Conselho Indigenista
Missionário divulgou nota na qual afirma que o governo de Dilma Rousseff
aprofundou o processo de retração da demarcação de terras indígenas
Da Redação
04/06/2013
O Cimi
(Conselho Indigenista Missionário) divulgou nesta terça-feira, 4, uma nota na qual
critica a política do governo federal quanto aos conflitos em tono de questões
indígenas no Brasil. A nota afirma que o governo de Dilma Rousseff
aprofundou o processo de retração de terras indígenas e acusa o governo federal
de partir do pressuposto de que “os povos indígenas estariam causando os
conflitos e agindo sob o comando de organizações não indígenas”.
Outra queixa apresentada na nota refere-se a falta de diálogo entre a
União e os povos indígenas. De acordo com o CIMI, a presidenta Dilma Rousseff
não recebeu os povos indígenas nenhuma vez durante os dois anos do seu mandato.
Por outro lado, somente no mês de maio, a presidenta se reuniu pelo menos cinco
vezes com representantes dos ruralistas.
Por fim, o Cimi apresenta quatro sugestões para a solução efetiva dos
conflitos que envolvem questões indígenas: destravar os processos de
demarcação, tanto no campo administrativo, quanto no campo judicial; ouvir os
povos indígenas; revogar os próprios instrumentos de ataque aos povos, tais
como, as portarias 419/2011 e 303/2012 e o Decreto 7957/2013; e mobilizar sua
ampla base de apoio no Congresso para evitar os retrocessos almejados pelos
ruralistas quanto aos direitos dos povos.
Leia a íntegra
da nota divulgada pelo Cimi:
O Governo Dilma, o agronegócio e os Povos Indígenas
O Governo Federal dá mostras cada
vez mais evidentes que não entende e que não está disposto a entender os povos
indígenas brasileiros. As medidas anunciadas pelo governo com o intuito de
superar os conflitos em torno das questões indígenas no Brasil parte do
pressuposto equivocado segundo o qual os povos indígenas estariam causando os
conflitos e agindo sob o comando de organizações não indígenas, de modo
especial o Cimi. Além de preconceituosa e racista, uma vez que considera os povos
seres inferiores e incapazes de decisões próprias, o pressuposto é
sociologicamente falho. Julgamos que algumas informações acerca da realidade
que envolve a temática são importantes e suficientes para entendermos a
situação. Vejamos.
O governo Dilma aprofundou o
processo de retração de demarcações das terras indígenas. É o governo que menos
demarca terras indígenas desde a ditadura militar. O governo também tomou
medidas administrativas lesivas aos direitos dos povos, tais como a Portaria
419/11, a Portaria 303/12 e o Decreto 7957/13. A presidente Dilma ainda não
recebeu os povos indígenas para qualquer conversa ao longo destes mais de dois
anos de mandato. No entanto, somente no mês de maio, a presidenta reservou
tempo em sua agenda para ao menos cinco encontros com representantes dos
ruralistas, inimigos históricos dos povos indígenas. Somente em maio, Dilma
esteve, oficialmente, duas vezes reunida com a senadora Kátia Abreu (PSD/TO),
presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA). Os povos indígenas
sabem que a CNA representa o ruralismo anti-indígena, responsável pelo ataque à
legislação ambiental, que resultou na aprovação do novo Código Florestal em
2012, e pelo atual ataque aos seus direitos no Congresso Nacional.
A bancada ruralista ataca os
direitos dos povos por meio de diferentes instrumentos na Câmara dos Deputados
e no Senado Federal. Há mais de uma centena de proposições legislativas
contrárias aos direitos dos povos em tramitação nas duas casas do Congresso.
Dentre elas destacam-se as Propostas de Emendas Constitucionais 215/2000,
038/1999 e 237/2013. Os povos indígenas sabem que os ruralistas querem fazer
com a PEC 215/2000, hoje, o mesmo que fizeram com o Código Florestal em 2012.
Flexibilizar os direitos dos povos e ter nas próprias mãos o poder para não
demarcar as terras indígenas no país.
Os povos indígenas, acampados em
beiras de estradas ou confinados em reservas diminutas, tem demonstrado uma
resistência e uma paciência históricas diante das violências do agronegócio e
da parcimônia do Governo Federal. No entanto, certamente não estão dispostos a
continuar sobrevivendo em condições sub-humanas, morrendo vítimas de
desassistência, de assassinatos, de suicídios e de atropelamentos, exilados de
suas terras até o fim de sua existência enquanto pessoas e povos.
Demarcações paralisadas pelo
Governo Federal e ruralistas no ataque para impedir novas demarcações, rever as
demarcações já realizadas e explorar as terras demarcadas. É isso que os povos
indígenas enxergam na conjuntura político indigenista do Brasil. É contra este
ataque sincronizado do Governo Federal e do agronegócio que os povos reagem na
perspectiva de que seus direitos sejam preservados e efetivados. Uma reação,
portanto, em legítima defesa de suas existências enquanto indivíduos e povos.
Será tão difícil para Dilma e seu
governo entender isso? Sem falar com os povos e falando a todo o momento com o
agronegócio, Dilma e seu governo continuarão sem entender os 305 povos
indígenas existentes em nosso país.
Assim, partindo de um pressuposto
equivocado, o governo adota e anuncia medidas equivocadas para tentar resolver
os conflitos por ele criados.
Protelar reintegrações de posse
não irá resolver o conflito. Os povos já foram expulsos pelos fazendeiros de
suas terras e nem por isso deixaram de lutar pelo retorno às mesmas. Não será a
expulsão pelas forças do Estado, com dois ou três dias de protelação, que
mudará a relação dos povos com suas terras tradicionais.
Mudar o processo de demarcação
das terras indígenas não irá resolver o conflito. Essa medida irá aprofundar
ainda mais a retração nas demarcações, uma das causas centrais destes
conflitos. Os povos indígenas sabem que a protelação das demarcações é parte da
estratégia dos ruralistas, que querem “ganhar tempo” enquanto eles atuam para
ter o poder acerca das não demarcações das terras, que se daria com a aprovação
da PEC 215/2000.
Por fim, amordaçar o Cimi não irá
resolver o conflito. Primeiro porque os povos são autônomos, cientes e senhores
de suas decisões e do que é necessário para defender seus direitos. Segundo
porque o Cimi não deixará de denunciar os ataques desferidos pelo governo e
pelos ruralistas contra os povos indígenas no Brasil. O Cimi faz isso desde
1972 quando foi criado, em plena ditadura militar, e o fará até o último
suspiro de sua existência. O compromisso do Cimi é com a vida dos povos
indígenas.
Para resolver efetivamente os
conflitos que envolvem o tema, o Cimi entende que o governo deve organizar uma
força tarefa para, dentre outras medidas urgentes e estruturantes: a) destravar
os processos de demarcação, tanto no campo administrativo, quanto no campo
judicial; b) ouvir os povos indígenas; c) revogar os próprios instrumentos de
ataque aos povos, tais como, as portarias 419/2011 e 303/2012 e o Decreto
7957/2013; d) mobilizar sua ampla base de apoio no Congresso a fim de que se
evite os retrocessos almejados pelos ruralistas quanto aos direitos dos povos.
Brasília, DF, 03 de junho de
2013.
Conselho Indigenista Missionário
– Cimi
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