Após reunião com ministros, indígenas que ocuparam
Belo Monte afirmam não aceitar consulta sobre hidrelétricas como mera
formalidade, como entendem proposta do governo.
Movimento Xingu Vivo
Publicado
em 05 de junho de 2013
Dois aviões da FAB decolariam da Base Aérea de
Brasília para o Pará na manhã desta quarta-feira, 5, mas seus passageiros, 140
indígenas de seis povos dos rios Xingu, Tapajós e Teles Pires, decidiram não
embarcar e permanecerão no Planalto Central. O grupo está alojado no Centro de
Formação Vicente Cañas, em Luziânia (GO), e em assembleia hoje à tarde
discutirão os próximos passos.
A decisão foi tomada porque os indígenas estão
insatisfeitos com a posição do ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria Geral
da Presidência da República, ante as reivindicações apresentadas durante esta
terça-feira, 4, em reunião no Palácio do Planalto, e em 17 dias de ocupação do
principal canteiro de obras da UHE Belo Monte, em Vitória do Xingu (PA).
“Ele
(Gilberto Carvalho) não assinou nosso documento, nos chamou de mentirosos e
disse que o governo não muda de opinião sobre as usinas. A gente não gostou de
sair do protesto depois de um acordo que prometia diálogo e ver que o governo
insiste em impor seus projetos”,
declarou Josias Munduruku.
Foram nove cartas escritas pelos indígenas
diretamente do canteiro, publicadas aqui, e documentos trocados com o governo
durante o tempo de permanência do protesto. As ocupações e suas reivindicações,
entre elas a presença no canteiro do próprio Carvalho, ganharam holofotes no
Brasil e no mundo.
“Estavam
ironizando a gente. O ministro diz que concorda que Belo Monte teve
erros, mas que quer corrigir lá no Tapajós. Diz que os erros do passado servem
para não cometer erros no futuro. Diz ainda que estamos (indígenas) ensinando o
governo. Gilberto tira sarro da gente ao dizer isso”, indignou-se Jairo Saw, porta voz do cacique geral
Munduruku.
Durante a reunião no Palácio do Planalto, Saw
afirmou que o governo federal negocia a floresta e põe em risco o conhecimento
milenar de povos: “Tudo virou negócio”. De forma serena e se dirigindo a
Gilberto Carvalho, Saw declarou:
“Vocês
(governo) não conversam com ninguém. Isso não é só com os índios. Vocês não
ouvem ninguém. Tão querendo seguir sozinhos e isso não é bom”.
O ministro Carvalho disse que as obras da UHE Belo
Monte seguirão e que o governo não mais admitirá ocupações aos canteiros. Para
isso, segundo o ministro, a presença da Força Nacional nos sítios da obra
deverá recrudescer. Antes, avisou aos indígenas que estavam em casa e que o
governo não é inimigo.
“Aqui
(Palácio do Planalto) não é a nossa casa. Nossa casa é a aldeia, que nós
queremos proteger das usinas do governo, que se porta sim como nosso inimigo.
Se fosse nossa casa, daqui não sairia esse tipo de projeto”, atacou Valdenir Munduruku.
Os protestos dos indígenas se estenderam contra a
PEC 215, da Câmara Federal, que transfere do Executivo para o Legislativo da
demarcação de terras indígenas, e a Portaria 303, que estende para as demais
terras indígenas as condicionantes, não votadas pelo STF, da Terra Indígena
Raposa Serra do Sol.
Proposta
do governo
Gilberto Carvalho propôs aos indígenas a ida de uma equipe do governo, num prazo de 20 dias, à aldeia Sai Cinza, do povo Munduruku, município de Jacareacanga (PA). A visita seria para apresentar resultados de ações interministeriais às comunidades, sobretudo com relação aos estragos causados pela Operação Eldorado, da Polícia Federal, que em novembro de 2012 terminou com a morte de Adenilson Munduruku.
“Não
se trata de barcos, mas da morte de um parente nosso pelas mãos de policiais
federais. Queremos que o culpado seja punido”, frisou Valdenir Munduruku.
Carvalho disse que, para o inquérito do governo ser concluído, falta apenas que
os familiares de Adenilson autorizem a exumação do corpo. Porém, a
Vice-Procuradora Geral da República, Deborah Duprat, atualizou o ministro: “A
família já autorizou e o MPF indicará dois peritos para realizar o laudo”.
Por fim, o ministro Carvalho propôs que nessa
visita se iniciem as tratativas para a consulta prévia dos indígenas do rio
Tapajós sobre os empreendimentos que o governo pretende realizar. A
Vice-Procuradora lembrou que determinação judicial exige a consulta prévia para
a continuidade dos trabalhos por parte do governo. Os indígenas, entretanto,
entendem que a consulta não é simples formalidade, e acreditam que ela pode
vetar que uma futura usina impacte seus territórios e comunidades.
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