sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Lua Azul

por Cássio Barbosa
G1 Observatório
 

Quem costuma fuçar os calendários durante o ano – no meu caso, atrás dos feriados – deve ter notado que o mês de agosto terá duas Luas cheias. A primeira foi logo no dia 2 e a segunda vai ser no dia 31(hoje). Esta segunda Lua cheia em um mês é chamada de “Lua azul”. Mas por quê?
A expressão “Lua azul” tem sido usada há pelo menos 400 anos, mas não como sendo a segunda Lua cheia do mês. Este significado nasceu de um erro ocorrido em 1946 e se tornou popular nos últimos 20 anos. Já vi muita gente graúda dizendo que este hábito remonta aos fenícios ou egípcios, mas é pura bobagem.




Veremos o porquê.
No século 16, dizer que a Lua era azul significava exprimir algum tipo de exagero. Dizia-se: “fulano é tão desligado que diria que a Lua é azul!” Esse conceito levou a outra expressão que indicava uma probabilidade bem remota de algo acontecer. Por exemplo, no século 18, dizia-se: “eu pagarei minha dívida com você quando a Lua estiver azul”.
Apesar de parecer muito estranho, já houve algumas vezes em que a Lua realmente se tornou azul no céu. Em 1883, quando o vulcão Krakatoa explodiu na Indonésia, a atmosfera ficou carregada por partículas de poeira que fizeram o pôr do Sol ficar esverdeado e deixaram a Lua azul no mundo todo por quase dois anos. Sempre que há uma grande quantidade de poeira na atmosfera, esse efeito se repete. Foi assim em 1927, na Índia, quando uma tempestade depois de uma enorme seca levantou toneladas de poeira na atmosfera. Ou em 1951, quando um enorme incêndio florestal no Canadá lançou uma quantidade de cinzas que deixou a Lua azul.
Em tempos mais modernos a expressão Lua azul se tornou um sinônimo de coisa rara, mas também de tristeza. Várias músicas usam esta expressão para associar tristeza e solidão, basta checar algumas músicas de Elvis Presley.
Já no final dos anos 1980, nos EUA, a expressão “Lua azul” se tornou moda. Foi uma febre que deu nome a milhares de restaurantes e mostras de arte no país. Quem for do meu tempo vai se lembrar daquela série de TV com a Cybill Shepherd e o Bruce Willis em começo de carreira, que no Brasil se chamava “A Gata e o Rato”. Eles tinham uma agência de investigação particular que se chamava “Blue Moon” (literalmente, “Lua azul”) e o nome original da série era “Moonlighting” (expressão que significa “segundo emprego” e faz um trocadilho com a palavra “luar”).
Já a partir desta época, Lua azul também significava uma segunda Lua cheia em um mesmo mês. Mas nem sempre foi assim.
Esse é um daqueles casos em que uma definição nasce de um erro. A definição de Lua azul aparece em um livro chamado “Almanaque do Fazendeiro do Maine” nas edições anuais entre 1819 e 1962. Em nenhum destes exemplares a definição é esta que conhecemos. A definição que aparece neste almanaque é bem diferente e tem mais a ver com as estações do ano, do que com os meses. É assim: “Em primeiro lugar considera-se o ano tropical, aquele que começa em um solstício de inverno (mais ou menos no dia 21 de dezembro para o Hemisfério Norte) e vai até o solstício de inverno seguinte. A maioria dos anos tropicais consegue conter 12 Luas cheias, três em cada estação do ano. Cada uma delas tem um nome específico para a atividade humana da época. Ocasionalmente, temos um ano tropical com 13 Luas cheias, o que significa que uma das estações do ano deverá ter quatro delas, ao invés de três. Nesta estação com quatro Luas cheias, a terceira a acontecer é chamada de Lua azul”, diz o almanaque.
Essa definição começou a se moldar em julho de 1943 em uma coluna de perguntas e respostas da revista Sky & Telescope nos EUA. Laurence J. Lafleur citou o fato de ocasionalmente haver 13 Luas cheias em um ano, mas não disse que se tratava de um ano tropical. Ainda assim, ele não falou nada de duas Luas cheias em um mesmo mês. Mas a vaca foi para o brejo mesmo em março de 1946. Na página 3 da edição deste mês, James Pruett, um astrônomo amador que escrevia costumeiramente para a revista, em um especial sobre meteoros, resolveu falar sobre Luas azuis. Ele repetiu uma conclusão do tal almanaque, que dizia que: “Em 19 anos, sete vezes aconteceu (e ainda acontece) de haver 13 Luas cheias em um ano. Isto dá 11 meses com uma Lua cheia em cada um e um mês com duas”. Mas concluiu erroneamente: “esta segunda Lua cheia do mês, assim eu interpreto, foi chamada de Lua azul.”
Talvez por ser mais fácil de se entender, a própria revista encampou esta nova definição e passou a tratar a Lua azul desta maneira em suas páginas. Na década de 1980, a onda se espalhou e agora não tem mais volta.
Isto não é uma coisa ruim de todo, quantas pessoas aí não acharam que o novo milênio começava em primeiro de janeiro de 2000? Este erro tem sim implicações mais práticas do que confundir uma Lua cheia. Entretanto, uma diferença fundamental pode ser notada das definições. Pelo almanaque, uma Lua azul pode ocorrer em qualquer mês do ano, basta ser a terceira Lua cheia da estação. Pela definição da revista, não é possível que ocorra uma Lua azul em fevereiro e os meses de 31 dias são os mais prováveis de ter uma Lua azul. Isto porque o intervalo de tempo entre duas Luas cheias consecutivas – uma lunação – é de 29 dias – e uns quebrados. Como fevereiro não pode ter mais que 29 dias, não tem jeito.
A Lua azul deste dia 31 de agosto é muito especial. Ela vai acontecer no mesmo dia do enterro de Neil Armstrong, o primeiro ser humano a dar o primeiro passo na Lua – com o pé esquerdo. Será uma boa oportunidade para render uma homenagem a ele. Basta se lembrar de ver a Lua cheia azul, lembrar-se de Armstrong e dar uma piscadela.

Funai apura denúncia de chacina de 80 índios na fronteira com a Venezuela

Aldeia ianomâmi é de difícil acesso e fica em território venezuelano.
Indígenas que escaparam foram achados no Brasil, diz instituto ambiental.

 

Rafael Sampaio
G1 30/08/2012

Fotos de arquivo da tribo ianomâmi feita por organização de direitos dos indígenas (Foto: ONG Survival International)

A Fundação Nacional do Índio (Funai) está investigando a denúncia de massacre de indígenas ianomâmi por garimpeiros em uma aldeia na fronteira entre o Brasil e a Venezuela. Uma equipe de técnicos da instituição está em contato com grupos indígenas na região via rádio para buscar informações.
O local onde ocorreu o massacre, a aldeia Irotatheri, é de difícil acesso e fica em território venezuelano, segundo a Funai. Para chegar até o local do massacre são necessários "de quatro a dez dias" de caminhada do ponto onde os técnicos estão, diz a assessoria da fundação.
Segundo relatos de três sobreviventes a organizações defensoras dos indígenas, o massacre teria ocorrido após tentativa de garimpeiros brasileiros de estuprar mulheres ianomâmi. Até 80 indígenas (número de membros da aldeia Irotatheri) podem ter sido mortos pelos garimpeiros, de acordo com a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia (Coiam).

No Brasil
Nesta quinta-feira (30), outros ianomâmi que dizem ter escapado da chacina foram encontrados no Brasil, segundo informações do Instituto Socioambiental (ISA). Até então, os sobreviventes haviam sido achados na Venezuela. Os indígenas chegaram feridos à aldeia Onkiola, segundo o instituto. A vila fica na região de Auaris, no extremo noroeste de Roraima, distante 450 km da capital, Boa Vista.
Os garimpeiros teriam usado armas de fogo e explosivos contra a aldeia, segundo relatos dados pelos sobreviventes às ONGs. Para Marcos Wesley de Oliveira, coordenador do Programa Rio Negro, do ISA, e especialista na etnia ianomâmi, o Brasil e a Venezuela deveriam somar forças na investigação.
"Como são garimpeiros brasileiros em território venezuelano, trabalhar em cooperação é a melhor solução para todos, para elucidar o caso", diz Oliveira. Ele ressalta que os dois países "já tem vários acordos de cooperação, inclusive para vigilância e proteção de fronteira".
O especialista considera que o Brasil "não poderia e nem vai" se eximir de investigar um caso como este, até pelo histórico de apuração de outro massacre contra ianomâmis, ocorrido na década de 1990, em Haximu, também em Roraima.
Procurado pelo G1, o Ministério da Justiça não se posicionou sobre o caso. O Ministério Público Federal em Roraima, estado mais próximo à fronteira com a Venezuela, onde teria ocorrido o massacre, afirmou que os garimpeiros podem ser processados e até presos caso tenham entrado no Brasil.
O G1 também procurou a Polícia Federal, que deve emitir nota oficial ainda nesta quinta-feira (30). Segundo apurou a equipe de reportagem, o procedimento-padrão da força policial, neste caso, é aguardar que as autoridades venezuelanas procurem o Itamaraty, que então aciona o Ministério da Justiça e a PF para realizar investigação. O MPF em Roraima aguarda procedimento similar - um contato das autoridades da Venezuela com o Itamaraty para que haja investigação judicial.

Venezuela
A Promotoria Geral da Venezuela indicou nesta quarta-feira (29) uma comissão para investigar o suposto ataque, que teria sido cometido em julho, mas cujos detalhes só vieram à tona nos últimos dias.
De acordo com a ONG Survival International, os índios, que teriam encontrado os corpos carbonizados das supostas vítimas do massacre, só conseguiram reportar a ação muito tempo após ela ter sido cometida, já que os ianomâmi vivem em uma região isolada e as testemunhas levaram dias para chegar a pé até o povoamento mais próximo.
O massacre teria ocorrido no dia 5 de julho. A denúncia foi apresentada na Promotoria-Geral e a Defensoria Popular, em Puerto Ayachucho, na Venezuela, e também perante a 52ª Brigada de Guarnição Militar, que registrou os depoimentos.

quinta-feira, 30 de agosto de 2012

REINTEGRAÇÃO DA OCUPAÇÃO IPIRANGA



Hoje pela manhã, 96 famílias que ocupavam um prédio na Avenida Ipiranga foram retiradas por conta de um pedido de reintegração de posse. Cerca de 300 pessoas, entre elas 72 crianças, moravam há 9 meses no edifício.
Mais uma vez o Estado coloca o DIREIRO À PROPRIEDADE ACIMA DO DIREITO À VIDA E À MORADIA DIGNA. Mais uma vez a Frente de Luta por Moradia (FLM) responde a essa lógica perversa com dignidade. Não aceitaram que levassem seus pertences para um depósito qualquer, não aceitaram que separassem crianças, pais e mães em albergues pela cidade. Preferem estar na rua lutando por seus direitos – desabrigados, porém unidos.
No momento eles estão acampados na Av. São João, 299. Quem puder e quiser ajudar, as famílias precisam de doação de alimentos (pão, leite em pó, não perecíveis), lonas (pois logo pode chover), cobertores e, principalmente, apoio. Vale passar lá para dizer que está junto, se envolver, ajudar no que for necessário e conhecer gente que luta e não arreda o pé!

Mais fotos aqui!

Onde?
Av. São João, 299
O que levar?
- pão
- leite em pó
- água potável
- não perecíveis
- cobertores
- lonas
- solidariedade

Todo apoio às famílias da Ocupação Ipiranga e à luta por moradia digna!

Manifestantes protestam contra decisão pró-Belo Monte durante sessão do Mensalão

Publicado em 29 de agosto de 2012

Por volta das 17 h desta quarta-feira (29), quatro integrantes do grupo #OcupaSampa realizaram uma manifestação na plenária do Supremo Tribunal Federal, em Brasília, para protestar contra a derrubada da decisão judicial que paralisou a hidrelétrica de Belo Monte.

Durante a sessão de julgamento do Mensalão, os ministros do STF foram surpreendidos pelos manifestantes, que levantaram cartazes com mensagem de repúdio ao deferimento do recurso da AGU, favorável a Belo Monte.

Na segunda-feira (27), o presidente do STF, ministro Carlos Ayres Britto, deferiu uma liminar em favor da Advocacia Geral da União, derrubando a decisão unânime do Tribunal Regional Federal da 1a Região pela paralisação das obras da usina. De acordo com o TRF1, houve descumprimento da obrigação de consulta prévia das comunidades indígenas ameaçadas por Belo Monte.

No final da semana passada, depois de uma intensa campanha de internautas, intelectuais, jornalistas e juristas, o presidente do STF abriu prazo para que o Procurador Geral da República encaminhasse uma réplica ao recurso da AGU. O documento, no entanto, não foi considerado na decisão de Britto, que não avaliou a legalidade da obra, apenas aceitou o argumento da AGU de que houve atropelos no processo jurídico de contestação.

Para os ativistas, o procedimento no STF permitiu que a ilegalidade que marcou o processo de licenciamento (violando a Constituição e a Convenção 169 da OIT – Organização Internacional do Trabalho, que garantem as consultas aos indígenas), persistisse. Agora, eles exigem que a Casa vote o mérito o mais rápido possível, para que as violações dos direitos humanos das populações do Xingu não sejam perpetuadas.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Super-Homem e Mulher-Maravilha se beijam em HQ de 'Liga da justiça'

Dupla de heróis viverá um romance em edição de nº 12 dos quadrinhos. 'Este é o novo status quo', afirmou roteirista da história.

G1

Os heróis Super-Homem e Mulher-Maravilha foram retratados se beijando na capa do HQ de número 12 da "Liga da justiça", que faz parte da estratégia da DC Comics de relançar os seus heróis com histórias diferentes.
À venda a partir do dia 29 de agosto, o HQ tratará sobre um evento trágico que aproximará a dupla de heróis, culminando em um romance entre os dois. De acordo com o roteirista Geoff Johns, o relacionamento não será simplesmente um evento isolado, mas algo duradouro. "Esse é o novo status quo", disse ao site Entertainment Weekly.
O artista Jim Lee, responsável pelo desenho da capa, acredita que o romance causará polêmica entre os fãs mais tradicionais dos quadrinhos. "Esperamos que isso levante muitas sobrancelhas. Nós acolhemos a discussão acalorada", afirmou.

NOTA DE SOLIDARIEDADE AOS POVOS DO XINGÚ E AOS DESEMBARGADORES DO TRF-1

Publicado em 27 de agosto de 2012

A REDE DE ENTIDADES EM DEFESA DA VIDA, formada por entidades socioambientais, indigenista, indígenas, educadores populares, agentes de pastorais, pesquisadores, pescadores, ribeirinhos e militantes populares, com atuação na grande bacia do rio Madeira, que desde 2006, vem questionando por meio de Ações Civis Públicas os estudos de implantação do Complexo hidrelétrico no rio Madeira e as violações de direitos das populações tradicionais (ribeirinhos, seringueiros, extrativistas e pescadores), dos Povos Indígenas (incluindo povos em condição de isolamento e risco, com reconhecimento tardio da própria Funai) e demais populações que ocupam às margens do Rio Madeira, dentre elas, a urbana; sem encontrar eco na Justiça Federal em Porto Velho, cujos pareceres sempre consideram as obras como fato consumado e de interesse nacional (governo e empresas), em detrimento de julgar à luz da Constituição Federal.

Para nós, drasticamente afetados e afetadas pelas usinas no rio Madeira: Santo Antônio e Jirau não são fatos consumados, porque o rastro de destruição vai exigir muito exercício da Justiça, de corresponsabilizar as empresas e do poder público de maneira geral.
Isto posto, vimos nos Solidarizar com os Povos do XINGU, que à partir da ação solidária do MPF/PA e organizações sociais de apoio, encontraram eco no Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF-1) que determinou no dia 14/08/12, a suspensão total das obras da Usina de Belo Monte no estado do Pará, acatando pedido do Ministério Público Federal no Estado.

Para a 5ª Turma do TRF1, formada pelos desembargadores Antônio Souza Prudente, João Batista Moreira e Selene Almeida, o decreto que autorizou Belo Monte só poderia ter sido aprovado pelo Congresso Nacional depois dos estudos de impacto ambiental e das consultas indígenas. Eles consideram que, pela Convenção 169 da OIT e pela Constituição brasileira, os índios têm o direito de exercer a participação democrática e decidir previamente sobre seu destino e o das futuras gerações.

Com coerência o relator desembargador Antônio Souza Prudente afirmou que: “Somente será possível ao Congresso nacional autorizar o empreendimento Belo Monte, consultadas previamente as comunidades indígenas, diante dos elementos colhidos no estudo de impacto ambiental e respectivo relatório conclusivo, porque, do contrário, a letra da Constituição é letra morta, é um faz de conta. Não podemos admitir um ato congressual no estado democrático de direito que seja um ato de ditadura, um ato autoritário, um ato que imponha às comunidades indígenas um regime de força”. Com esta clareza de seu voto foi acolhido por unanimidade pela 5ª Turma.

Na certeza de que a vitória vem com a luta do Povo, nos congratulamos com os Povos do Xingu, do Tapajós, do Teles Pires, do Juruena, do Barão de Melgaço, Beni, Madre Diós…
Viva a Aliança dos Povos dos Rios da Pan-Amazônia! Viva a Justiça que não é cega!

ASSINAM:
Instituto Madeira Vivo – IMV;
Conselho Indigenista Missionário – CIMI/RO,
Comissão Pastoral da Terra – CPT;
Pastoral do Migrante;
Rede de Educação Cidadã – RECID-RO;
Articulação do Movimento Indígena de Rondônia, noroeste do Mato Grosso e sul do Amazonas;
Comissão de Justiça e Paz – CJP/PVH;
Instituto Índia Amazônia;
Coletivo Jovem pela Sustentabilidade – CJS;
Rede de Juventude pelo Meio Ambiente – REJUMA;
Fórum Rondoniense de Economia Solidária – FRES;

terça-feira, 28 de agosto de 2012

NOTA Sobre as decisões jurídicas de Belo Monte

Publicado em 28 de agosto de 2012

O presidente do STF, ministro Carlos Ayres Brito, decidiu na noite desta segunda, 27, atender ao recurso da Advocacia Geral da União (AGU) e liberar a hidrelétrica de Belo Monte. A usina estava paralisada desde a última sexta, 24, por decisão do Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF1).
Lamentamos profundamente a pressa do STF em decidir sobre o tema, sobretudo diante dos indícios de que não foram levados em consideração os argumentos do Ministério Público Federal, que contestaram os da AGU.
No voto do STF, foram analisados e deferidos os argumentos jurídicos dos advogados do governo, mas em nenhum momento foram mencionados os do MPF, a quem foi concedido, na última sexta, um prazo para que enviasse uma réplica ao recurso da AGU. Tal documento foi protocolado no STF na segunda, 27, às 11h da manhã. Estando o ministro Ayres Britto em audiência do Mensalão, é praticamente impossível que tenha estudado a exposição do MPF, uma vez que seu voto foi publicado assim que se encerrou o expediente do STF, por volta das 20h.
Mais uma vez, o que selou, neste momento, o destino das populações atingidas e ameaçadas por Belo Monte, foi uma avaliação tecnocrata de meandros judiciais que, em nenhum momento, discutiram o mérito do processo. Ou seja, nem a AGU nem o STF desmentiram que a falta de consulta aos indígenas do Médio Xingu no processo de licenciamento de Belo Monte é ilegal, mas em momento algum consideraram esse atentado aos direitos humanos dos afetados, à Constituição e à Convenção 169 da OIT em seus argumentos e decisões.
No momento, nem bem 10% do projeto da hidrelétrica saiu do papel. 90% da obra ainda esta por vir. Mas o empreendimento está prestes a barrar definitivamente o Xingu, sem ao menos ter esclarecido como indígenas e ribeirinhos transporão a barragem para chegar a Altamira pelo rio. Está aí mais um fato que explicita a urgência da paralisação de Belo Monte.
Caso a Justiça não garanta os direitos dos cidadãos e cidadãs brasileiros que habitam a região do Médio Xingu – visto que o governo federal está decidido, manifestamente, a violá-los -, Belo Monte entrará para a história do país como um dos maiores crimes do poder público nos anos pós-ditadura. E pior, abre o precedente para que casos semelhantes ou ainda piores se alastrem pela Amazônia.
Do ponto de vista jurídico, sabemos que o STF deve ainda votar o mérito do processo. Instamos os ministros, e, em especial, o presidente da Casa, Carlos Ayres Britto, que isto se dê em tempo hábil de não transformar Belo Monte em “fato consumado”. Instamos todo o Poder Judiciário a dar andamento às mais de 10 Ações Civis Públicas que estão emperradas nas várias instâncias.
Belo Monte não é e nunca foi um projeto legal. Não traz e nunca trará desenvolvimento aos povos do Xingu. Nós, que reafirmamos aqui a imutável intenção de continuar a lutar pelos seus direitos, não teremos Belo Monte como uma mancha de vergonha na nossa história; que o Judiciário não permita que seja na dele.

LEIA: Parecer do MPF é pela paralisação de Belo Monte para consulta aos índios


Se pedido da AGU for aceito, estará se enfraquecendo a luta por uma sociedade de fato plural e o espaço do Brasil no sistema interamericano de direitos humanos, diz PGR

A Procuradoria Geral da República se manifestou em parecer ao Supremo Tribunal Federal para que as obras da usina hidrelétrica de Belo Monte (PA) continuem paralisadas. O parecer, assinado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e pela vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat, sustenta que a Reclamação 14404, feita pela Advocacia-Geral da União, não é o mecanismo processual adequado para se debater a ausência de consultas indígenas para a usina. “Jamais uma decisão proferida em suspensão de liminar pode condicionar o julgamento de mérito da ação principal”, diz o parecer.
Na reclamação, a AGU argumentou que uma decisão liminar de 2007, da então presidente do STF, ministra Ellen Gracie, permitia o licenciamento de Belo Monte. O MPF aponta que, ao fazer a reclamação, a AGU incluiu uma inverdade: a de que o acórdão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que parou a obra desrespeitou decisão proferida pelo plenário do STF. “Essa suspensão de liminar jamais foi submetida ao plenário da Corte Suprema”, corrige o parecer do MPF.
“Só seria possível o manejo da reclamação para preservar a declaração de constitucionalidade do decreto legislativo 788 (que autorizou Belo Monte), se esta fosse uma decisão do plenário do STF, e não uma decisão monocrática da então presidente da Corte”, sustenta o parecer. Para Gurgel e Duprat, além do manejo incorreto do recurso, o pedido da AGU coloca em risco os mandamentos constitucionais que protegem a pluralidade da sociedade brasileira e os direitos dos povos indígenas.
“A consulta aos povos indígenas, quanto às medidas administrativas e legislativas que possam afetá-los, é consequência lógica e necessária de sua autodeterminação, ou seja, da possibilidade de traçarem para si, livres da interferência de terceiros, os seus projetos de vida”, diz o parecer. “Também decorrência lógica da autodeterminação dos povos indígenas, ideia força de uma sociedade plural, é que a consulta seja prévia”, afirma o MPF.
“A consulta posterior, quando já consumado o fato sobre o qual se pretende discutir, é mera forma sem substância, incompatível com as liberdades expressivas e a gestão do próprio destino que tanto a Constituição, quanto a Convenção 169/OIT lhes asseguram”, afirma o MPF em defesa dos direitos indígenas.
Para o procurador-geral e a vice-procuradora-geral da República, se o STF permitir que, pela via inadequada da reclamação, a obra de Belo Monte tenha continuidade, estará na prática afirmando que não há necessidade de o Congresso Nacional ouvir os povos indígenas sobre os empreendimentos em suas terras. “A concessão da medida liminar postulada condenaria os povos indígenas alcançados pela UHE Belo Monte a um fato consumado. Ainda há tempo para que o Congresso Nacional promova a oitiva dessas comunidades e delibere adequadamente. Mas, à medida em que o empreendimento avança, mais remota fica essa possibilidade”, dizem.
Para o MPF, há um efeito potencialmente dramático numa decisão, mesmo de caráter liminar, que libere a obra de Belo Monte nesse momento: “se estará enfraquecendo, a um só tempo, a luta quotidiana por uma sociedade de fato plural, e o espaço do Brasil no sistema interamericano de direitos humanos”. O parecer foi enviado hoje ao ministro Carlos Ayres Britto, do STF, que vai analisar o pedido da AGU. As obras de Belo Monte estão paradas desde o último dia 23 de agosto.

“Ambientalista” do STF libera Belo Monte



ALEGRIA DE POBRE e índio dura pouco. Depois de uma semana de interrupção por decisão do TRF de Brasília, a hidrelétrica de Belo Monte ganhou ontem à noite mais uma liminar permitindo sua continuação. Desta vez, quem assina a ordem é o ministro Ayres Britto, tido e havido como o maior ambientalista do Supremo e com um histórico de proteção a direitos coletivos e difusos.

Antes de xingar Ayres Britto, lembre-se de suas posições tradicionalmente progressistas, da anencefalia às células-tronco à união homoafetiva, e de seu voto histórico a favor dos índios no julgamento de Raposa-Serra do Sol. Lembrou? Pronto, pode xingar agora.

O presidente do STF deferiu um pedido da Advocacia-Geral da União pela continuidade da obra por julgar que o TRF descumpriu decisão do Supremo ao embargá-la. O objeto da pendenga é uma ação movida pelo Ministério Público do Pará em 2005, que pede a nulidade do licenciamento de Belo Monte por considerar que os índios deveriam ser ouvidos pelo Congresso Nacional antes de o Ibama conceder qualquer licença.

Para ninguém achar que os procuradores estão caçando pelo em ovo, o que o MPF de fato faz com frequência, a necessidade de oitiva dos índios foi apontada pela própria Funai no parecer técnico que atesta a viabilidade da obra — desde que cumpridas certas condicionantes. Ou seja, havia (e há) uma demada real por parte das comunidades afetadas.

Ao se pronunciar em favor da obra, a então presidente do STF, Helen Gracie, concordou que havia problemas jurídicos, mas em nome da “ordem econômica” mandou seguir com a barragem até que se julgasse o mérito. O MP recorreu, entrou com nova ação no TRF, perdeu após um julgamento esquisito, recorreu de novo, ganhou, a AGU chiou. Agora, Ayres Britto emula Ellen Gracie e manda seguir com Belo Monte até que se julgue o mérito da ação do MP.

Antes que você xingue o poeta sergipano de novo, lembro que ele agiu da mesma forma com Raposa: mandou suspender a operação da PF que tirava os arrozeiros da terra indígena e, no mérito, decidiu contra os arrozeiros.

A diferença, aqui, é que Belo Monte será um fato consumado quando se julgar o mérito. Depois de construída a usina e empatados R$ 23 bilhões, quem é o ministro do Supremo que vai dizer que o licenciamento foi ilegal? Ayres não será, já que ele se aposenta em dois meses. Vão deixar na mão do ex-AGU Tóffoli?

Presidente do STF libera retomada das obras da usina de Belo Monte

MPF havia dado parecer contrário à liberação da obra da hidrelétrica. Ministro deu decisão favorável a pedido da Advocacia Geral da União.


Mariana Oliveira e Nathalia Passarinho
Do G1, em Brasília

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ayres Britto, concedeu na noite desta segunda-feira (27) decisão liminar (provisória) que autoriza a retomada das obras da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. A paralisação havia sido determinada no dia 14 de agosto pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
Mais cedo nesta segunda, o Ministério Público Federal havia apresentado parecer no qual afirma ser contrário ao pedido do governo federal para a retomada das obras.
Na decisão de 14 de agosto, o desembargador do TRF-1 Souza Prudente entendeu que os povos indígenas da região teriam que ser consultados sobre a construção da usina. Na semana passada, a Advocacia-Geral da União(AGU) apresentou recurso ao STF no qual afirmou que a paralisação da obra causa danos à economia brasileira e à política energética do país.
Ayres Britto concedeu a liminar pedida pela AGU "sem prejuízo de uma mais detida análise quando do julgamento do mérito (inteiro teor do pedido)". Não há prazo para o plenário analisar o pedido, uma vez que o Supremo está em esforço concentrado para julgamento do processo do mensalão e não vai julgar outros casos até o término da ação. Também há possibilidade de o MPF do Pará, autor da ação inicial, ingressar com um agravo para suspender a decisão que autorizou a retomada da obra.

Parecer do MPF
O parecer contrário à Belo Monte, assinado pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e pela vice-procuradora-geral Deborah Duprat, afirmava que o Congresso ainda poderia realizar a consulta aos povos indígenas.
"A concessão de medida liminar postulada condenaria os povos indígenas alcançados pela UHE Belo Monte a um fato consumado. Ainda há tempo para que o Congresso Nacional promova a oitiva dessas comunidades e delibere adequadamente", afirmou o parecer.
Segundo os procuradores, a consulta prévia aos povos indígenas "é também um princípio geral de direito internacional". "O Brasil está vinculado a essa ordem internacional de proteção aos direitos humanos por força de decisão de sua própria Constituição, que determina que o Estado se regerá em suas relações internacionais com base no princípio da prevalência desses direitos."
O parecer cita estudos que apontam prejuízos a povos da região e afirma que a obra "afeta tão significativamente os povos indígenas localizados em especial na Volta Grande do Xingu".
"A consulta aos povos indígenas, quanto às medidas administrativas e legislativas que possam afetá-los, é consequência lógica e necessária de sua autodeterminação, ou seja, da possibilidade de traçarem para si, livres da interferência de terceiros, os seus projetos de vida", dizem os procuradores.

Argumentos do governo federal
No recurso contra a decisão do desembargador, o advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, pediu a suspensa, por decisão liminar (provisória), a eficácia da decisão do TRF-1, “para que se evite dano irreparável ao patrimônio público”.
“Para que se evite a ocorrência de dano vultoso e irreparável ao patrimônio público, à ordem administrativa, à ordem econômica, e à política energética brasileira, a União desde logo requer [...] seja liminarmente suspensa a eficácia do acórdão proferido”, diz o texto.
Segundo a AGU, a decisão do TRF “desrespeita” decisão anterior do Supremo que entendeu que a concessão de autorização para início da obra não feriu a Constituição.

Entenda o caso
A Usina Hidrelétrica de Belo Monte está sendo construída no rio Xingu, em Altamira, no sudoeste do Pará, com um custo previsto de R$ 25 bilhões.
O projeto tem grande oposição de ambientalistas, que consideram que os impactos para o meio ambiente e para as comunidades tradicionais da região, como indígenas e ribeirinhos, serão irreversíveis.
A obra também enfrenta críticas do Ministério Público Federal do Pará, que alega que as compensações ofertadas para os afetados pela obra não estão sendo feitas de forma devida, o que poderia gerar um problema social na região do Xingu.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

#PAREBELOMONTE – Vigília em apoio ao ministro Ayres Britto


Neste momento, o futuro da vida dos povos da bacia do rio Xingu está nas mãos do Ministro Carlos Ayres Britto, presidente do Supremo Tribunal Federal.


Após a histórica decisão do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, que por unanimidade determinou a paralisação imediata das obras da usina hidrelétrica de Belo Monte, a Advocacia Geral da União apresentou uma reclamação perante o STF, pedindo a retomada imediata das obras da barragem.

A luta é desigual: de sexta-feira até hoje, o ministro Ayres Britto já recebeu a visita do Advogado-Geral da União, Luís Inácio Adams, da Ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, e da presidente da Funai, Marta Azevedo, todos eles na tentativa de convencê-lo de que paralisar a obra neste momento seria um desastre, já que estaríamos diante de “um fato consumado¨.

A pressão do Governo Federal promete se intensificar nos próximos dias.

Devemos manifestar todo o nosso apoio ao Ministro Ayres Britto, a fim de transmitir-lhe a tranquilidade necessária para que decida sobre a paralisação da obra com liberdade e autonomia, sem se deixar influenciar pela tática do medo, utilizada pelo Governo na tentativa de encobrir os crimes humanitários e ambientais cometidos desde o início do processo de imposição deste projeto de morte e destruição no coração da Amazônia.

Venha fazer vigília nesta segunda-feira (dia 27 AGO), perante o Tribunal Regional Federal de São Paulo (Av. Paulista, 1842), a partir das 22h.

Traga velas, cobertores e toda sua indignação! Vamos nos manter em vigília, para que essa obra seja extinta para todo o sempre! O Xingu é nosso, e deve correr livre!

Assista: Xingu Rising (Portuguese)

domingo, 26 de agosto de 2012

Ayres Britto: mantenha a decisão do TRF-1 sobre Belo Monte!


Publicado em 24 de agosto de 2012 

[Ação urgente]
Abra seu e-mail AGORA e encaminhe esta mensagem ao ministro Ayres Britto (audienciaspresidencia@stf.jus.br) com o seguinte título: Ayres Britto: mantenha a decisão do TRF-1 sobre Belo Monte!

Como era esperado, a Advocacia Geral da União (AGU) recorreu na tarde desta sexta-feira, 24, ao Supremo Tribunal Federal (STF) da decisão da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) pela invalidação da licença prévia e de instalação da Usina Hidrelétrica Belo Monte, no Pará.
A AGU argumenta que o STF já decidiu, em voto monocrático da ex-ministra Ellen Gracie, pela validade do Decreto Legislativo 788, que autorizou o executivo a construir Belo Monte. Portanto, que a decisão do TRF-1 não pode prevalecer sobre a Corte Suprema do país.
Os desembargadores do TRF-1 decidiram, no último dia 14, de forma colegiada e por unanimidade, que a obra não atende a determinação da consulta prévia e informada às comunidades impactadas direta ou indiretamente – conforme manda a Constituição Federal e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Com isso, o governo federal pretende mais uma vez adotar medidas autoritárias para seguir adiante com a obra. Juridicamente, a AGU ajuizou a chamada Reclamação, que caiu diretamente no gabinete do presidente do STF, ministro Carlos Ayres Britto.
Desse modo, a validade da decisão colegiada dos desembargadores da 5ª Turma do TRF-1 em parar Belo Monte está nas mãos do ministro. “A consulta deve ser prévia, não póstuma. Não podemos aceitar essa ditadura que vemos no Brasil. Faz a obra e pergunta depois. Isso afronta a Constituição. A vontade das comunidades indígenas precisam ser ouvidas e respeitadas”, disse o desembargador Antônio de Souza Prudente após a decisão da 5ª Turma.
Está nas mãos do ministro Ayres Britto impedir que tal ditadura se instale de vez no Brasil. O que as comunidades tradicionais do Xingu pedem, bem como o conjunto da sociedade brasileira, é que o ministro ouça o Ministério Público Federal (MPF) e que Belo Monte só saia caso os afetados sejam ouvidos se querem ou não seus territórios físicos e simbólicos afetados pela ação devastadora do empreendimento.
A AGU usa de um recurso ditatorial ao pedir que a decisão monocrática de um ministro do STF valide uma intervenção que poderá afetar milhares de pessoas, suas culturas e o meio ambiente. No entendimento do próprio ministro Ayres Britto, para os indígenas os territórios são “totens horizontais”, não possuindo valor comercial ou de lucro. Já para o ministro Celso de Mello, a Constituição deve proteger o “meio ambiente cultural” de tais comunidades e que, portanto, tais espaços não podem ser vilipendiados. Ambos assim se pronunciaram em recentes julgamentos envolvendo a Terra Indígena Caramuru Catarina-Paraguaçu, no sul da Bahia.

Brasília, 24 de agosto de 2012

Movimento Xingu Vivo Para Sempre
Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
Comissão Pastoral da Terra (CPT)
Plataforma Dhesca
Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH)
Justiça Global
Terra de Direitos
OcupaSampa

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Advocacia e ilegalidade anti-índio

Jornal do Brasil

Dalmo Dallari *


Uma portaria publicada recentemente, com a assinatura do advogado geral da União, contém evidentes inconstitucionalidades e ilegalidades, pretendendo revogar dispositivos constitucionais relativos aos direitos dos índios, além de afrontar disposições legais. Trata-se da Portaria nº 303, de 16 de julho de 2012, que em sua ementa diz que “dispõe sobre as salvaguardas institucionais às terras indígenas”. São tão evidentes os absurdos jurídicos nela contidos que se fica em dúvida se o advogado geral da União redigiu ou examinou cuidadosamente os termos da portaria antes de assiná-la ou se, assoberbado pela sobrecarga de trabalho, foi induzido em erro por algum assessor e assinou apressadamente o documento, achando que, como sugeria a ementa, ele realmente afirmaria as salvaguardas dos direitos indígenas. Na realidade, expedindo a referida portaria, o advogado geral da União agiu como legislador, atribuindo competências para a prática de atos administrativos no âmbito federal e restringindo direitos que a Constituição assegura aos índios.

Antes de tudo, para que fique bem evidente a impropriedade da portaria aqui examinada, é oportuno lembrar o que é uma portaria, na conceituação jurídica. Sem fazer volteios teóricos e em linguagem simples e objetiva, Hely Lopes Meirelles, uma das mais notáveis figuras do direito brasileiro, dá a conceituação: “Portarias são atos administrativos internos, pelos quais o chefe do Executivo (ou do Legislativo e do Judiciário, em funções administrativas), ou os chefes de órgãos, repartições ou serviços, expedem determinações gerais ou especiais a seus subordinados, ou nomeiam servidores para funções e cargos secundários” (Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo, Ed. Rev.Trib., 1966, pág. 192). Como fica evidente, a portaria não tem a força de lei nem da jurisprudência, não obrigando os que não forem subordinados da autoridade que faz sua edição. No entanto, a Portaria nº 303, de 16 de julho de 2012, do advogado geral da União, diz que o advogado geral da União, no uso de suas atribuições, resolve: “artigo 1º. Fixar a interpretação das salvaguardas das terras indígenas, a ser uniformemente seguida pelos órgãos jurídicos da Administração Pública Federal direta e indireta...”.

É mais do que evidente a exorbitância, pois o advogado geral da União não tem competência para interpretar normas jurídicas e menos ainda para impor sua interpretação a quem não é seu subordinado. Essa é uma das impropriedades jurídicas da referida portaria.Para dar uma aparência de suporte jurídico aos dispositivos da portaria, nela foram inseridas, literalmente, restrições aos direitos constitucionais dos índios constantes de argumentação expendida pelo ministro Menezes Direito no julgamento, em 2009, do caso da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, no estado de Roraima, tradicionalmente ocupada pelos índios macuxi. A questão jurídica pendente do julgamento do Supremo Tribunal Federal naquele caso era o sentido da disposição constante do artigo 231 da Constituição, segundo o qual são reconhecidos aos índios “os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”.

Esclarecendo o alcance dessa disposição, diz o parágrafo 1º do mesmo artigo: “São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”. Apesar da clareza desse dispositivo, ricos invasores de terras indígenas pretendiam que só fosse assegurado aos índios o direito sobre os locais de residência, as malocas, propondo que a demarcação da área macuxi só se limitasse a esses espaços, formando uma espécie de ilhas macuxi. O esclarecimento desse ponto era o objeto da ação, e o Supremo Tribunal Federal deu ganho de causa aos índios, considerando legalmente válida a demarcação de toda a área tradicionalmente ocupada pela comunidade.

Numa tentativa de reduzir o alcance da ocupação, o ministro Menezes Direito declarou que reconhecia o direito dos índios, mas que ele deveria ser interpretado com restrições, externando tais limitações em dezenove itens, que denominou condicionantes. Para não retardar mais a decisão e, sobretudo, considerando que os dispositivos constitucionais são sobejamente claros e que eles estavam acima da argumentação dos julgadores, os demais julgadores não discutiram as condicionantes, pois tratavam de pontos que não eram objeto da ação. Entretanto, quem redigiu o acórdão do Supremo Tribunal colocou as condicionantes como parte da argumentação sobre o ponto questionado, que era a demarcação integral ou em ilhas. E agora a portaria assinada pelo advogado geral da União tenta ressuscitar as condicionantes, além de acrescentar outras pretensas restrições aos direitos indígenas. Assim, por exemplo, a portaria diz que “é vedada a ampliação da terra indígena já demarcada”.

Ora, bem recentemente o Supremo Tribunal Federal, julgando o questionamento da doação de terras dos índios pataxós a particulares, feita pelo governo do estado da Bahia, concluiu pela nulidade de tais doações, o que terá como consequência a ampliação da área até agora demarcada como sendo o limite do território pataxó. E nenhuma portaria pode proibir isso.Outro absurdo da portaria aqui questionada é a atribuição de competência ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, autarquia vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, para regular o usufruto dos índios, que é direito expressamente assegurado pela Constituição, nas unidades de conservação que coincidam com áreas indígenas. Antes de tudo, a lei que criou o Instituto Chico Mendes foi julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, em decisão de 7 de março deste ano. Curiosamente, o advogado geral da União tentou defender a legalidade daquela lei, mas foi derrotado, ficando, entretanto, registrado seu especial apreço por aquele Instituto, que tem prestado serviços relevantes mas não tem competência legal para dizer o que é o usufruto que a Constituição assegura aos índios.

E, pelo que já foi exposto, é evidente absurdo pretender atribuir novas competências a uma autarquia federal por meio de uma portaria da Advocacia Geral da União. Coroando as impropriedades jurídicas, a portaria em questão, encampando uma condicionante, diz que é assegurada a participação dos entes federados no procedimento administrativo de demarcação das áreas indígenas, afrontando a disposição expressa e clara do artigo 67 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, segundo o qual “A União concluirá a demarcação das terras indígenas no prazo de cinco anos a partir da promulgação da Constituição”. Como se tem denunciado, a União está atrasada no cumprimento dessa obrigação constitucional, mas um ponto fora de dúvida é que a competência para a demarcação é da União, somente dela, sendo inconstitucional a atribuição de competência aos estados federados como pretendeu a portaria.

Por tudo o que foi aqui exposto, e por outras falhas jurídicas que ainda poderiam ser acrescentadas, a Portaria nº 303/2012 da Advocacia Geral da União não tem validade jurídica, e qualquer tentativa de lhe dar aplicação poderá e deverá ser bloqueada por via da ação judicial própria, a fim de que prevaleça a supremacia jurídica da Constituição e, por sua efetivação, sejam respeitados os direitos que ela assegurou aos índios brasileiros.

* Dalmo de Abreu Dallari é jurista. - dallari@noos.fr

Nota do povo Ka'apor contra #BeloMonte



Prezados parentes e amigos que estão sofrendo ameaças com a construção de Belo Monte. Assim como vocês estão sofrendo ameaças com a construção dessa hidrelétrica, nós, Povo Ka’apor, do Maranhão, estamos sofrendo com as ameaças e invasões de madeireiros e fazendeiros em nosso território por causa de nossos bens naturais, as nossas florestas e tudo que existe nela. São fazendeiros, madeireiros, donos de serraria, prefeitos, e outras pessoas que comandam a invasão de nosso território. Não temos nenhum apoio e nem proteção do governo do Estado, nem da FUNAI e outros órgãos que deveriam garantir a proteção de nosso território. A gente tem percebido que esses órgãos têm abandonado a proteção dos povos que protegem as florestas e rios.
A gente ficou muito alegre com a notícia de que a Justiça suspendeu as obras de Belo Monte, que mostra o desrespeito das empresas, do governo federal e estadual com os direitos dos povos que vivem e depende do Rio Xingu para viver. A gente é solidário à luta de vocês contra esse monstro. Nós estivemos em outubro de 2011 com vocês no Seminário dos Povos do Xingu, em Altamira, Pará, e vimos como deve ser difícil enfrentar as ameaças dessas empresas que estão invadindo, ameaçando o Rio Xingu. Continuem contando sempre com nossa solidariedade, nosso apoio. Vamos continuar torcendo e lutando com vocês para continuarem vivendo e protegendo o Rio Xingu.

Associação Ka’apor ta hury do Rio Gurupi – KAAPORTARUPI
Comissão de Educação Ka’apor.
Povo Ka’apor da Terra Indígena Alto Turiaçu

Com suspensão de licenças de Belo Monte, danos devem ser reparados


Publicado em 23 de agosto de 2012

Com a divulgação, nesta quinta (23), do acórdão da decisão do Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF1) que paralisou a hidrelétrica de Belo Monte, acompanhada de notificações ao Ibama e à Norte Energia, a empresa foi obrigada a parar as atividades sob pena de ter que pagar a multa de R$ 500 mil/dia estipulada pelo TRF1.
O acórdão, que detalha os votos dos três desembargadores que decidiram pela nulidade do decreto que autorizou o projeto de Belo Monte, deixa claro que todas as licenças até agora emitidas pelo Ibama – licença prévia, licença de instalação, licenças de desmatamento, ect – são inválidas.
Segundo a sentença, a decisão visa “coibir o Ibama de praticar qualquer ato administrativo, e torna insubsistentes aqueles já praticados, referentes ao licenciamento ambiental da Usina Hidrelétrica de Belo Monte (…) em decorrência da invalidade material do decreto Legislativo 788/2005, por violação da norma do art. 231 (…) da Constituição Federal (…) e da Convenção 169 da OIT, ordenando às empresas executoras do empreendimento hidrelétrico de Belo Monte, em referencia, a imediata paralisação das atividades de sua implementação, sob pena de multa coerciva, no montante de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) por dia de atraso no cumprimento do provimento mandamental em tela”.
De acordo com a Antonia Melo, coordenadora do Movimento Xingu Vivo para Sempre, juristas de renome avaliaram que, na vigência da decisão do TRF1, subentende-se que deve haver o desmonte das obras já feitas e a recomposição ambiental da região. Também cabem ações de indenização aos atingidos. “Vamos fazer uma consulta à assessoria jurídica do movimento para saber quais são as ações cabíveis para garantir a reparação dos danos causados às populações atingidas por Belo Monte. Como já anunciamos esta semana, entendemos que, como as licenças da usina são inválidas, a Norte Energia terá que reverter todas as ações que causaram impactos no rio, nas pessoas e no meio ambiente. É isso que vamos exigir. Finalmente a Justiça fez justiça e parou Belo Monte. Agora queremos que tudo que lembre esse projeto genocida desapareça das nossas vidas”.

Crônica de Nelson Rodrigues

Nelson Rodrigues, escritor, dramaturgo e jornalista brasileiro, que completaria 100 anos ontem (23) se estivesse vivo.

AS GÊMEAS


Estava tomando café em pé quando viu passando, na calçada, a pequena que começara a namorar na véspera. Largou a xícara, largou tudo e atirou-se no seu encalço, quase como um maluco. Tropeça num cavalheiro, esbarra numa senhora, e vai alcançar a menina pouco adiante. Caminha lado a lado e faz a alegre pergunta:
- Como vai essa figurinha?
A garota, que era realmente linda, estaca por um segundo. Olha-o, de alto a baixo, com surpresa e susto. Em seguida, vira o rosto e continua andando. Osmar, desconcertado, apressa o passo e a interroga "Mas que é isso? Não me reconheces mais?". Nenhuma resposta. E ele; num espanto misturado de irritação: "Que máscara é essa?". Silêncio, ainda Nessa altura dos acontecimentos, a menina só falta correr.
Então, Osmar perde a paciência; segura o braço da fulana: "Olha aqui, Marilena".
Ao ouvir o nome, ela pára: vira-se para ele, mais cordial, quase alegre; encara-o confiante:
- Já vi tudo!
- Tudo como? Ela parece aliviada.
- Eu não sou Marilena, Marilena é minha irmã.
Pasmo, exclama: "Meu Deus do céu! Que coisa!" A garota sorri divertida com a confusão:
- Eu sou Iara.
Osmar faz a pergunta desnecessária:
- E são gêmeas?
Na véspera, conhecera Marilena. Fora um desses flertes deliciosíssimos de ônibus. Viajaram em pé, lado a lado, cada qual pendurado na sua argola. Quando saltaram, no mesmo poste, era evidente que a simpatia era recíproca e irresistível. Marilena deu-lhe telefone, endereço, tudo. Só não lhe dissera por falta de oportunidade que tinha uma irmã gêmea, Iara. Quando se encontraram mais tarde, Osmar contou o episódio e dramatizou:
- Sabe que eu estou com a minha cara no chão? Besta! Semelhança espantosa! Assim nunca vi, puxa! Como é que pode hein? Sentaram-se num banco de jardim. E, então, Marilena contou que o equivoco de Osmar não seria o primeiro, nem o último. Mesmo amigos e até parentes incidiam por vezes na mesma confusão. A única coisa que diferia entre as duas era um bracelete que Iara usava e a outra não. Ainda na sua impressão profunda, ele observa:
- Irmãs assim, gêmeas, são muito amigas, não são? Marilena parece vacilar:
- Depende. Ele insiste: "E vocês?". Marilena resiste:
- Você está querendo saber muito. Vamos mudar de assunto que é melhor.

O DRAMA
Desde o primeiro momento, Osmar julgou descobrir em Marilena a índole, a vocação, o destino da esposa. Uma semana depois, avisava em casa e no emprego, em toda parte:
-"Vou ficar noivo! Vou me casar!".
No fim de quinze dias começa a freqüentar a casa de Marilena. Mais tarde, ou seja, dois meses, e fica noivo. Os amigos batiam-lhe nas costas:
- Que rapidez, que pressa! Bateste todos os recordes mundiais de velocidade! Pilheriava:
- O negócio, aqui, é a jato! Passava todos os seus momentos de folga na casa da noiva. E, apesar de ver as duas irmãs diariamente, continuava fazendo o mesmo espanto: "Como é possível, meu Deus, duas criaturas tão parecidas!". E quando saia com Marilena e Iara, fazia de próprio o comentário jocoso: "Eu me sinto uma espécie de noivo de duas!". Um dia, porém, Marilena pôs-lhe a mão no braço:
- vou te pedir um favor Não brinca mais assim. É um favor. Não brinca mais assim. É um favor que te peço.
- Por quê? E ela:
- Se tu soubesses como me irrita essa semelhança' Estou cansada, farta, de ser tão parecida com Iara!
- Pausa e acrescenta, com surdo sofrimento:
- Eu não queria me parecer com ninguém! Com mulher nenhuma!

NOVO PEDIDO
Daí há dias, Marilena faz novo pedido: "Não quero que você tenha muita intimidade com Iara, sim?". Osmar, que achava abominável qualquer briga entre parentes, sobretudo entre irmãos, tomou um choque. Pigarreia e indaga: "Mas vocês não são tão amigas?". Marilena crispa-se diante dele: "Amigas, nós? Nunca!". Pela primeira vez, admite:
- Nunca brigamos, nunca discutimos e ela me trata até muito bem. Mas me odeia, ouviu? Eu sei que ela me odeia! Agarrada ao noivo, Marilena fala do sentimento turvo e constante que não se traduzem atos, em palavras. Explica: "Iara nunca me disse nada, nada, mas...". Osmar pigarreia assombrado: "Acho que você está exagerando!". Fosse como fosse, ele procurou, com o máximo de tato, discrição, afastar-se da cunhada. Mas não conseguia acreditar que Iara, tão cordial com todos e amorosíssima com Marilena, pudesse odiar alguém e muito menos a irmã. Por essa época, Iara apanhou uma gripe muito forte, quase uma pneumonia, venceu a crise, é certo; mas sua convalescença constituiu um novo problema. Depauperada, numa tristeza continua que a calava, só falava em morrer. O médico da família coça a cabeça: "Esgotamento. O golpe é ir para fora". O casamento de Marilena estava marcado para próximo. A mãe pergunta: "Não assiste ao casamento?". Iara responde:
- Não se incomode mamãe, que eu não vou fazer falta. E se eu ficar aqui não sei, não; acho que vou acabar fazendo uma bobagem! A família não teve outro remédio senão mandá-la pata a fazenda de um tio em Mato Grosso. Muito enfraquecida, Iara suspirou:- Ótimo que seja em Mato Grosso. Quanto mais longe melhor!

BODAS
Quando o avião que a levava partiu, Marilena vira-se para o noivo: "Graças, meu Deus, graças!". Essa alegria pareceu a Osmar cruel, quase cínica. Era, porém, evidente que a ausência da outra a fazia felicíssima: "Agora, sim", dizia, "agora eu sei que não me acontecerá nada!". E, de fato, um mês depois casavam-se no civil e no religioso. Como presente de casamento, haviam ganhado uma pequena casa, lírica e nupcial, em Lins de Vasconcelos. Ás dez horas da noite, deixam a casa dos pais da noiva e vão para a nova residência. Estão solitários como Adão e Eva. Ela, transfigurada, avisa: "Depois te chamo!". Entra no quarto e, ainda de noiva, fecha aporta atrás de si. Do lado de fora, ele espera, fumando, impaciente. Quinze minutos depois, bate. De dentro, vem a resposta: "Já vai". Mais quinze minutos e Marilena entreabre: "Pode vir, meu bem". Horas depois, quando já amanhecia, ele, no seu deslumbramento, passa a mão no braço da pequena. Súbito, senta-se na cama. Balbucia, apavorado: "O bracelete!". Ela responde muito doce:
- Eu não sou Marilena, eu sou Iara. Fora de si, ele se levanta, procura debaixo da cama, dos móveis; derruba uma cadeira; e, no meio do quarto, olha em torno, sem compreender. Então, Iara aponta: "Ali!". Como um louco, ele corre ao guarda-vestidos; num uivo abre as duas portas. Mas recua, numa histeria pavorosa. Lá de dentro, vem sobre ele o cadáver de Marilena, vestido de noiva. Na cama, Iara está acendendo um cigarro americano.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Sessão Pipoca: The Nymphomaniac

Shia LaBeouf jura que suas cenas de sexo em The Nymphomaniac, de Lars von Trier, serão reais
Por GQ Online

Pra valer. Vai ser assim a participação de Shia LaBeouf nas cenas de sexo (legais e ilegais) no próximo filme de Lars von Trier, The Nymphomaniac, que como o próprio título diz é repleto de… bem, sexo. “Lars é muito perigoso. É o cara mais perigoso que já me foi apresentado. Estou aterrorizado. Tanto que é por isso que tenho de fazer o filme. Vamos ver o que vai acontecer”, explicou o ator à MTV. O filme mostra a vida sexual de uma mulher contada por seu marido e tem entre as atrizes Charlotte Gainsbourg, Stellan Skarsgard e uma participação ainda não confirmada de Nicole Kidman. Shia disse na entrevista que tudo, mas tudo mesmo no filme será encenado de forma real – bastante para o período adulto da carreira do astro teen de Transformers, não?

“Tudo vai acontecer”

“O filme é o que você pensa que ele é. É Lars von Trier fazendo um filme sobre o tema. Só para vocês entenderem: existe um aviso no topo do roteiro original que recebemos que diz que tudo o que está nele vai ser feito para valer. O que for ilegal, vamos exibir com desfoque. Tirando isso, tudo vai acontecer”, explicou. Parece ser mais uma etapa da carreira do ator, que já declarou querer se afastar um pouco dos blockbuster e certamente ser visto mais como um adulto, como no clipe que já mostrava nudez e sexo de Sigur Rós, Fjögur Píanó. Já Lars von Trier passeia pela polêmica há tempos com seus filmes Dançando no Escuro (2000), Dogville (2003), Anticristo (2009, e que já exibia cenas chocantes e de nudismo) e o mais recente, Melancolia (2011) – embora a grande polêmica tenha sido sua declaração em pleno Festival de Cinema de Cannes, em 2011, de que era simpático a Hitler e que ele mesmo era um nazista. Brincadeira ou não, teve de se desculpar logo depois, mas não antes de ser considerado persona non grata em Cannes. “Eu tenho feito muita pesquisa por onde passo, conversando com mulheres, principalmente as que transaram até se acabar. Quando elas chegam aos 50 anos, não conseguem parar de falar no assunto”, brincou o diretor, em recente entrevista ao Time Out de Londres, acrescentando (brincando?) que o filme será extremamente longo, chato e filosófico.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

4 cartas-testamento de personagens que marcaram a História


Marcel Verrumo
Superinteressante

Cartas são mais do que papéis amarelos pessoais: são registros históricos de uma época e que revelam detalhes da vida de quem escreveu a trajetória das civilizações. O História sem Fim já publicou 5 cartas de amor escritas por personagens históricos e agora revela cartas-testamentos de personagens históricos que você já conhece. Confira a lista e conte para nós qual mais te emocionou.

León Trotsky (1879 – 1940)
Em 1940, o intelectual marxista e revolucionário bolchevique sofria de problemas de saúde graves e temia um atentado de inimigos. Sabia que sua morte estava próxima. Então, decidiu se debruçar sobre o papel e escrever uma carta testamento, reafirmando suas crenças no marxismo, demonstrando seu amor pela mulher que esteve ao seu lado durante décadas e declarando seu amor à vida e à esperança.

“Minha pressão sangüínea elevada (e que continua a elevar-se) engana àqueles que me são próximos sobre minhas reais condições físicas. Estou ativo e capaz de trabalhar, mas o fim está evidentemente próximo. Estas linhas serão tornadas públicas após minha morte. [...] Agradeço ardentemente aos amigos que se mantiveram leais através das horas mais difíceis de minha vida. Não cito nenhum em particular, porque não os posso citar todos. Apesar disso, considero-me no direito de fazer exceção para o caso de minha companheira, Natália Ivanovna Sedova. Além da felicidade de ser um combatente da causa do socialismo, quis a sorte me reservar a felicidade de ser seu esposo. Durante quarenta anos de vida comum, ela permaneceu uma fonte inesgotável de amor, magnanimidade e ternura. Sofreu grandes dores, principalmente no último período de nossas vidas. Encontro algum conforto no fato de que ela conheceu também dias de felicidade. Nos quarenta e três anos de minha vida consciente, permaneci um revolucionário; durante quarenta e dois destes, combati sob a bandeira do marxismo. Se tivesse que recomeçar, procuraria evidentemente evitar este ou aquele erro, mas o curso principal de minha vida permaneceria imutável. Morro revolucionário proletário, marxista, partidário do materialismo dialético e, por consequência, ateu irredutível. Minha fé no futuro comunista da humanidade não é menos ardente; em verdade, ela é hoje mais firme do que o foi nos dias de minha juventude. Natascha acabou de chegar pelo pátio até a janela e abriu-a completamente para que o ar possa entrar mais livremente em meu quarto. Posso ver a larga faixa de verde sob o muro, sobre ele o claro céu azul, e por todos os lados, a luz solar. A vida é bela, que as gerações futuras a limpem de todo ó mal, de toda opressão, de toda violência e possam gozá–lá plenamente.”
(Leon Trotsky, Coyoacán, 27 de fevereiro de 1940)

Mário de Andrade (1893 –1945)

O poeta modernista foi um dos organizados da Semana de Arte Moderna, realizada em 1922. Morreu aos 52 anos de idade, na cidade de São Paulo, devido a um infarto do miocárdio. Um ano antes, em seu testamento, dividiu – de forma objetiva – seus bens e explicou como se construía seu processo criativo. O material serviu de base para muitos trabalhos sobre o autor.

“S. Paulo, 22-III-44

Carlos,

Essa história de operação, sempre é perigoso e eu costumo pensar que pertence à dignidade humana contar sempre com a morte. Por isso lhe escrevo esta carta rápida, apenas para orientar você sobre meus desejos e intenções, a respeito exclusivamente das coisas desta terra.
Minhas obras. Deixo bastante coisa inédita, a maioria ainda se fazendo. Coisas realmente em redação definitiva deixo apenas uma série de contos, inéditos ou reformados depois da publicação, e os meus poemas “Café” e “Carro da Miséria”. Isto tudo deve ser incluído nas minhas Obras Completas. O “Carro da Miséria” será incluído no volume das “Poesias Completas”, logo antes da parte intitulada “Livro Azul”. O “Café” com nota que só a parte de poesia está em redação, [definitiva?] e a parte “Descrição” apenas em primeira anotação, terá publicação à parte. Por intermédio do Luís Saia, você entrará em combinação com o Clóvis Graciano, que o ia editar de acordo com um projeto de contrato que tenho sobre a minha secretária. Os direitos autorais dessa edição, bem como o das minhas “Obras Completas” com o editor Martins, desejo que revertam aos filhos de Lurdes, pra educação intelectual e física deles.
Bem, quanto à minha herança em dinheiro, vinda de meu pai, isso não me interessa, façam como quiserem. Os contos farão um livro à parte, pertencente às Obras Completas. Muito desagradável é o resto dos meus inéditos, que ainda estão por se fazer. Conferências como o “Seqüestro da Dona Ausente” e “Música de Feitiçaria no Brasil” podem ser publicadas tal como estão, com a advertência em subtítulo “conferência literária” porque o trabalho definitivo era muito mais sério e científico. Tal como está não passa de sugestão pra trabalhos de outrem. Os casos mais lastimáveis são o das “Danças Dramáticas” e do “Padre Jesuíno do Monte Castelo”. Estas obras não só não estão em redação definitiva como contêm erros de história ou crítica, que eu pretendia corrigir depois e fui deixando assim. Muito freqüente, meu processo de trabalho era assim, ir redigindo o que eu não sabia si era assim mas me palpitava ser assim, dependendo de verificação ou conhecimento futuro.
Ultimamente até em dezenas de afirmativas eu continuava com um “(verificar” por depender desse trabalho de verificação ou reverificação futura. Agia assim pra não prejudicar o ritmo normal da redação. [...] Resta falar de que ajuntei e ganhei por mim. Minhas cartas. Toda a minha correspondência, sem excepção, eu deixo para a Academia Paulista de Letras. Deve ser fechada e lacrada pela família e entregue para só poder ser aberta e examinada 50 (cinqüenta) anos depois da minha morte. Toda minha coleção de gravuras de qualquer processo de gravação, monotipias, aquarelas, guaches e desenhos deve ser entregue à Biblioteca Municipal.
Toda a minha coleção de quadros a ólio ou têmpera será oferecida à Pinacoteca de São Paulo. Toda a minha iconografia, jornais e quaisquer documentos da Revolução paulista de 1932 será entregue ao Instituo Histórico de São Paulo. Só se tirarão da coleção a bandeira de São Paulo em brilhantes e o anel de esmalte com as armas de São Paulo, que estão no armário de exposição de santos. A [sic; bandeira] fica com Mamãe, o anel será para o Carlos Augusto. [Sobrinho, filho de Lourdes].
Tudo quanto seja jóia de enfeite, alfinetes, brilhantes, etc. ficam pros filhos de Lurdes. [...] Me esqueci duma doação especial que guardei para o Zé Bento, meu secretário. Na secretaria que truxe [sic] do Rio, tirada a última gaveta do lado esquerdo dela, em baixo, se puxando o fundo falso, existem dez contos de réis. Esse dinheiro pertence a José Bento Faria Ferraz, assim como um objeto qualquer, de duração permanente, que você escolher. O objeto é pra ele guardar como lembrança da gratidão que lhe devo; o dinheiro é pra ele gastar como e quando bem entender, merecia muito mais, porque uma assistência como a dele não se paga. M.”

Getúlio Vargas (1882 – 1954)
Documento que já serviu de referência para diversos trabalhos acadêmicos e gerou muita polêmica, a carta de Getúlio é uma explicação do suicídio cometido em 24 de agosto de 1954 com um tiro no peito. Um documento visceral.

“Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se novamente e se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes. Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao Governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar a liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculizada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente. [...] Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na história.”

Ludwig Van Beethoven (1770 – 1827)
Um dos documentos mais importantes – e emocionantes – da História da música. Beethoven começou a ficar surdo aos 26 e, por conta da doença, foi se isolando, aos poucos, do convívio social. Na cidade de Heilligenstadt, escreveu uma carta aos seus irmãos, Karl e Johann, fazendo uma balanço de sua vida, sua obra e sua trajetória.

“Ó homens que me tendes em conta de rancoroso, insociável e misantrôpo, como vos enganais. Não conheceis as secretas razões que me forçam a parecer deste modo. Meu coração e meu ânimo sentiam-se desde a infância inclinados para o terno sentimento de carinho e sempre estive disposto a realizar generosas ações; porém considerai que, de seis anos a esta parte, vivo sujeito a triste enfermidade, agravada pela ignorância dos médicos. Iludido constantemente, na esperança de uma melhora, fui forçado a enfrentar a realidade da rebeldia desse mal, cuja cura, se não for de todo impossível, durará anos talvez! Nascido com um temperamento vivo e ardente, sensível mesmo às diversões da sociedade, vi-me obrigado a isolar-me em uma vida solitária. Por vezes, quis colocar-me acima de tudo, mas fui então duramente repelido, ao renovar a triste experiência da minha surdez! Como confessar esse defeito de um sentido que devia ser, em mim, mais perfeito que nos outros, de um sentido que, em tempos atrás, foi tõa perfeito como poucos homens dedicados à mesma arte que eu possuíam! Não me era contudo possível dizer aos homens: ‘Falai mais alto, gritai, pois eu estou surdo’. Perdoai-me se me vêdes afastar-me de vós! Minha desgraça é duplamente penosa, pois além do mais faz com que eu seja mal julgado.
Para mim, já não há encanto na reunião dos homens, nem nas palestras elevadas, nem nos desabafos íntimos. Só a mais estrita necessidade me arrasta à sociedade. Devo viver como um exilado. Se me acerco de um grupo, sinto-me preso de uma pungente angústia, pelo receio que descubram meu triste estado. E assim vivi este meio ano em que passei no campo. Mas que humilhação quando ao meu lado alguém percebia o som longínquo de uma flauta e eu nada ouvia! Ou escutava o canto de um pastor e eu nada escutava! Esses incidentes levaram-me quase ao desespero e pouco faltou para que, por minhas próprias mãos, eu pusesse fim à minha existência. Só a arte me amparou! Pareceu-me impossível deixar o mundo antes de haver produzido tudo o que eu sentia me haver sido confiado, e assim prolonguei esta vida infeliz. Paciência é só o que aspiro até que as parcas inclementes cortem o fio de minha triste vida. Melhorarei, talvez, e talvez não! Mas terei coragem. Na minha idade, já obrigado a filosofar, não é fácil, e mais penoso ainda se torna para o artista. Meu Deus, sobre mim deita teu olhar! Ó homens! Se vos cair isto um dia debaixo dos olhos, vereis que me julgaste mal! O infeliz se consola quando encontra uma desgraça igual à sua. Tudo fiz para merecer um lugar entre os artistas e entre os homens de bem.
Peço-vos, meus irmãos (Karl e Johann) assim que eu fechar os olhos, se o professor Schimith ainda for vivo, fazer-lhe em meu nome o pedido de descrever minha moléstia e juntai a isto que aqui escrevo para que o mundo, depois de minha morte, se reconcilie comigo. Declaro-vos ambos herdeiros de minha pequena fortuna. Reparti-a honestamente e ajudai-vos um ao outro. O que contra mim fizestes, há muito, bem sabeis, já vos perdoei. A ti, Karl, agradeço as provas que me de este ultimamente. Meu desejo é que seja a tua vida menos dura que a minha. Recomendai a vossos filhos a virtude. Só ela poderá dar a felicidade, não o dinheiro, digo-vos por experiência própria. Só a virtude me levantou de minha miséria. Só a ela e à minha arte devo não tere terminado em suicídio os meus pobres dias. Adeus e conservai-me vossa amizade. Minha gratidão a todos os meus amigos. Sentir-me-ei feliz debaixo da terra se ainda vos puder valer. Recebo com felicidade a morte. Se era vier antes que realize tudo o que me concede minha capacidade artística, apesar do meu destino, virá cedo demais e eu a desejaria mais tarde. Entretanto, sentir-me-ei contente pois ela me libertará de um tormento sem fim. Venha quando quiser, e eu corajosamente a enfrentarei. Adeus e não vos esqueçais inteiramente de mim na eternidade. Bem o mereço de vós, pois muitas vezes, em vida, preocupei-me convosco, procurando dar-vos a felicidade. Sêde felizes, Helligenstadt, 6 de outubro de 1812”.