebrando-lhe dois dentes. Os dois meninos são
colegas de classe.
O
incidente, corriqueiro na aparência, é o rastilho de pólvora que vai incendiar
quatro personagens de origens sociais e culturais diferentes, cada um
representando posições em choque sobre diversas questões explosivas no mundo
atual - o politicamente correto, a mobilização por causas do Terceiro Mundo, as
regras da vida em comunidade, as diferenças entre homens e mulheres, os
sacrifícios pessoais exigidos pelo casamento.
Polanski
faz justiça ao texto, assinando um filme notável por sua intensidade
minimalista ao sustentar a ironia que se infiltra nas entrelinhas. Além de
estar à vontade dentro deste tipo de cinema claustrofóbico, que ele cultivou
tão bem em trabalhos anteriores, como "A faca na água" (1962),
"Repulsa ao sexo" (1965) e "O inquilino" (1976), o diretor
recebeu um inesperado e desagradável reforço adicional: foi durante os sete
meses de sua prisão domiciliar, em seu chalé na Suíça, em 2009, que ele
produziu este roteiro.
A
prisão foi ainda um rescaldo da velha pendência com a Justiça norte-americana,
relativa a um suposto estupro contra uma menor, 35 anos atrás.
Inovando
em relação à montagem teatral, Polanski incorpora ao filme duas sequencias
externas, filmadas num parque de Nova York por um de seus assistentes - já que
ele pode ser preso se voltar ao país -, inclusive a própria briga dos meninos
que deflagra a guerra entre seus pais. Além disso, o diretor acrescenta uma
ácida conversa do casal Nancy (Kate Winslet) e Alan Cowan (Christoph Waltz) no
banheiro, inexistente no teatro.
Filme
e peça apoiam-se fundamentalmente na notável artilharia verbal do texto
original, que serve à perfeição não só para delimitar as diferenças entre os
personagens, como para escancarar como são frágeis as máscaras sociais, como a
educação, a cultura, até os modos à mesa. Não é um panorama muito otimista do
estado geral da civilização, alguns milênios depois da saída dos homens das cavernas,
mas certamente sua ironia é uma digna forma de encará-lo.
(Por
Neusa Barbosa, do Cineweb)
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