quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Belo Monte: Norte Energia se recusa a obedecer condicionante indígena e MPF quer punição


Apesar da licença de Belo Monte obrigar expressamente que o empreendedor compre terras para abrigar os Juruna do Km 17, a empresa afirma que a obrigação não é sua.


O Ministério Público Federal (MPF) recomendou à Fundação Nacional do Índio que comunique oficialmente ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) que a Norte Energia S.A está descumprindo a obrigação condicionante da obra de Belo Monte que trata da aquisição de terras para os índios Juruna do Km 17. A obrigação é consequência das condições impostas pela Licença de Instalação concedida para  a obra, mas a Norte Energia enviou documento ao MPF afirmando que “não lhe cabe a responsabilidade pela aquisição de terras”.

No documento, assinado por Arlindo Gomes Miranda, da assessoria jurídica da presidência da Norte Energia, é citado o exato trecho do parecer da Funai sobre Belo Monte que obriga a aquisição de terras. Diz o parecer, listando ações que deveriam ser concretizadas em favor dos Juruna do Km 17 antes de qualquer obra da usina: “ aquisição de terras pelo empreendedor, assim como a adequação dos serviços de saúde também seriam ações a serem efetivamente implementadas antes da instalação do empreendimento”. Mesmo assim, o assessor chega à conclusão de que a aquisição de áreas não é obrigação do empreendedor.

O mesmo parecer diz que cabe ao estado a regularização fundiária da Terra Indígena Juruna do Km 17. Para o MPF, o parecer apenas repisa a previsão legal para a regularização fundiária. Mas obriga expressamente a compra de mais terras para os indígenas, para afastá-los dos impactos diretos do trânsito na rodovia, causados pela obra de Belo Monte. “Não adquirida a área pelo empreendedor, devem ser impostas as consequências do descumprimento da condicionante, na proporção do prejuízo acarretado à comunidade envolvida”, diz a recomendação do MPF à Funai.

É necessário que a Funai comunique oficialmente ao Ibama o descumprimento da condicionante, para que o órgão licenciador possa tomar as providências necessárias para proteger os direitos das populações impactadas por Belo Monte. Para o MPF, é preocupante que a Norte Energia se negue a cumprir obrigação imposta pelo Ibama. “Se a empresa discorda da obrigação, poderia recorrer formalmente contra isso nas instâncias  administrativas, jamais se recusar como se tivesse a palavra soberana no licenciamento e não o Ibama.

Os índios Juruna do Km 17 estão entre as populações indígenas mais direta e drasticamente afetadas por Belo Monte. Eles são conhecidos assim por morarem no km 17 da rodovia que liga Altamira à Vitória do Xingu e nunca tiveram seu território reconhecido. Por isso mesmo, tiveram atenção especial no licenciamento da usina. A Fundação Nacional do Índio determinou, como condições para que a obra fosse considerada viável, a demarcação do território e também a aquisição de novas terras para eles. Como vivem na margem da rodovia e estão sendo duramente prejudicados pelo aumento de tráfego que a obra provoca, o aumento do território é necessário para realocar as casas que ficam próximas da estrada.

Trecho dos Estudos de Impacto de Belo Monte que trata dos Juruna do Km 17

Íntegra da recomendação do MPF

Fonte: Ministério Público Federal no Pará

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

"Não aceitaremos mais deste governo ataques aos nossos direitos"

 Em carta aberta, índios pedem o arquivamento dos projetos "de extermínio dos povos indígenas" em tramitação no Executivo e no Legislativo

13/08/2013
do Cimi

Cerca de 150 indígenas realizaram um protesto às portas do Palácio do Planalto, em Brasília (DF), na manhã desta terça-feira (13). Depois de tentativa de ocupação, impedida pelos seguranças, o movimento seguiu em protesto no espelho d'água e solicitou audiência com a presidenta Dilma Rousseff e ministros. A Secretaria-geral da Presidência da República se comprometeu a responder ao movimento indígena ainda na tarde de hoje.
O objetivo do ato foi se manifestar contra o PLP 227 e a PEC 215, com tramitações na Câmara Federal, além da Portaria 303 e a alteração no procedimento de demarcação de terras, medidas do Executivo. Os povos reivindicarão ainda a retomada das demarcações e homologações de terras paralisadas pelo governo federal. Os indígenas em protesto soltaram carta pública. Leia abaixo.
O protesto foi organizado pela Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia (Finpat) e Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas na Bahia (Mupoiba), organizações compostas pelos Pataxó, Kaimbé, Tupinambá, Tumbalalá, Iriri, Potiguara, tapuia, Pataxó Hã-Hã-Hãe Serra do Ramalho, Tuxá, Tupibambá Belmonte, Kambiwá, Xakriabá de Cocos, Pankararé, Pankaru, Kantaruré e Truká. Outros povos presentes são: Kaingang (RS), Guarani Ñandeva (RS), Guarani e Kaiowá (MS), Terena (MS), Huni Kuĩ (AC), Guajajara (MA), Fulni-ô (PE) e Tupinikim (ES). Outras comitivas devem chegar até amanhã, mas ainda não há confirmação.
Conforme as lideranças indígenas, a mobilização é fruto da atual conjuntura. Na Câmara Federal, a bancada ruralista pressiona para a tramitação de duas propostas consideradas negativas para a efetivação do direito a posse das terras tradicionais pelos povos indígenas, afetando também quilombolas e a criação de áreas de proteção ambiental.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215 visa transferir do Executivo para o Legislativo a demarcação e homologação de terras tradicionais, tanto para indígenas quanto para quilombolas, assim como a criação de áreas de proteção.
Já o Projeto de Lei Complementar 227 pretende criar lei complementar ao artigo 231 da Constituição Federal – “Dos Índios” – apontando exceções ao direito de uso exclusivo dos indígenas das terras tradicionais, em caso de relevante interesse público da União. Dentre as tais exceções está a exploração dos territórios indígenas pela rede do agronegócio, empresas de mineração, além da construção de empreendimentos ligados aos interesses das esferas de governo – federal, estadual e municipal.
Se no Legislativo a investida contra o direito dos povos indígenas parte da maior bancada, a ruralista, no Executivo os dois principais ataques partem diretamente do Palácio do Planalto. A Portaria 303, da Advocacia-Geral da União (AGU), suspensa até o julgamento das condicionantes da Terra Indígena Raposa Serra do Sol (RR) pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), permite a construção de grandes empreendimentos em terras indígenas sem consulta prévia aos povos afetados, entre outras medidas.
A morosidade nas demarcações também é outro problema.
Enquanto Fernando Henrique Cardoso publicou 118 portarias declaratórias e 145 homologações, no mesmo período Luiz Inácio Lula da Silva demarcou 70 terras e homologou 80. Já o governo Dilma indica que não chegará perto nem de seu antecessor: até agora foram 11 portarias e 11 homologações. Os dados são do Banco de Terras do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). Ou seja, em pouco mais de dez anos de PT no governo, 91 homologações e 81 demarcações. Em dois anos, Fernando Collor (1990-1992) homologou 112 e demarcou 58 terras.

Carta Aberta dos Povos Indígenas da Bahia

à Exmª. Srª. Dilma Rousseff, Presidenta da República Federativa do Brasil

C/C:
Ao Ilmº. Vagner Freitas de Moraes, Presidente Nacional da Central Única dos Trabalhadores
À Exmª. Srª. Gleisi Hoffmann, Ministra Chefe da Casa Civil do Brasil
Ao Exmº. Srº. Paulo Maudos, Secretário Nacional de Articulação Social da Presidência da República
Ao Exmº. José Eduardo Cardoso, Ministro do Estado da Justiça
Ao Exmº. Srº. Alexandre Padilha, Ministro de Estado da Saúde
Ao Exmº. Srº. Aloísio Mercadante, Ministro de Estado da Educação
A Ilmª. Srª. Maria Augusta, Presidente da Fundação Nacional do Índio - FUNAI
Ao Exmº. Srº. Renan Calheiros, Presidente do Senado Federal
Ao Exmº. Srº. Henrique Eduardo Alves, Presidente da Câmara dos Deputados
À Ilmª. Srª. Débora Duprat, 6ª. Câmara do Ministério Público Federal

Senhora Presidenta,
Ao cumprimentá-la cordialmente, aproveitamos o ensejo para expressar os nossos sinceros votos de estima e confiança. O Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígena da Bahia – MUPOIBA, em conformidade ao que estabelece o Estatuto Social desta organização, especialmente ao que tange a articulação e unificação da luta dos Povos e Organizações indígenas da Bahia, na promoção dos direitos indígenas, com abrangência nas 143 comunidades indígenas de toda Bahia das 22 etinias sedo elas Tupinambá, Pataxó, Pataxó Hãhãhãe, Kiriri, Tuxá, Tumbalalá, Atikum, Pakararé, Kaimbé, Pankarú, Pakararú, Xukuru-Kariri, Kariri-Xóco-Fulni-ô, Truká, Funi-ô, Potiguara, Tapuia, Kambiwá, Kapinawá, Xacriabá, Payaya, Kantaruré e Tuxi, totalizando um contingente de mais 56.800 índios distribuídos em 33 municípios, vem à presença de Vossa Excelência, através de seu Coordenador, Caciques e Lideranças abaixo subscritos, expressar as nossas preocupações quanto a garantia dos nossos direitos Constitucionalmente garantidos pois hoje vivemos momentos de incertezas quanto a manutenção dos mesmo, pois apesar das comunidades indígenas do Estado da Bahia ter lutado para a construção deste Governo vemos claramente que o mesmo tem sido um dos principais atores nas investidas contra os nossos direitos tais afirmações são baseadas nas medidas tomadas por este governo a exemplos da Portaria 303 da AGU, solicitação de parecer da Embrapa nas Demarcações das Terras Indígenas, uma clara manobra para inviabilização da demarcação das Terras Indígenas, solicitação pela Ministra Gleisi Hoffman ao Ministro da Justiça para paralisação das demarcações nos Estados do Paraná e Rio Grade do Sul, tais medidas mostra a verdadeira face deste governo com a questão indígena.
Neste contexto, o MUPOIBA, vem GRITAR VEEMENTEMENTE que não aceitará mais deste governo ataques aos nossos direitos, pois a partir deste momento estes ataques serão respondidos com a mesma firmeza que os mesmo forem feitos, deixamos claro que não aceitaremos de forma alguma por parte do Poder Legislativo Federal que os mesmos prossigam com os vários Projetos de Lei de Emenda a Constituição (PECs): como é o caso das PECs 038/1999; 215/2000 e PLP 227/2012.
O MUPOIBA no uso das suas atribuições legais na defesa dos direitos indígenas vem pelo presente solicitar da Presidência da República, posicionamento URGENTE, na Demarcação e Regularização Fundiária das Terras Indígenas, melhoria da qualidade na Educação e Saúde, pois estes Direitos são restritos devido à indefinição jurídica das Terras Indígenas. Por outro lado o órgão indigenista brasileiro, a Fundação Nacional do Índio – FUNAI vêm perdendo as suas atribuições institucionais na execução e coordenação da Política Indígena Brasileira. Pois, a População e Terras Indígenas não devem ficar a mercê de imobiliárias, latifundiários, agronegócios, coronéis e grileiros de terras neste contesto solicitamos:
Criação de Grupo de Trabalho – GT para estudo de identificação dos Territórios Indígenas Atikum Nova Vida, Kambiwá Reviver, Atikum Bento 1, Xacriabá Cocôs, Potyguará Muquém, Neo-Pankararé, Pankararé Rodelas, Atikum Nova Esperança, Atikum Curaça, Kapinawá Serra do Ramalho, Funi-ô Serra do Ramalho, Tapuya Muquem, Truká Kamixá e Pataxó Hãhãhãe Serra do Ramalho.
Estudos Antropológicos: Revisão de Limites dos Territórios Indígenas Kiriri Banzaê, Pankarú Muquém e Kiriri de Muquém;
Arquivamento Imediato das Propostas de Emendas a Constituição (PECs 038/1999, 215/2000 e PLP 227/2012);
Revogação Imediata da Portaria 303 da AGU;
Assinatura das Portarias Declaratórias dos Territórios Indígenas: Barra Velha, Tupinambá de Olivença e Terra Indígena Tumbalalá;
Assinatura do Decreto de Desapropriação por Interesse Social, Gleba C, Terra Indígena Pataxó Coroa Vermelha;
Decreto de Homologação da Terra Indígena Pataxó de Aldeia Velha;
Defesa Imediata nos Processos de Reintegração de Posse em Desfavor das Comunidades Indígenas Pataxó e Tupinambá do Sul e Extremo Sul da Bahia;
Conclusão e Publicação de Estudos Antropológicos: Revisão de Limites dos Territórios Indígenas Pataxó Coroa Vermelha, Mata Medonha e Conclusão e Publicação do Relatório Antropológico do Território Pataxó Kay/Pequi;
Criação de Grupo de Trabalho – GT para reestudo de identificação do Território Indígena Tupinambá de Itapebi/BA
Agilidade no Processo Jurídico da Portaria Declaratória do Território Tupinambá de Belmonte/BA;
Articulação e Efetivação do Termo de Acordo de Gestão Compartilha do Território Kay/Pequi;
Acordo entre FUNAI e INCRA para a retirada imediata de Assentamento Terra Nova do Território Barra Velha.

MELHORIA QUALIDADE DE ATENDIMENTO A SAÚDE INDÍGENA
Aporte de recursos financeiros para execução das ações de atendimento a Saúde Indígena (compra de medicamentos, hospedagem, etc.);
Aporte de recursos financeiros para Infraestrutura (Construção e Reforma de PSFIs, poços artesianos, banheiros entre outros) nas comunidades indígenas;
Ampliação de Equipes Multidisciplinares;
Revisão dos contratos de locação de veículos em especial com relação à cobertura nos finais de semanas e durante a troca de veículos;
Ampliação do quadro de motoristas;
Criação dos Cargos (DAS) de Chefia dos Polos Base do Distrito Sanitário Indígena DSEI/BA;
Contratação de Pessoal Administrativo para o Distrito Sanitário Especial Indígena – DSEI/BA;

MELHORIA DA EDUCAÇÃO BÁSICA E SUPERIOR
Construção de Escolas Indígenas;
Disponibilização de Cursos Técnicos nas Escolas Indígenas de Ensino Médio;
Garantia de acesso aos índios a Bolsa Universitária Indígena;
Apoio e ampliação dos Cursos de Licenciatura Intercultura Indígena;
Criação da Universidade Indígena da Bahia;
Disponibilização de Cursos de Ensino Superior Modular nas Terras Indígenas.

FORTALECIMENTO DA FUNAI
Permanência no Executivo da Atribuição de Demarcação e Regularização Fundiária das Terras Indígenas;
Permanência das Atribuições da FUNAI nos Processos Administrativos e Antropológicos de Demarcação e Regularização Fundiária das Terras Indígenas;
Não aceitamos a interveniência de outros órgãos do Governo Federal (EMBRAPA, MDA, MDS, MC) nos processos de Demarcação de Terras Indígenas no Brasil;
Dotação orçamentária para regularização fundiária das Terras Indígenas;
Lotação por tempo permanente de 02 (dois) Procuradores Federais na Coordenação Executiva FUNAI do Sul da Bahia e Regional do São Francisco;
Fortalecimento das Coordenações Técnicas Regionais e Locais;
Criação de uma Coordenação Técnica de Articulação Política da FUNAI, na Capital Salvador/BA;
Criação de uma Coordenação Técnica Local FUNAI, no município de Santa Cruz Cabrália/BA;
Criação de uma Coordenação Técnica Local FUNAI, no município de Prado/BA;
Melhoria da Estruturação Física da FUNAI (equipamentos, locação de espaço para funcionamento, internet, telefone entre outros);
Concurso Público da FUNAI para provimento de quadro pessoal;
Aporte de recursos financeiros para promoção de atividade produtiva indígena;
Na certeza de poder contar com total apoio e compreensão de Vossa Excelência, desde já agradecemos pela atenção para aprofundar o diálogo, concretizar ações efetivas e compor a justiça histórica cabível aos Povos Indígenas na Bahia.

Brasília, 13 de agosto de 2013
Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas na Bahia (Mupoiba)

Foto: Wilson Dias/ABr

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Ibama marca audiências públicas da UHE São Manoel para emissão da LP

APs acontecerão nos dias 27, 29 e 30 de setembro em municípios do Mato Grosso e do Pará

Carolina Medeiros, da Agência CanalEnergia, Meio Ambiente
12/08/2013

O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis marcou as audiências públicas para discussão do Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental da hidrelétrica São Manoel. As audiências ocorrerão nos dias 27, 29 e 30 de setembro nas cidades de Paranaíta, em Mato Grosso, Jacareacanga e Itaituba, no Pará, respectivamente. A Empresa de Pesquisa Energética pretende licitar a usina no leilão A-5 de dezembro e, para isso, precisa da realização das audiências públicas para a emissão da licença prévia.
A usina, a ser instalada no rio Teles Pires, terá potência instalada de 700 MW, com eixo de barramento a aproximadamente 1.200 metros acima da foz do rio Apiacás. O barramento formará um reservatório de área total de 63,96 km², que atingirá áreas dos municípios de Paranaíta e Jacareacanga.

Em Paranaíta, a audiência ocorrerá a partir das 18 horas, no salão paroquial, situado à Avenida Ayrton Senna da Silva s/n, Centro. Em Jacareacanga, a audiência será a partir das 16 horas, no Signus Club, situado à Av. Milton Rodrigues da Silvs, s/n, Centro. Já em Itaituba, a AP acontecerá a partir das 18 horas, no Parque de Exposições Hélio da Mota Gueiros, na Rodovia Transamazônica, km 5, Jardim Aeroporto.

Governo não cumpre palavra e avança com estudos de hidrelétricas no Tapajós



Menos de um mês após garantir aos Munduruku que paralisaria as pesquisas para elaboração dos estudos de hidrelétricas no Rio Tapajós (PA), o governo federal descumpre sua palavra e, no dia 05 de julho de 2013, autoriza a entrada de pesquisadores para realização dos estudos. Com a ausência da consulta prévia aos povos indígenas, o governo desrespeita mais uma vez a Convenção 169 da OIT da qual o Brasil é signatário, e agride de forma violenta o processo democrático.

Desmandos e autoritarismo marcam encontro indígena em Jacareacanga, sul do Pará


Por Claudemir Monteiro*

Parecia Estado de Sítio. Policiais militares e da força tática fortemente armados, agentes da Prefeitura espalhados por todo lugar, políticos e o próprio prefeito monitorando e esbravejando pelos cantos, proibindo e deixando de proibir. Acreditem, era uma reunião de caciques e lideranças indígenas que aconteceu no último 3 de agosto. A cidade: Jacareacanga, povo Munduruku, sul do Pará.

Era perto de 8 horas da manhã quando uma ordem, estabelecida entre indígenas da mesa coordenadora e autoridades locais, autorizava apenas caciques a entrar na reunião. Demais lideranças estavam dispensadas, o que não foi aceito e um novo acordo garantiu a participação de todos.

Acomodados no ginásio poliesportivo da cidade, foi anunciado por uma liderança indígena (que coordenou quase todo o evento) que não seria permitido o uso de faixas, e apenas a TV Buré, afiliada ao SBT, pertencente ao prefeito da Cidade, e o Conselho Indigenista Missionário (cimi) podiam fazer registros fotográficos do evento.

Um pouco surpreso e sem entender a razão do Cimi ter essa exclusividade, busquei uma máquina fotográfica para cobrir o evento. Dirigi-me a uma militante do Comitê Metropolitano Xingu Vivo, que se encontrava na arquibancada, para emprestar a máquina, mas percebi que pelo menos oito pessoas me observavam (quatro policiais, o prefeito e três capangas). Me apresentei como membro do Cimi. O próprio prefeito, que atende pelo nome de Raulino, do PT, me disse: “Você tem autorização, mas esta máquina não. Pois pertence àquela moça que há algumas semanas esteve fazendo baderna na cidade”. Tentei explicar que aquela moça teria vindo pela primeira vez, mas num tom neurótico o prefeito gritou: "Se esta máquina for usada eu mando quebrar”.

Disse isso sob o auspício dos policiais, cujo comandante Anderson me alertou que o papel da polícia estava em proteger a vida dos ‘baderneiros’, pois da ultima vez que estiveram na cidade tinham causado muitos tumultos e o povo queria linchá-los, então seria bom controlar os ânimos. Voltei com a máquina e devolvi para a dona e disse para que tomasse cuidado, pois poderiam cumprir a ameaça de quebrar. E de fato quase o fizeram. Pois o capanga do prefeito que atende por nome de “Perito” tentou de forma violenta arrancar a máquina do braço da militante, sob olhares da polícia, cuja função, segundo eles, era de proteger. Só não o fez porque um grupo de guerreiros levantou e foi em cima do agressor, que se sentindo pressionado saiu e sumiu do ginásio.

Na mesa de abertura do evento estavam presentes o cacique geral dos Munduruku, o presidente da Associação Pusuru, Cândido Munduruku, o comandante da Polícia Militar, comandante da Polícia Tática, o prefeito, um representante da Funai e , por fim, um representante da Sesai.

Patrocínio da prefeitura
Na fala do prefeito já mostrava quem era o patrocinador do evento. A reunião tinha apoio da Prefeitura, porque ele acreditava na unidade entre não índios e os Munduruku. Disse que esperava que na reunião os indígenas definissem pelo desenvolvimento do município, o que seria bom para todos. E disse que todos eram bem vindos, menos aqueles que vieram com intenção de tumultuar, num recado velado às ONGs que observavam o evento.

O discurso era intimidador e voltado exclusivamente para os indígenas: os ‘atos de vandalismo’ acontecidos no último mês de junho, o tumulto criado na cidade, a depredação de prédios públicos, eram crimes e que poderiam levar os índios à prisão, pois a lei dos brancos serve para os índios. Notava-se que se tratava de um discurso reproduzido, adequadamente, como professa o governo petista.

Aliás, após desfeita a mesa das autoridades, se compôs a mesa indígena que avaliaria os últimos acontecimentos e buscaria ‘outro rumo’ para a PUSURU. Porém o mais intrigante foi a presença de meia em meia hora do sr. Ivanio (assessor do prefeito e secretário de assuntos indígenas da prefeitura) na mesa coordenadora. Como um fiscal, um monitor, mostrando e dizendo que ele estava ali, bem junto, quase colado na mesa.

Do discurso para a prática
Lideranças indígenas, que tinham pedido faixas para expressar indignação contra o processo do projeto hidrelétrico de Tapajós, foram aos poucos colocando as mesmas no intervalo da manhã para o almoço. Mais ou menos próximo das duas da tarde, o Sr. Ivanio e quatro policiais da Rota arrancaram as faixas. Alguns indígenas presentes se queixaram, mas o Sr. Ivanio falava alto “quem não se adequar às condições, que assuma as despesas do evento”. Estava se referindo às quase duzentas cadeiras e serviço de som que pertencem ao próprio. Só não se sabe se foi gasto dinheiro público da prefeitura no material.

Nesse mesmo momento um casal de estudiosos, ele antropólogo americano e ela uma estudante italiana, que acompanhavam o grupo do Tapajós Vivo, chegaram ao momento em que arrancavam as faixas. Perceberam que havia algo incomum e decidiram sair, mas foram parados pelos policias que pediram para olhar suas máquinas. Não bastou dizer que não registraram nada. Sem dó apagaram (os policias) todos os registros fotográficos do casal. 

Dois membros do Fórum da Amazônia Oriental (FAOR) foram parados por pessoas não identificadas que perguntavam sobre a identidade e origem do grupo. O membro do FAOR se apresentou dizendo seu nome e a origem, de Belém. Assim mesmo foram indagados sobre se não tinham o que fazer para estar naquele evento. Foi quando o militante do FAOR apresentou a carta convite da PUSURU justificando sua presença.

Se formos elencar as várias outras atitudes de estranhos, policiais, de agentes da prefeitura vamos fazer uma dissertação de autoritarismos. Mas o certo é que toda coerção fez efeito sobre os indígenas. Os Munduruku saíram do ginásio, depois de quase 20 horas, com uma “nova PUSURU”. Mantendo o atual presidente e incluindo três novos membros. Uma PUSURU adequada ao jeito “Raulino de ser”. Que não brigue com o governo do PT e mais aberta para dialogar com o governo sobre a hidrelétrica. O sempre coordenador indígena do evento chamou a atenção dos observadores dizendo: “Somente esses quatro tem o papel de representar a PUSURU e fazer documentos com papel timbrado”.

Em conversas com pelo menos 30 caciques após o evento, ficou nítida a confirmação do que acabo de escrever. Diziam que não sabiam o que vinham fazer nessa reunião. Outros diziam: “Fiquei calado por medo de não ter combustível para voltar para casa”; ou: “Tinham muitos policias por lá”; ou ainda: “O pessoal do prefeito tava olhando”. Mas o certo é que há insatisfações. Não sei bem certo se a PUSURU vai conseguir dominar e representar essas insatisfações, cujas vozes reclamam e não aceitam nenhum diálogo com o governo em relação às hidrelétricas.

Conclusão
Na condição de observador, a conclusão que apresento foi de uma armação entre prefeito, vereadores ligados à base, incluindo alguns vereadores indígenas, e militantes para anular a ação dos guerreiros Munduruku contra o processo hidrelétrico no rio Tapajós, imposto pelo governo Dilma, assim como foi feito com Belo Monte, no rio Xingu.

Primeiro era necessário trazer os caciques para Jacareacanga, mudar a associação e enquadrar os indígenas revoltosos. Conseguiram puxar essa reunião indígena para Jacareacanga. É bem sabido que Jacareacanga é uma cidade caracteristicamente indígena. 

Porém, no meu entender indigenista, uma reunião de assuntos internos se faz numa aldeia, longe e sem interferências de terceiros. E não foi isso que aconteceu nesta reunião do dia 3 de agosto. A interferência na reunião foi descaradamente imoral, baseada em coerções com polícia fortemente armada, com funcionários e até capangas do prefeito espalhados por todo o ginásio, com um secretario de assuntos indígenas, inspetor das decisões, e com indígenas com discursos afinados com o governo local. Não poderia sair outra coisa a não ser uma conformação adequada para reatar um diálogo com o governo do PT, que tinha na PUSURU uma resistência sem igual e vista nos últimos meses. Agora só nos resta saber se vão conseguir enquadrar os indígenas revoltosos.


Fonte da notícia: Cimi Regional Norte II

sábado, 10 de agosto de 2013

Caciques e lideranças Munduruku denunciam intervenção do governo federal para forçar construção de usina

Por Renato Santana, de Brasília (DF), Cimi

Foto de Jairo Saw, porta-voz do cacique geral Munduruku.

Depois de intervenção protagonizada pelo Poder Público de Jacareacanga, município ao sul do estado do Pará, caciques e lideranças afirmam, em nota pública, que o povo Munduruku seguirá contrário à construção de usinas hidrelétricas no rio Tapajós, cujas águas cortam o território indígena e se barradas inundarão aldeias, áreas de subsistência e locais sagrados do povo.
Para as lideranças Munduruku, o governo federal e demais grupos interessados, que usam a prefeitura e os vereadores para dividir o povo e facilitar a entrada do projeto de usina hidrelétrica no Tapajós. “Querem colocar pessoas que são a favor (da usina) para ter o controle. Fizeram reunião para enviar relatório ao governo”, denuncia Jairo Saw, porta-voz do cacique geral Munduruku.  
No último dia 3, uma reunião para avaliar o movimento de resistência aos projetos da usina foi convocada. Cerca de 83 caciques desceram das aldeias para Jacareacanga. “A pauta dizia que era para avaliar os últimos acontecimentos do movimento. Era para fortalecer a luta contra os grandes projetos e a organização dos Munduruku de uma forma geral”, explica Saw.
Porém, o prefeito da cidade, Raulien Queiroz, filiado ao PT, policiais fortemente armados, vereadores e assessores políticos garantiram a inversão da pauta: o encontro passou a ser para mudar a direção da Associação Pusuru. Capangas proibiam registros fotográficos, quem chegasse era revistado e faixas contra o projeto hidrelétrico foram proibidas de serem abertas.
A Associação Pusuru se tornou um dos principais instrumentos do povo Munduruku de mobilização contra empreendimentos hidrelétricos nos rios da Amazônia. Entre abril e maio, os Munduruku ocuparam por duas vezes o principal canteiro da UHE Belo Monte, no rio Xingu, e em junho realizaram manifestações em Brasília e detiveram a ação de técnicos que trabalhavam no interior do território indígena para preparar relatório ambiental em prol da construção da usina. Protestaram também na Câmara dos Vereadores de Jacareacanga, reivindicando um posicionamento contrário dos edis ante o projeto hidrelétrico do governo federal.
Todas as ações foram criticadas pelo prefeito durante a reunião, sem possibilidade de defesa por parte dos Munduruku. “Os caciques e lideranças não foram permitidos de falar e o tempo estava restrito em poucos minutos. Não existe isso em nossas reuniões. A maioria não entendeu o que estava sendo discutido, porque era para se discutir outra coisa”, destaca Jairo Saw. Na nota, o movimento aponta que o golpe foi dado por políticos da cidade que visam acabar com a resistência ao projeto hidrelétrico, mas que “não conseguiram acabar porque somos maioria”.
Maria Leusa Munduruku acabou retirada da Associação Pusuru, da qual era vice-presidente. Passou cerca de dois meses fora da aldeia, entre as ocupações ao canteiro de Belo Monte e as mobilizações de Brasília. Sempre foi contra a usina e presenciou o secretário de Assuntos Indígenas de Jacareacanga ameaçando de que não garantiria o combustível dos barcos para a volta das lideranças às comunidades se as faixas contra a usina não fossem retiradas. “O cacique com quem ele falava se intimidou. Eram muitos policiais, capangas. Fomos todos pegos de surpresa”, afirma.

Estratégia que vem de cima   
Não é a primeira vez que o Poder Público de Jacareacanga é usado como via de acesso para a imposição de projetos nas terras Munduruku, aquém às vontades e opiniões do povo. Em agosto de 2011, representantes da empresa Celestial Green, ligada ao mercado de carbono e REDD, se reuniram com vereadores para assinar um contrato que concedia direitos de uso absoluto das terras indígenas à empresa durante 30 anos. Os Munduruku não aceitaram, denunciaram às autoridades e negaram qualquer trato.
Para Jairo Saw, a situação presente não é diferente: o governo federal age pelo Poder Público local para impor o projeto de usina nas terras do povo. “A ideia do governo é acabar com a nossa cultura, dividir o povo e fazer a integração social do índio na sociedade que o governo controla. Se o Munduruku está reagindo é para manter a cultura; se o povo se aquietar é porque desapareceram as tradições e a língua”, explica o assessor do cacique geral.
Outro ponto destacado por Saw é o local da reunião. Para ele, a armação começa quando foi decidida a cidade para o encontro. “Eles (prefeito e vereadores) tinham medo de que acontecesse nas aldeias e as lideranças se revoltassem com a atitude dos vereadores. Em Jacareacanga eles podiam chamar a polícia a qualquer momento, intimidando os caciques e lideranças”, analisa Saw. O encontro foi arcado, segundo a liderança, pelos próprios gestores municipais. Dos 83 caciques presentes, apenas seis tiveram direito a fala.
Num outro sentido, as lideranças Munduruku apontam a ingerência dos vereadores indígenas. Saw explica que mesmo que eleitos com votos Munduruku, os parlamentares indígenas não representam o povo e tampouco podem falar e decidir pelo povo, tal como aconteceu na questão do contrato com a Celestial Green e agora no caso da construção da usina. A decisão dos Munduruku é uma só: contra qualquer usina nos rios da Amazônia, sobretudo no Tapajós.
“Então eles precisam respeitar isso. Governo federal tem que discutir com a gente, nossa opinião é que vale. Da outra vez foi a mesma coisa: Paulo Maldos (da Secretaria Geral da Presidência da República) se reuniu com os vereadores, enquanto os caciques ficaram esperando por ele na aldeia Sai Cinza”, frisa Saw.

Os vereadores indígenas alegaram que o movimento Munduruku, em suas ações, sobretudo na retirada dos técnicos do interior da terra indígena, “passa por cima” do cacique geral. Saw rechaça a acusação: “Assessoro o cacique geral e ele acompanha o movimento de resistência, assim como os outros caciques. Inclusive ele esteve presente aqui em Jacareacanga para que os guerreiros mantivessem o controle e ele ter como orientar”.

Povo Munduruku lança Movimento Independente contra Barragens



sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Índios na cidade: desafios e conquistas

O vídeo produzido pela Comissão Pró-Índio de São Paulo reúne múltiplas vozes de distintos povos indígenas, traz experiências concretas de políticas públicas que vêm contribuindo para efetivar os direitos individuais e coletivos dos índios que vivem em contextos urbanos. 

Índios das cidades de Manaus, Boa Vista, Campo Grande, São Paulo, Osasco, Curitiba e Porto Alegre dão seu depoimento sobre os desafios de viver no contexto urbano. As lideranças indígenas relatam também as conquistas em termos de políticas públicas.

Belo Monte vai sair? O governo garante

18 de julho de 2013  

Lúcio Flávio Pinto

Este era para ser um ano de pique de obras no canteiro da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará, o maior do país. É provável que não seja mais. Os sucessivos incidentes com os índios e os grupos que se opõem à usina retardaram o cronograma físico e provavelmente influirão também sobre o cronograma financeiro de um empreendimento que já se aproxima da duplicação do valor inicial de projeto, que era de 16 bilhões de reais (passou para R$ 19 bilhões no leilão e já se aproxima de R$ 30 bilhões na mais recente atualização).
Mas talvez seja uma avaliação errada a dos que imaginam que o retardamento cresça e possa até levar ao cancelamento da iniciativa, principalmente sob o impulso das manifestações de protesto pelas ruas do Brasil. Parece que, quanto a Belo Monte, a posição do governo é de partir para o confronto, se a sempre alegada solução negociada se inviabilizar. A margem de tolerância do governo nessa negociação é curta. Ela presume a existência da hidrelétrica. Admite apenas compensações e mitigações.
Ao contrário do perfil traçado no edital de leilão, Belo Monte já não é mais uma realização da iniciativa privada com endosso oficial. Ela se tornou um projeto de governo, estratégico e prioritário, uma condição para a realização de uma das metas principais do PAC, o Programa de Aceleração do Crescimento. Assim como Lula a considerou uma questão fechada, a presidente Dilma Rousseff não abre mão dela. Pelo contrário: a impõe. Daí provavelmente ter se recusado a receber os índios Munduruku, que tentaram falar com ela em Brasília para apresentar-lhe sua posição.
Os índios não só reivindicariam a paralisação de Belo Monte como lhe antecipariam sua disposição de impedir que comece a construção das sete usinas previstas para o vale do Tapajós, abrangendo suas terras. Na eventualidade desse confronto, a presidente não deixaria de lhes dizer (ou advertir) que a obra prosseguirá. Essa certeza se fundamenta no uso de tropa federal, com ênfase na nova estratégia com o concurso da Força Nacional de Segurança, mas também através do uso de instrumentos de coerção, sedução e cooptação. O alvo principal seriam as populações locais, indígenas e não indígenas, mais suscetíveis a essa atração.
A reestatização de Belo Monte foi constante e crescente desde o leilão. Como explicar que depois de ter glorificado a parceria com a iniciativa privada, o governo a tenha substituído quase integralmente? Não foi uma decisão espontânea, tomada por iniciativa própria. Foi necessária para preencher o vácuo criado pela desistência dos sócios do consórcio vencedor no leilão. A explicação mais evidente para esse movimento foi a complexidade da obra e o seu encarecimento como efeito das mudanças de projeto. Talvez não haja outro exemplo de uma hidrelétrica tão grande, dimensionada para ser a terceira maior do mundo, funcionando a fio d’água, sem a estocagem de água suficiente para manter sua geração firme durante o longo período de decréscimo da vazão do rio. Na fase crítica, o Xingu não terá água corrente para manter em atividade as 24 turbinas da usina.
A redução drástica do reservatório foi o argumento utilizado pelos projetistas para calar as denúncias de que Belo Monte acarretaria um grande impacto ecológico, social e antropológico na região. Com uma inundação que representaria apenas a perenização das cheias do rio, a hidrelétrica deixaria de ser uma obra suja, consagrando-se como fonte de energia limpa.
O problema é que essa alteração exige a abertura de canais artificiais fora do leito do Xingu, na volta grande que o rio dá a jusante do vertedouro principal do complexo, no sítio Pimental. Essa é uma delicada e desafiadora obra de energia, inédita na construção de grandes barragens na Amazônia. Talvez os engenheiros estejam seguros do que estão fazendo, mas não transmitiram até hoje essa confiança à opinião pública. Ao que parece, nem estão mesmo preocupados com isso: em matéria de relacionamento do seu corpo técnico com a sociedade, Belo Monte consegue ser mais autoritária do que foi Tucuruí, no rio Tocantins, em plena ditadura.
Se as coisas estivessem fluindo harmonicamente, conforme as previsões originais, as grandes empreiteiras não teriam desistido do domínio da concessão licitada e voltado à sua condição tradicional de empreiteiras, faturando com as encomendas do construtor e operador da usina. Empresas estatais do setor elétrico, fundos de pensão e instituições públicas as substituíram no controle da Norte Energia. Com isso arrastando em seu favor dinheiro público.

Daí o aval do BNDES, que assegurou R$ 22,5 bilhões quando o orçamento da usina chegou a R$ 28,9 bilhões. É uma situação original: o agente financeiro assegura 80% do total independentemente de saber a quanto monta a conta final. Não interessa: o governo garante. Garante mesmo? É o que estará em questões nos próximos capítulos dessa novela milionária.

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Intimidação em Jacareacanga durante reunião dos Munduruku

Notícias enviadas no dia 03 de agosto de 2013, de Jacareacanga, no Sudoeste do Pará, relatam cenas de intimidação de ativistas por parte do poder público e de não indígenas. Os fatos ocorreram durante a reunião da Associação Indígena Munduruku do Alto Tapajós (Pusuru) e foram uma constante contra ativistas ambientais e dos movimentos sociais que participam do evento a convite da Pusuru.

Um indicativo da demonstração de poder se deu logo na entrada da reunião quando policiais do Batalhão Tático da Tropa de Choque da Polícia Militar chegaram armados no Ginásio Poliesportivo, local onde ocorre a reunião. A justificativa da presença e da participação dos policiais no evento era justamente a garantia da segurança e a promoção do diálogo entre indígenas e o poder público.

Em um primeiro momento, o representante do Fórum da Amazônia Oriental (FAOR) foi cercado por quatro policiais, sendo um delegado da polícia civil e três soldados do Tático que disseram: “Não vamos permitir que você abra as suas faixas lá dentro no ginásio”. A atitude vai de encontro à liberdade de expressão, direito previsto na Constituição, e ao mandato da própria PM, pois não houve qualquer tentativa de incitação à ordem pública.

Em outro momento, faixas que tinham sido colocadas no ginásio por uma liderança Munduruku foram arrancadas à faca por policiais do mesmo batalhão Tático. Segundo uma fonte, a ordem foi dada pelo prefeito de Jacareacanga que no começo da reunião apontou que não permitiria faixas ou qualquer manifestação do movimento social. Contudo, os membros do movimento social foram convidados pela própria Associação a participar da reunião.
Em outra ocasião, o prefeito de Jacareacanga, Raulien Queiroz e quatro policiais militares pararam em via pública dois pesquisadores que estão na região. 

Trabalhando com comunidades ribeirinhas no Tapajós, a um dos pesquisadores foi pedida sua máquina fotográfica. Como ele se negou a entregar o equipamento, os policiais pediram para ver as fotos tiradas na reunião, e obrigou o mesmo pesquisador a apagá-las imediatamente, na presença deles.

Outra ativista que estava assistindo e registrando da arquibancada a reunião foi ameaçada por um assessor do prefeito, que também tentou tomar sua máquina fotográfica. Ao final destes acontecimentos, duas perguntas importantes ficam neste momento em que a liberdade de manifestação política pacífica e expressiva país afora está tão em voga:

1) Por que o poder público e a polícia temem que as imagens do evento circulem?


2) Onde está o direito à liberdade de expressão não só dos ativistas,
mas de qualquer cidadão?