quarta-feira, 27 de junho de 2012

Evidências e fatos que materializam a precarização e os indícios de irregularidades nas contas da UFOPA

Fonte: SINDUFOPA e DCE UFOPA

 No dia 04 de junho de 2012, uma comissão de representantes dos comandos de greve da UFOPA (docentes e estudantes) se reuniu com o Secretário de Ensino Superior do Ministério da Educação, Amaro Henrique Lins, em Brasília onde expuseram as reivindicações do movimento grevista da Universidade.
Na ocasião, o Diretório Central de Estudantes (DCE) protocolou documentos sobre os indícios de corrupção e irregularidades nas contas da gestão Seixas Lourenço, documentos estes que já foram encaminhados ao Ministério Público Federal para apuração das denúncias (veja aqui). O Sindicato dos Docentes da UFOPA (SINDUFOPA) protocolou um dossiê intitulado “PRECARIZAÇÃODAS CONDIÇÕES DE TRABALHO DOCENTE NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO OESTE DO PARÁ –UFOPA”, com documentos sobre a precarização do trabalho docente, assédio moral/perseguição, quebra de autonomia docente e sobrecarga de trabalho e irregularidades administrativas.
O Dossiê do SINDUFOPA consta de mais de 40 documentos que comprovam as denúncias feitas pelo sindicato, entre eles, e-mails de membros da administração superior onde fica clara a tentativa de intimidação e prática de assédio moral na Universidade.
Abaixo, reproduziremos parte do documento do SINDUFOPA, o documento completo pode ser visto aqui.
Os documentos comprobatórios estão disponíveis nos links:

PRECARIZAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE TRABALHO DOCENTE NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO OESTE DO PARÁ - UFOPA
SANTARÉM-PA - JUNHO/2012
SINDUFOPA S. Sind – ANDES-SN
Seção Sindical dos Docentes da Universidade Federal do Oeste do Pará

PARTE I - Breve descrição de evidências e fatos que materializam as precárias condições de trabalho docente na UFOPA

1 - ASSÉDIO MORAL/ PERSEGUIÇÃO
A Administração superior vem retaliando e perseguindo diversos professores(as) críticos(as) com o modelo acadêmico imposto e com a gestão desta Reitoria Pro-Tempore, caracterizada pela sua natureza arbitrária, pouco transparente e antidemocrática. Eis aqui algumas evidências e fatos comprobatórios:
1.1 - Em 15 de novembro de 2010, ex- Diretora do Centro de Formação Interdisciplinar (CFI) e atual assessora especial do Reitor Pro-Tempore, Dra. Dóris Farias, em mensagem “exclusivamente para seus docentes” sugere às “pessoas contrárias ao modelo acadêmico imposto” saírem da unidade acadêmica (CFI) e inclusive da Universidade (anexo 01). Apesar do teor ameaçador da mensagem, a partir dessa data, a Direção do CFI não facilitou nenhuma remoção de professores para outras unidades acadêmicas da instituição (ver cópias de remoções denegadas do Prof. Ricardo Scoles, anexos 03, 04 e 21).
1.2 - Em 17 de dezembro de 2011, a professora Dra. Dóris Faria, ex- Diretora do Centro de Formação Interdisciplinar (CFI) e atual assessora especial do Reitor Pro-Tempore, em resposta a solicitação de remoção do Prof. Dr. Ricardo Scoles, protocolada esta o 17 de novembro de 2010 (anexo 02), desqualifica o docente repetidas vezes a longo do texto (exemplos: anexo 03: “parece um ato de loucura ainda haver que afirme tal disparate!”; anexo 22 e 22b: “fica óbvio que não podemos ver em si qualquer interesse em promover alguma melhoria em nosso centro, jamais tivemos de si alguma ação ou atitude que fosse mais construtiva”)
1.3 - Em Janeiro/2011, E-mail da Profa. Doris Farias, ex- Diretora do Centro de Formação Interdisciplinar (CFI) e atual assessora especial do Reitor Pro-Tempore, desqualifica publicamente docentes da UFOPA de forma altamente agressiva: “só mesmo a reação local poderá calar estas bocas cheias de vermes, estas mãos tão inúteis, estas idéias tão mofadas!” (anexo 05)
1.4 - Em marco/2011, após manifestação estudantil durante a Aula Magna, ocorre a instauração de Processo Administrativo Disciplinar - Portaria nº 1.011, de 19/03/2011 (anexos 06 e 07) para processar o Prof. Dr. Gilson Costa (segue defesa do docente indiciado protocolada na UFOPA, anexo 08). Também foi processado o técnico administrativo Wallace Carneiro de Sousa. Tais processos culminaram na advertência do docente e do técnico.
1.5 - Pedagogia do medo: Por conta também da manifestação na Aula Magna/2011, a reitoria da UFOPA instaurou processos contra aproximadamente 40 estudantes (anexos 09, 10, 11, 12, 13).
1.6 - Após instauração dos PADs, os docentes da UFOPA, reunidos em assembleia, solicitam invalidação da Portaria 11.011. (anexo 14). Tal solicitação foi negada pela Administração Superior.
1.7 - Em setembro/2011, o ANDES-SN divulga matéria sobre “assédio moral na UFOPA” (anexo 15).
1.8 - E-mail de Convocação da Direção do Centro de Formação Interdisciplinar (CFI) do dia 28 de fevereiro de 2012 destinado à Profª Márcia Saraiva solicitando comparecimento no local de trabalho e insinuando, desrespeitosamente, desaparecimento da servidora do local de trabalho (anexo 16). É importante ressaltar que tal convocação se deu no contexto em que a professora estava solicitando antecipação da Licença Maternidade. Profª Márcia Saraiva é Diretora do Sindicato e já sofreu várias ações de assédio moral e retaliações por parte da Direção do CFI. Em carta pública dirigida a Comunidade Acadêmica da UFOPA, a profª Marcia Saraiva denuncia as atitudes desrespeitosas da Direção do CFI (anexo 17)
1.9 - Quatro professores do Centro de Formação Interdisciplinar (CFI) receberam notificação do parecer conclusivo do Primeiro Ano do Estágio Probatório (março 2012) quase quatro meses depois dos pareceres individuais (outubro 2011) e oito meses depois da autoavaliação realizada pelo servidor (julho 2011). As quatro avaliações tiveram pontuação baixa, apesar de que a Comissão de Avaliação não apresentou fatos comprobatórios que justificassem tais pontuações (anexo 18: cópia de uma das avaliações). Após solicitação de cópia do processo por parte dos professores, a Direção Gestão e Desenvolvimento de Pessoas (DGDP) da UFOPA retornou os pareceres para a Comissão de Avaliação por erros de forma, deixando o processo estagnado, inconcluso. Destaca-se que um dos professores recebeu avaliação final de 2,6 sobre 10 apesar de ter boas avaliações entre os discentes e ter publicado, nos últimos dois anos, quatro artigos científicos, dois deles em revista de alto impacto (Human Ecology; Forest, Ecology and Management; anexo 19: capa dos quatro artigos publicados pelo docente).
1.9.1 – Segue também “Relatório de Assédio Moral de dirigentes da UFOPA sobre o servidor Gilberto César Lopes Rodrigues”: o professor descreve situações de assedio moral promovidas pela Sra. Dóris Santos de Faria (ex-diretora do Centro de Formação Interdisciplinar e atual Assessora Especial da Reitoria da UFOPA) e pelo Sr. Aldo Queiroz, Pró-reitor de Planejamento da Instituição (anexo20).

2 - PRECÁRIAS CONDIÇÕES DE TRABALHO/ SOBRECARGA
A UFOPA é fruto do REUNI – Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais – ampliou no número de vagas ofertadas no Ensino Superior, mas não garantiu os recursos necessários para essa expansão. Assim, em muitas universidades federais faltam professores, espaços e equipamentos. Na UFOPA, a coisa não é diferente. Faltam espaços de trabalho para os docentes, alunos ainda estudam em espaços alugados/improvisados e a sobrecarga de trabalho passa a ser naturalizada. Evidências dessa situação:
2.1 - Em Dezembro/2011na “Carta de Esclarecimentos” (anexo 23), a Profª Fátima Matos, atual diretora do Centro de Formação Interdisciplinar CFI, revela em vários trechos a sobrecarga de trabalho docente na UFOPA e no PARFOR.
2.2 - Em Dezembro/ 2012, a diretoria da SINDUFOPA se reuniu com a Reitoria da UFOPA e exigiu melhoria das condições de trabalho (garantia da autonomia docente e espaços dignos de trabalho para todos os professores) por meio do Ofício nº 02/2011 (anexo 24). Até o momento nenhuma atitude concreta foi tomada pela Reitoria.
2.3 - Em janeiro/2012, a partir das várias denúncias feitas pela direção da SINDUFOPA, o ANDES – SN divulgou matéria em seu Site Oficial (www.andes.org.br) relatando a expansão precarizada das IFES da Região Norte (anexo25).
2.4 - Em Fevereiro/2012, na “Carta Aberta: trabalho precarizado no PARFOR” (anexo 26) a SINDUFOPA denunciou as precárias condições de trabalho docente no Programa Nacional de Formação de Professores de Educação Básica – PARFOR. Essa carta foi também encaminhada ao Ministério Público Federal (anexo 43)
2.5 – Nos dias 12 e 13 de março/2012 – após aprovação em Assembleia Geral Docente – professores da UFOPA paralisaram suas atividades devido às precárias condições de trabalho as quais são submetidos na instituição. A pauta local de reivindicação dos professores foi amplamente divulgada (anexo 27).
2.6. Muitos docentes da instituição tem sobrecarga de trabalho e apresentam Planos Individuais de Trabalho (PIT) com carga horária que ultrapassa as 40 horas semanais, o que tem obrigado a estes servidores públicos a desenvolver as atividades de pesquisa e extensão os fines de semana (anexo 28: PIT de 2º semestre de 2011 de um docente com o computo de 61 horas semanais!).

3 - IRREGULARIDADES ADMINISTRATIVAS
Dois casos são emblemáticos dentro da UFOPA: 1) afastamento de servidor público federal para tratamento de saúde por meio de Laudo Médico Pericial Inverídico; 2) existência de professores que não são da Carreira de Magistério Superior Ministrando aulas na Universidade e assumindo cargos de direção.
3.1 - Em Dezembro/ 2011, a Diretoria da SINDUFOPA, reunida com a Reitoria da UFOPA, protocolou o Ofício nº 05/2011 (anexo 29), até o momento não respondido, que solicita esclarecimentos referentes a dois fatos relacionados ao Laudo Médico Pericial nº 0.081.342/2011 (anexo 30) que culminou na Licença para Tratamento de Saúde do Prof. Dr. Gilson Costa, docente lotado no Instituto de Ciências e Sociedade – ICS (anexo 31: Portaria 1.428, de 07 de dezembro de 2011; anexo 32: Mem. nº 1.205-2011-DGDP). No Ofício nº 05/2011, são estes os dois fatos apresentados:“FATO PRIMEIRO: O referido laudo informa que a perícia foi realizada em Belém-PA, no dia 03 de novembro de 2011. Entretanto, o docente afirma que nenhuma perícia foi realizada e que na referida data se encontrava na cidade de Santarém-PA. Considerando que um laudo pericial deve ser feito mediante presença do servidor, esta diretoria solicita esclarecimentos sobre o procedimento adotado por esta Instituição Federal de Ensino Superior para a realização da perícia oficial do prof. Gilson Costa. FATO SEGUNDO: No dia 12 de dezembro de 2011, via e-mail (anexo), o docente foi informado do “Cancelamento da Perícia”; diante disso, esta diretoria solicita esclarecimentos sobre o procedimento adotado pela instituição para o cancelamento da referia perícia médica oficial, visto que uma perícia somente pode ser cancelada após o servidor ser submetido a nova inspeção médica, que concluirá pela volta ao trabalho ou pela prorrogação da licença”
3.2 - Em Fevereiro/ 2012 a Diretoria da SINDUFOPA (anexo) encaminhou ofício nº 03/2012 (anexo 33) solicitando que da Reitoria a relação de professores da Educação Básica que estão exercendo funções na UFOPA. Em anexo, seguem pareceres nº 344/2007, 347/2007, 350/2007 e 351/2007 (respectivamente os anexos 34, 35, 36, 37a e 37b), do Procurador Federal Bernardino Ribeiro, que confirmam que “professores do magistério de primeiro e segundo graus não podem atuar como docentes do ensino superior sem aprovação e classificação em concurso público, nos moldes das disposições da Constituição Federal e da legislação vigente”. O ofício nº 03/2012 até o momento também não foi respondido.
3.3 - Em maio/2012, a Diretoria da SINDUFOPA solicitou, por meio do Ofício nº 13/2012 (anexo 38), impugnação da banca de Avaliação de Estágio Probatório I Etapa dos (as) docentes concursados Myrian Sá Leitão Barboza, Nelcilene da Silva Palhano, Ricardo Scoles e Rodrigo Canal, professores (as) do Centro de Formação Interdisciplinar- CFI, da UFOPA, que foram avaliados (as) por comissão composta por professora que não prestou concurso para a Carreira do Magistério Superior (Profª. Dra. Fatima Matos). Uma cópia desse ofício já foi encaminhada ao Ministério Publico Federal – MPF (anexo 39), juntamente com o parecer nº 350/2007 e a Instrução Normativa nº 8 (anexo 40), de fevereiro de 2011, que dispõe sobre o Procedimento de Avaliação do Estágio Probatório dos servidores Técnicos Administrativos em Educação e Docentes da UFOPA.

4 - QUEBRA DA AUTONOMIA DOCENTE
O modelo acadêmico da UFOPA tem intensificado o processo de precarização do trabalho docente, das relações acadêmicas solidárias e do ensino superior público. Evidências:
4.1 - Em Junho/2011 ocorreu a Divulgação da Carta “IDA: falso ou verdadeiro” (anexo 41), assinada por professores da Universidade, que questiona os processos avaliativos do Centro de Formação Interdisciplinar-CFI, bem como o próprio modelo acadêmico. Em anexo, normativa que regula o calculo da nota dos acadêmicos ingressos na UFOPA.
4.2 - Em novembro/2011 a Diretoria do SINDUFOPA divulgou nota de repúdio (anexo 42) reprovando a decisão de inutilização da disciplina “Formação Social, Política e Econômica do Brasil”, do Instituto de Ciências da Sociedade - ICS, divulgada pelo memorando 0235/2011, da Pró-Reitoria de Ensino de Graduação – PROEN/UFOPA (anexo 47).

Pátria Amada: Decretada prisão preventiva de ativistas o Xingu Vivo em Altamira.


Movimento Xingú Vivo

Informações que chegam agora de Altamira – PA, confirmam que foi decretada a prisão preventiva de 11 ativistas do Movimento Xingu Vivo para Sempre, que participaram do Seminário “Xingu + 23” de 13 a 20 de junho deste ano.
Segundo fontes do Movimento, o pedido de habeas corpus preventivo, que tinha sido encaminhado pelo advogado Marco Apolo Leão, foi negado pela Juíza da 3 Vara Penal de Altamira.
Por sua vez a mesma Juíza acolheu o pedido da polícia civil e decretou a prisão preventiva dos 11 ativistas.
A polícia de Altamira, na tentativa de criar factóides em favor da NESA e do CCBM, já está considerando os ativistas como foragidos, quando na verdade são padres, freiras, pescadores, jornalistas e pessoas ligadas aos Movimentos Sociais e dos Direitos Humanos. Todos com endereço fixo, profissão reconhecidas e sem antecedentes criminais.
Mais uma vez a justiça brasileira se coloca ao lado dos poderosos, criminalizando pessoas que optaram lutar em defesa da vida e dos povos do Xingu.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Cúpula dos Povos promete grande manifestação na Zona Oeste

Encontro acontece na Vila do Autódromo, nesta quarta (20), a partir das 8h. Grupo protesta a favor da comunidade ameaçada por obras na região.


Do G1 RJ


Os movimentos populares participantes da Cúpula dos Povos, maior evento paralelo à Rio+20, prometem realizar nesta quarta-feira (20) uma grande manifestação na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Apesar da Cúpula estar localizada no Aterro do Flamengo, Zona Sul da cidade, o encontro será na Vila do Autódromo, às 8h. Vários ônibus sairão dos alojamentos a partir das 6h20.
A manifestação do Dia das Grandes Marchas dos Povos e dos Movimentos Sociais irá até o Riocentro. Os participantes irão protestar a favor da comunidade ameaçada pelas obras dos Jogos Olímpicos.
Ainda pela manhã, às 11h, acontece mais um evento da Cúpula dos Povos. O Complexo do Alemão recebe o Projeto Verdejar, que é a qualificação de jovens para a construção de cisternas de 16 mil litros de água.
No período da tarde, às 15h, o Centro do Teatro Oprimido vai fazer uma passeata mostrando o momento político e estético através da teatralização. A manifestação, que reunirá vários movimentos sociais, começa na Candelária e vai até a Cinelândia, no Centro do Rio.
Entre as atividades da Cúpula que acontecem no Aterro do Flamengo, estão previstas: Gaia Education – Ecovillages and Transition Towns, um laboratório sobre Práticas Sustentáveis, que acontece na Tenda Maria Bonita (G), das 18h às 20h30 e ainda o workshop “Right to Water”, Territórios do Futuro / Direito à Água, organizado pelo Institute for Agriculture and Trade Policy, que será na Tenda Olga Benário, das 11h30 às 13h30.


Cúpula dos Povos
A Cúpula dos Povos é um evento paralelo à Rio+20, onde organizações da sociedade civil discutem temas relacionados à Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável. A organização espera reunir 18 mil pessoas.




Programação
O público esperado para essa edição do evento é quase o dobro do que compareceu à Cúpula dos Povos em 1992, durante a Rio-92. O encontro quer que os temas discutidos na Rio+20 não fiquem só no papel, mas se transformem em práticas sociais. Para saber toda a programação do evento, com os horários das atividades, acesse o link aqui.
A ideia dos organizadores é ir além dos temas que serão debatidos no Riocentro, onde acontece a conferência oficial com representantes de 193 países, e realizar debates de forma independente, e com a possibilidade de assumir tons mais críticos ao que está sendo decidido pelos governos.
Um mês antes do início da conferência, representantes da Cúpula dos Povos apresentaram um documento mostrando que o debate principal do grupo vai girar em torno da rejeição à mercantilização da natureza e ao que chamam de "economia verde".
Entre os temas a serem debatidos estão não apenas o próprio desenvolvimento sustentável, mas também o conceito de economia verde, assuntos relativos a florestas, oceanos, a crise econômica global e seus reflexos sobre o G-20, e os conflitos socioambientais nos Estados Unidos e na Europa.
A Cúpula dos Povos vai ter debates até o sábado (23), depois do encerramento da conferência oficial.

Protestos fecham Parque dos Atletas nesta quarta-feira


Somente expositores credenciados terão acesso exclusivo ao local. Manifestações vão ocorrer na região da Barra da Tijuca e Centro.


Do G1 RJ


O Parque dos Atletas, ao lado Riocentro, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, será fechado durante a parte da manhã nesta quarta-feira (20), devido a três manifestações que estão previstas para ocorrer perto do local. O parque é onde os chefes de Estado vão se reunir para a Cúpula da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável - Rio+20. As informações foram divulgadas pelo Centro de Operações da prefeitura da cidade, na noite desta terça-feira (19).
De acordo com o Centro de Operações, somente expositores credenciados terão acesso exclusivo ao local. Os protestos serão da Cúpula dos Povos e vão ocorrer na região da Barra da Tijuca e do Centro da cidade.
A primeira manifestação está prevista para ocorrer às 9h na Avenida Embaixador Abelardo Bueno, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste, e as outras duas têm previsão para a parte da tarde, na Avenida Presidente Vargas, na altura da Avenida Rio Branco, no Centro.
Ainda de acordo com o Centro de Operações, caso os protestos ocorram, operadores da Companhia de Engenharia de Tráfego do Rio de Janeiro (CET-Rio) ficarão posicionados nos principais cruzamentos das vias e também utilizarão painéis de mensagens variáveis por meio de 35 câmeras posicionadas ao longo do percurso.
 Avenidas Salvador Allende e Embaixador Abelardo Bueno
Uma manifestação da Cúpula dos Povos também programada para acontecer na manhã desta quarta-feira (20), antecipou para as 7h o fechamento das avenidas Salvador Allende e Embaixador Abelardo Bueno, ambas na Barra da Tijuca, na Zona Oeste da cidade.
As vias, que seriam interditadas às 17h, tiveram o horário antecipado devido a um pedido do Comando Militar do Leste (CML) que visa garantir a segurança dos chefes de Estado que vão chegar à cidade no dia do protesto.
A Avenida Salvador Allende será interditada em ambos os sentidos, no trecho entre o primeiro retorno após a Avenida das Américas até a Estrada dos Bandeirantes. Já na Embaixador Abelardo Bueno, a interdição também ocorre nos dois sentidos, entre a Salvador Allende e a Estrada Coronel Pedro Correa. O acesso será exclusivo somente para carros credenciados e moradores da região.
O horário de reabertura de ambas as avenidas está previsto para as 22h.

terça-feira, 19 de junho de 2012

Movimentos populares prometem 2° dia de protestos na Cúpula dos Povos


Pela manhã, haverá ato contra militares que participaram da ditadura. À tarde, grupos organizam Marcha da Maconha no Aterro do Flamengo.
Do G1 RJ

 Os movimentos populares participantes da Cúpula dos Povos, maior evento paralelo à Rio+20, prometem realizar nesta terça-feira (19) mais um dia de protestos na cidade. Pela manhã, está programado um ato contra militares que participaram da ditadura. À tarde, haverá a Marcha da Maconha, no Aterro do Flamengo, na Zona Sul, pedindo por mudanças na legislação da política de drogas do país.
Às 8h, integrantes da Articulação Nacional pela Verdade e Justiça junto com a Via Campesina vão se concentrar na Avenida Pasteur, na Urca, também na Zona Sul. Os manifestantes cobram pelo julgamento de ex-agentes da ditadura militar.
A partir das 14h, grupos favoráveis à descriminalização da maconha e ao cultivo caseiro da erva se concentram no Museu de Arte Moderna (MAM). De acordo com os organizadores, às 16h20, os protestantes seguem para uma caminhada pelo Aterro do Flamengo, onde acontecem os debates da Cúpula dos Povos.
Na segunda-feira (18), três protestos causaram um caos no trânsito nas principais vias do Centro.

Cúpula dos Povos
A Cúpula dos Povos é um evento paralelo à Rio+20, onde organizações da sociedade civil discutem temas relacionados à Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável. A organização espera reunir 18 mil pessoas.

Programação
O público esperado para essa edição do evento é quase o dobro do que compareceu à Cúpula dos Povos em 1992, durante a Rio-92. O encontro quer que os temas discutidos na Rio+20 não fiquem só no papel, mas se transformem em práticas sociais. Para saber toda a programação do evento, com os horários das atividades, acesse o link aqui.
A ideia dos organizadores é ir além dos temas que serão debatidos no Riocentro, onde acontece a conferência oficial com representantes de 193 países, e realizar debates de forma independente, e com a possibilidade de assumir tons mais críticos ao que está sendo decidido pelos governos.
Um mês antes do início da conferência, representantes da Cúpula dos Povos apresentaram um documento mostrando que o debate principal do grupo vai girar em torno da rejeição à mercantilização da natureza e ao que chamam de "economia verde".
Entre os temas a serem debatidos estão não apenas o próprio desenvolvimento sustentável, mas também o conceito de economia verde, assuntos relativos a florestas, oceanos, a crise econômica global e seus reflexos sobre o G-20, e os conflitos socioambientais nos Estados Unidos e na Europa.
A Cúpula dos Povos vai ter debates até o sábado (23), depois do encerramento da conferência oficial.

Servidores do Itamaraty entram em greve


Agência Estado

 
BRASÍLIA - Pela primeira vez na sua história, o Itamaraty enfrenta, desde esta segunda-feira, 18, uma greve dos seus servidores. Oficiais de Chancelaria, Assistentes de Chancelaria e, de acordo com o sindicato da categoria, até mesmo alguns diplomatas decidiram pela paralisação em uma assembleia realizada em Brasília, que contou com a participação, via redes sociais, de funcionários de fora do País.
Pelo menos 60 postos no exterior, incluindo o atendimento consular em Paris, Roma, Londres, Nova York, Los Angeles e Washington serão afetados. Às vésperas das férias de julho, o problema pode repercutir diretamente nos milhares de brasileiros que devem viajar para o exterior nos próximos dias e nos estrangeiros que virão ao Brasil. Uma das poucas atividades que não serão prejudicadas pela greve é a organização da Conferência Rio +20.
A decisão da assembleia ressalta que o os funcionários que estão na organização do encontro de mais de 150 chefes de Estado, que termina no final dessa semana, será preservado. Nele estão mais de 200 diplomatas, oficiais e assistentes. Dos cerca de 500 que ficaram em Brasília, 300 participaram da assembleia.
Os oficiais e os assistentes de chancelaria são, normalmente, os responsáveis pelas funções administrativas das embaixadas, consulados e também da sede do ministério, em Brasília. O trabalho inclui também o atendimento direto ao público, o atendimento telefônico das unidades consulares e até mesmo a emissão de novos passaportes - que, apesar de ser autorizada pelos diplomatas, passa pelas mãos dos oficiais. O Itamaraty admite que durante o período da greve, o trabalho poderá ficar mais lento e terá que ser assumido pelos diplomatas.
De acordo com o SindItamaraty, que representa todas as categorias de servidores do chamado Serviço Exterior Brasileiro, o que os funcionários querem é a equiparação com os salários mais altos das carreiras de Estado. No caso dos diplomatas, os vencimentos subiriam pouco: dos atuais R$ 12.960, em início de carreira, para os R$ 13,6 mil de um auditor fiscal. O salário final passaria de R$ 18.470 para R$ 19.689, os vencimentos de um delegado da Polícia Federal.
Os maiores aumentos seriam para os Oficiais e Assistentes. Os primeiros, que hoje recebem inicialmente R$ 6,3 mil, passariam para a segunda categoria de vencimentos de nível superior do governo federal, R$ 12.960. Os assistentes passariam à primeira categoria dos cargos de ensino médio, saindo de um salário R$ 3,1 mil para R$ 5,8 mil - em valores de hoje, já que a maior parte das categorias classificadas nessas faixas também hoje pede reajustes, que os servidores do Itamaraty também pretendem receber.
Em uma carta enviada ao ministro das Relações Exteriores, Antonio de Aguiar Patriota, no dia 14 deste mês, os servidores informavam sobre a possibilidade de greve e suas reivindicações, que estão sendo negociadas com o Ministério do Planejamento. Até agora, no entanto, não houve nenhum sinal positivo. Os servidores já haviam feito uma paralisação no dia 30 de maio, mas as negociações não avançaram. A greve é por tempo indeterminado, mas uma nova assembleia foi marcada para sexta-feira com a intenção de avaliar alguma proposta do Planejamento, se houver.

Rádio que funcionava na Cúpula dos Povos, no Rio, é fechada


G1

Emissora funcionava sem autorização do Ministério das Comunicações. Sinal da rádio poderia prejudicar tráfego aéreo, dizem especialistas.

 
A Agência Nacional das Telecomunicações (Anatel) tirou do ar a rádio que funcionava na Cúpula dos Povos, no Aterro do Flamengo, na Zona Sul do Rio, na noite de domingo (17). A emissora não tinha autorização do Ministério das Comunicações para funcionar e, segundo técnicos, o sinal poderia interferir no controle do tráfego aéreo do Aeroporto Santos Dumont, no Centro do Rio, conforme mostrou o Bom Dia Rio.
Manifestantes cercaram a rádio e policiais fizeram o patrulhamento no local. A reunião com o secretário executivo das telecomunicações e representantes da rádio durou mais de duas horas e era fechada. Depois de analisar os equipamentos utilizados para a transmissão veio a determinação para suspender as transmissões, uma vez que havia risco de interferência nas comunicações das aeronaves.
O instrumento conhecido como analisador de espectro é usado para confirmar o uso radiofreqüência. Sempre que o sinal oscila, significa que há alguém se comunicando por ondas de rádio.
De acordo com o secretário executivo do Ministério das Comunicações Cézar Alvarez, a rádio será reaberta assim que houver a confirmação da viabilidade do uso dos equipamentos. “A programação ficará suspensa até o momento em que encontra-se uma nova freqüência e eles sejam capaz de ter um equipamento confirmado por nós sem estes problemas. Isso acontecendo, haverá, então, uma licença extraordinária”, disse.
Segundo o representante do ministério, há a possibilidade de a rádio voltar a operar ainda nesta segunda-feira (18), após a regularização da situação dos equipamentos da emissora.
Para Arthur William, da Associação Mundial da Rádio Cúpula dos Povos, o processo de legalização da rádio pode ser demorado.
“O ministério de Comunicações vai viabilizar a legalização da Rádio Cúpula dos Povos para que ela volte a operar amparada pela lei, que é um processo muito burocrático legalmente para as rádios comunitárias fazerem isso. Então a gente, através dessa pressão da sociedade vamos agilizar esse processo da Rádio Cúpula dos Povos”, explicou.

Mulheres tiram a blusa para protestar pelas ruas do Rio

G1

Grupo saiu da Cúpula dos Povos e seguiu até o Largo da Carioca, no Centro. Elas pediram justiça social e ambiental durante a Rio+20 nesta segunda.
Integrantes de 31 entidades feministas tiraram a camisa durante a Marcha das Mulheres, no começo da tarde desta segunda-feira (18). Elas pediram justiça social e ambiental durante as atividades da Cúpula dos Povos, evento paralelo à Rio+20.
Cerca de 5 mil mulheres circularam pelo Centro do Rio e provocaram congestionamento na região, segundo informações da CET-Rio.
O grupo seguiu pelas avenidas Almirante Barroso, Rio Branco e Nilo Peçanha e pela Rua da Assembleia, onde interromperam a caminhada no Largo da Carioca. A manifestação foi seguida por outra feita por indígenas de várias partes do país. Eles reivindicaram a demarcação de terras e exploração de territórios.
Para Alessandra Guerra, do grupo Tambores de Safo, de Fortaleza, a oportunidade serviu para mostrar que as mulheres ainda não têm espaços e oportunidades iguais às dos homens. "Nós também sentimos calor e queremos tirar a camisa sem sermos olhadas pelos homens como objetos, como carne. Somos pessoas como as outras e queremos ter esse direito."
"Somos um grupo de mulheres lésbicas e bissexuais que usa o batuque para fazer revolução. Estamos acompanhando a agenda da Cúpula dos Povos. Temos uma programação política e vamos acompanhar todas as marchas", disse Alessandra, que reclamou dos olhares sexualizados de alguns homens durante a caminhada no Rio.
"A gente até espera a reação das pessoas quando tiramos a camisa. Tentamos quebrar esse tabu porque faz parte da nossa cultura. Tanto homem como mulher se assustam com isso. O corpo da mulher precisa ser guardado por uma razão que não se sabe. Se usamos uma saia curta é porque queremos ser estupradas. Porque a sociedade não ensina os homens a não estuprar?", afirmou Alessandra, que é paulista e vive em Fortaleza há nove anos.

A estudante de engenharia ambiental Ludmila Rentas disse que a mulher precisa conquistar mais respeito dos homens. "É um absurdo. Estamos num país que adora exportar o carnaval, a nudez, o brilho e todo esse glamour que existe no carnaval, mas a mulher está se tornando um mero material para o prazer do homem. A gente luta por igualdade e respeito, não é uma visão machista e sexual que a gente espera."
Segundo ela, o homem ainda não está acostumado a ver uma mulher sem camisa. "O homem precisa aprender a olhar uma mulher com os seios de fora", disse Ludmila.


Organização
De acordo com Isabel Freitas, uma das organizadoras da Marcha das Mulheres, elas reivindicam a igualdade entre mulheres e homens e a legalização do aborto. "Vamos continuar a nossa marcha pelos direitos da mulher e pela igualdade social. Não podemos aceitar essa discriminação e diferença. Queremos igualdade de salários e cargos. Hoje é um dia especial para nos, num momento em que todos os lideres estão discutindo um futuro melhor para o nosso planeta. E é através disso que vamos passar nossa mensagem", disse.
A caminhada
Com faixas, camisas, bandeiras e carro de som, as mulheres saíram do Sambódromo, no Centro, às 7h30, e seguiram em marcha até o Museu de Arte Moderna (MAM), onde realizaram discursos e realizaram uma batucada.
No clima da Rio+20, as manifestantes usaram garrafas plásticas, vasilhas e baldes como tambores. Com rostos pintados, as mulheres chamaram a atenção de turistas e publico que visita a Cúpula dos Povos.
A Cúpula dos Povos é um evento paralelo à Rio+20, onde organizações da sociedade civil discutem temas relacionados à Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável. A organização espera reunir 18 mil pessoas.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Dom Erwin Kräutler: “Lula e Dilma passarão para a História como predadores da Amazônia”



Movimento Xingú Vivo

O lendário bispo do Xingu, ameaçado de morte e sob escolta policial há seis anos, afirma que o PT traiu os povos da Amazônia e a causa ambiental (Eliane Brum, Época, 04.06.2012).
Afirma também que Belo Monte causará a destruição do Xingu e o genocídio das etnias indígenas que habitam a região há séculos. Há 47 anos no epicentro da guerra cada vez menos silenciosa e invisível travada na Amazônia, Dom Erwin Kräutler encarna um capítulo da história do Brasil.
Nesta segunda-feira, um homem grande, de sorriso caloroso e cabelos brancos, embarcou em um avião para o Brasil. Para o Brasil apenas, não. Para a Amazônia. Depois de 40 dias na Áustria, a terra onde nasceu, ele sente falta da geografia que escolheu para ser sua desde o momento em que, ainda jovem e tropeçando no português, descobriu maravilhado que o Reno é “um igarapé comparado ao Xingu”. Dom Erwin suspira de saudades do rio, das gentes, dos cheiros e até do clima da cidade paraense de Altamira, com temperaturas e humores tão intratáveis que só agrada aos mais fortes. Este homem, que circulava livremente por ruas imaculadas na primavera austríaca, onde foi garimpar recursos para projetos sociais na Amazônia, volta agora para sua rotina de prisioneiro. Há seis anos, Dom Erwin Kräutler, bispo do Xingu, não dá um passo no Brasil sem estar sob a escolta dos quatro policiais que se alternam para proteger sua vida.
Perto de completar 73 anos, Dom Erwin, que acolheu e depois enterrou a missionária assassinada Dorothy Stang, vive na mira de pistoleiros. Homens contratados por gente graúda para calar uma voz que há quase meio século eleva o tom na defesa dos mais pobres e dos mais frágeis, dos indígenas, dos ribeirinhos e dos extrativistas da Amazônia. Dom Erwin tem escrito, com rara coerência, um capítulo crucial de uma história pouco contada no Brasil: o papel da Igreja Católica, especialmente a dos religiosos ligados à Teologia da Libertação e às comunidades eclesiais de base, na proteção dos povos da floresta – e da própria Amazônia – a partir da segunda metade do século XX.
A maioria das etnias indígenas e das comunidades amazônicas que conquistaram direitos e terras nas últimas décadas deve parte de sua organização aos setores mais progressistas da Igreja Católica. Assim como parte das lideranças políticas que hoje influenciam os rumos do país surgiu na atuação de base da Igreja. Isso vai muito além da religião – é História. E uma história cujo sentido as alas mais conservadoras da própria Igreja preferem enfraquecer. Neste capítulo, Dom Erwin, capaz de falar tão bem o grego clássico quanto a língua dos Kayapó, é um dos protagonistas mais fascinantes.
E resistente. A cada ano, apesar da idade avançada e das dores na coluna, ele visita 15 paróquias do Xingu. Ao alcançá-las, peregrina pelas comunidades dos cafundós. Dorme no barco, dorme em rede. Acostumou-se tanto à dieta local, que fica feliz por comer peixe no almoço e no jantar, de segunda a segunda. É adorado pelo povo mais pobre – e odiado sem reservas por parte da elite paraense, que o ataca também pela imprensa de Belém do Pará.
Desde a decisão de Lula, e agora de Dilma Rousseff, de arrancar Belo Monte do papel, o quase lendário bispo do Xingu tem feito uma oposição incansável contra a hidrelétrica que provoca controvérsia dentro e fora do Brasil. Por causa dela, tornou-se uma presença incômoda para setores do governo e do PT que um dia apoiou – inclusive com o seu voto. Incômoda, especialmente, porque é difícil destruir a reputação de um bispo que mantém a coerência desde a ditadura militar em uma das regiões mais conflagradas do país, ajudou a escrever os artigos da Constituição de 1988 que garantem os direitos indígenas e não recuou nem mesmo diante da ameaça de perder a própria vida.
Nesta entrevista, Dom Erwin diz o que pensa contra antigos aliados com o mesmo desassombro com que denunciou grileiros e estupradores no passado recente. Acusa o PT de “traidor” – e diz que alguns petistas são “fanáticos religiosos”. Afirma que Lula e Dilma implantaram uma “ditadura civil” ao “desrespeitar os direitos indígenas assegurados na Constituição”. E afirma que Lula passará para a História como “o presidente que destruiu a Amazônia e deu o golpe nos povos indígenas”.
Às vésperas da Rio + 20, o depoimento de Dom Erwin Kräutler abre uma janela para a compreensão da história contemporânea. A entrevista a seguir foi feita na casa do bispo, em Altamira, com os policiais militares que o protegem do lado de fora da porta, mas atentos. Os quatro policiais demonstram uma preocupação que transcende o dever: adoram Dom Erwin, que conhece suas mulheres e filhos e escuta suas aflições de cada dia.
Em três horas de conversa, Dom Erwin não evitou nenhuma pergunta. Vale a pena abrir um espaço para escutar com atenção um homem capaz de apontar as contradições e ampliar a complexidade do momento estratégico vivido pelo Brasil, no qual as escolhas tomadas hoje determinarão o que seremos amanhã.

Dom Erwin Kräutler: “Quando eu vi o Xingu, perdi o fôlego” – parte 2


Movimento Xingú Vivo

 
- O que o senhor faz quando está na Áustria e qual é a sensação de viver sem escolta, sem policiais ao redor?
Dom Erwin Kräutler – É necessário que eu passe todos os anos pelo menos um mês na Áustria, com a finalidade de conseguir recursos para manter e sustentar as obras sociais e pastorais do Xingu. Tenho, além disso, muitos convites de universidades e organizações que defendem os Direitos Humanos e o Meio Ambiente. Quando é possível, eu me hospedo na minha casa materna/paterna e vivo, fora dos compromissos, uma vida de “eremita”. Isso me faz um bem enorme. Ando livremente pelos bosques da terra onde nasci. Admiro a natureza, as flores, os campos, as árvores que na primavera se revestem de sua folhagem de tons tão diversos. Levanto antes das 5 horas para poder “ouvir o silêncio” matutino e ver os primeiros raios do sol. É maravilhoso. É uma sensação de liberdade total que faz bem à alma e ao coração.

- Como um austríaco escuta pela primeira vez a palavra Xingu e acaba se mudando para o Brasil e fazendo do Xingu a sua casa?
Dom Erwin - Ouvi a palavra Xingu pela primeira vez aos 4 ou 5 anos, durante a Segunda Guerra Mundial. A minha mãe sempre falava do irmão dela, Dom Eurico Kräutler, na época Padre Eurico, que estava no Brasil desde 1934. Uma vez ele mandou, junto com a carta, algumas fotos. Eu lembro perfeitamente das casas de palha – ele na frente, naquele tempo de batina, com uma criança, um indiozinho, mostrando a câmara com o dedo. Como a gente diz: Olha o passarinho! Foi a primeira foto do Xingu que vi na minha vida.

- O que o senhor sentiu?
Dom Erwin - (rindo) Senti uma profunda simpatia por aquela criança, que era diferente, que estava pintada. Desde então, nós sempre perguntávamos à minha mãe sobre os índios. Meu tio mandava as cartas, que eram lidas em casa pela minha mãe, depois passavam para a minha tia, e então para a minha madrinha, iam passando por todos os parentes. Tínhamos a foto de um índio na parede. Eu lembro até o nome dele: “Patoit”. Significa “braço forte”. Temos a foto dele lá em casa (na Áustria), com a mulher e o filho.

- Essa foto ainda existe?
Dom Erwin – Sem dúvida. No meu quarto, na casa de meus pais, ela foi substituída por uma foto mais recente, de uma índia Araweté com seu neném. Para nós, os Kayapó eram pessoas distantes, diferentes, mas pareciam parentes. Porque quando a gente falava do tio Eurico falava também dos indígenas do Xingu. Meu tio só pôde voltar para a Áustria depois do fim da guerra, em 1948. Eu tinha 9 anos e era coroinha, então eu lembro muito bem quando ele chegou. Meu tio fazia palestras, sabe, com slides. E ele mostrou muito sol nascendo, pôr do sol… Mas meu tio tinha a sua ideia a respeito dos índios, com as quais eu não compartilharia hoje. Eu tive outra visão.

- Qual era a ideia dele?
Dom Erwin - A ideia dele, e é preciso entender que ele era filho do tempo dele, era a de “civilizar”, “apaziguar”, palavras que não me passam pelos lábios. Não é por aí.

- É por onde?
Dom Erwin - São povos diferentes. E nós os respeitamos na sua alteridade. E não apenas os respeitamos, precisamos dar um passo a mais. Nós os amamos. Eu fiz essa experiência. Lembro quando fui para uma aldeia aqui, dos Kayapó, e eu não falava uma palavra em kayapó. Nada. Eu disse: “Nunca mais eu piso nessa aldeia sem saber kayapó”. E aprendi. Não vou dizer que falo do mesmo jeito que eu falo português, mas aprendi. E, na segunda vez em que fui lá, você não imagina. Meu Deus! O sorriso mais largo e mais amigo, mais íntimo, eu diria: “Agora ele é nosso, ele fala a nossa língua”. Eles sabem que a gente se esforça e, através da comunicação por palavras, compreendemos o mundo deles.

- Quando o senhor estava em Koblach, sua cidade natal na Áustria, que movimento interno fez com que o senhor atravessasse o oceano e ficasse aqui por quase meio século, já? O que o levou a fazer um movimento tão largo, tão radical?
Dom Erwin - Eu era um jovem como qualquer outro. Estudei, fiz faculdade de Filosofia, tocava violão, fazia teatro. Tenho uma juventude muito bonita, com muitos amigos e amigas. Depois veio o pessoal de outras províncias, que não falavam a nossa língua, o nosso dialeto. E eram colocados à margem. E isso me doía. Mas por quê? Simplesmente porque são diferentes, porque falam outra língua, são excluídos? Nós começamos, então, na juventude, a criar nossos movimentos e a buscar essa gente que ficava na margem. Nós conseguimos integrá-los. Foi nesse momento, ao me confrontar com a exclusão pela diferença, que surgiu a ideia de ser padre. Estudei Teologia, me ordenei. Era da mesma congregação do meu tio, dos Missionários do Sangue de Cristo. Naquele tempo, meus superiores queriam que eu continuasse os estudos de filologia antiga: grego e latim. Eu gosto disso até hoje. Leio a Bíblia em grego, o Novo Testamento…. Mas, de repente caiu a ficha: “Eu vou para o Xingu”. Quer dizer, a gente não dizia: “Eu vou para o Brasil”. A gente dizia: “Eu vou para o Xingu”.

- Por que “eu vou para o Xingu”?
Dom Erwin - Acho que aí tem também toda a história da criança, que eu nunca esqueci. O Xingu era exatamente onde estão os Kayapó. E não apenas os Kayapó, mas seringueiros, pescadores, e uma cidadezinha miúda, pequenininha, que era Altamira. Altamira em 1950 tinha 1.800 habitantes. E eu então sonhei com isso. E disse para os superiores que queria ir para o Xingu: era 12 de janeiro de 1965. Ordenei-me padre em julho de 1965. Despedi-me de casa no dia 2 de novembro, aniversário do meu pai. Fui para Hamburgo, no norte da Alemanha, e vim com um cargueiro. Eram só dois passageiros, fora a tripulação. Eu nunca tinha visto mar, esse tipo de coisa. Era um rapaz novo, 26 anos. E atravessei o Atlântico.

- Quantos dias, naquela época?
Dom Erwin - Nós saímos no dia 4, à noite, e depois atracamos em Tenerife, nas Ilhas Canárias, no dia 11 de novembro. Passamos lá um dia, zarpamos de novo e chegamos no dia 18. Eram 4h da tarde quando pisei pela primeira vez em terra brasileira, em São Luís do Maranhão, onde fiquei quatro dias, antes de seguir viagem, ainda de navio, para Belém. Lá em São Luís dormi no convento dos franciscanos e comecei a aprender português.

- Não sabia nada?
Dom Erwin - Nada.

- O que tinha na sua mala?
Dom Erwin - Eu não trouxe lembranças da minha terra, não trouxe nada. Uma ou outra foto da família. O que eu trouxe eram coisas que eu queria dar para as crianças daqui. Porque o pessoal de lá me encheu de mil e uma coisas pra trazer. Veio tanta criança aqui nesta casa: “Quem é o padre que trouxe boneca?”. Fiquei feliz da vida. Boneca pra cá e pra lá. Depois surgiu um problema, porque alguém disse: “Mas o senhor deu boneca até para crente, e nós não ganhamos ainda nada”. E eu respondi: “Vou perguntar se era crente ou católico? Para mim se tratava de uma boneca – e boneca bonita!”. De coisas pessoais eu só trouxe os cadernos do tempo da universidade, tanto da faculdade de Filosofia quanto da de Teologia. Tenho até hoje! Fora isso, um crucifixo que ganhei e um cobertor. Até hoje eu tenho esse cobertor. Está na minha cama.

- Qual a diferença que o senhor sentiu entre o Xingu mítico, do seu imaginário, e o Xingu real, daquele primeiro olhar?
Dom Erwin - O Xingu me impressionou de uma maneira que eu nunca tinha sentido. Porque lá na Áustria nós temos o rio Reno, mas é um igarapé, em comparação com isso aqui. Então, na primeira vez que vi, em 21 de dezembro de 1965, a bordo de um avião DC3 da Cruzeiro, vindo de Belém, Nossa Senhora, que maravilha! Eu fiquei tão encantado com essa terra, e até hoje estou. E essa é uma das razões de ter reservas muito grandes quanto à destruição que está pairando sobre o Xingu e sobre todos nós. Eu fiquei tão impressionado, que faltaram palavras. Acho que perdi o fôlego. Não era um chorar… Era uma alegria. Uma mistura de alegria e de se maravilhar por alguma coisa. Você fica olhando e olhando… Você não precisa falar, você assimila, por assim dizer, essa maravilha toda. E fica encantado. Utiliza-se no português a palavra “encantado”. O Xingu encanta.

- Por quê?
Dom Erwin - O Xingu é diferente de todos os outros rios do mundo, ao menos daqueles que eu conheço. Talvez algo mítico, também, por causa dos povos indígenas que há milhares de anos vivem aqui. Então, eu vejo como os índios veem. Os Kayapó não chamam de Xingu, chamam de Bytire. “Tire” significa grande, majestoso. O “by”, segundo a explicação de um velho kayapó, quer dizer algo muito misterioso, inexprimível. E, por isso, sagrado, intocável, inviolável. Eu disse: “Aqui eu vou viver”. Eu nunca pensei em voltar, sabia? Nunca.

- O senhor sente que esta é a sua terra?
Dom Erwin - Eu não vou negar as raízes, claro… O mundo de lá agora é diferente, e eu me sinto um peixe fora d’água. Passo um mês na Áustria, mas depois volto para cá. A minha vida é viver aqui.

- No Brasil inteiro, e especialmente no Norte, existe o uso político de um sentimento que pode ser resumido pela seguinte frase: “Os gringos estão invadindo a Amazônia”. O senhor é tratado como um gringo?
Dom Erwin – Não. Nunca fui. Também o pessoal raramente me pergunta onde eu nasci. Naturalizei-me brasileiro. Tenho passaporte brasileiro, carteira de identidade, título de eleitor, tudo.

- O senhor é brasileiro?
Dom Erwin – Sou.

- Um brasileiro que nasceu na Áustria… Eu já vi o senhor dizendo isso.
Dom Erwin - Sempre digo isso: um brasileiro nascido na Áustria. Não fui mandado para cá. Foi uma decisão minha. Eu me identifiquei com o Xingu, com o Brasil. Claro que não nasci aqui, meus pais e meus antepassados são de outro país. Meus ancestrais já moravam lá em 1400 e pouco. Trata-se de uma família muito tradicional. Mas cada um faz a sua escolha. Quando cheguei aqui, eu sabia que ia ficar. Eu podia ter voltado no dia seguinte, se eu não me agradasse. Tem muito trabalho em qualquer canto do mundo. Mas nem por um segundo isso me passou pela cabeça.

Dom Erwin Krautler: “Eu nunca pensei que o Lula pudesse mentir na minha cara” – Parte 3



Movimento Xingú Vivo

 
- O senhor é uma das vozes mais críticas contra Belo Monte. Por que o senhor não quer uma hidrelétrica no Xingu?
Dom Erwin – Altamira sofreu o primeiro “choque” com a construção da Transamazônica. Eu me lembro de quando chegou aqui o presidente Médici (Emílio Garrastazu Médici, general que foi presidente do Brasil no período mais violento da ditadura militar, de 1969 a 1974). Ele deu início às obras, no lugar chamado “Pau do Presidente”. Você foi lá ver (o “pau do Presidente”)?

- Ainda não…
Dom Erwin - Não perde nada. Só ficou aquele tronco da castanheira, a placa roubaram… Eliane, você naturalmente sabe que aqui se usa essa expressão “pau do presidente” com certa malícia!

- Posso imaginar… O senhor presenciou a derrubada da castanheira?
Dom Erwin – Sim. Todo o pessoal delirando no palanque… delirando mesmo! Batendo palmas! Gente, derrubando uma árvore daquelas! E dizendo que era o progresso que estava chegando. Cortou-me o coração… Como é que pode? Aplaudir que a rainha das árvores do Pará ou da Amazônia tomba, e com um estrooondo tremendo. Como é possível? Está escrito na placa que roubaram: “O presidente da República dá início à conquista deste gigantesco mundo verde”. E havia uma placa em uma das três colunas feias, bem feias que fizeram: “Depois de XX meses o presidente voltará para inaugurar, dando mais um passo para integrar…”. Era essa a época: “Integrar para não entregar” e “Brasil, ame-o ou deixe-o”… Coisas desse tipo. Eu vi.

- Isso tudo o senhor estava assistindo de onde?
Dom Erwin - No meio do povo que foi lá ver o presidente. Tinha dois bispos, vestidos com trajes episcopais, que pensavam que seriam chamados a subir no palanque: o bispo daqui, que era meu tio, e o bispo de Marabá. Não os chamaram lá para cima porque o de Marabá não era amigo dos militares. Ele tinha denunciado um monte de coisas. Naquele tempo era a guerrilha do Araguaia, então não chamaram os bispos para subir no palanque… Eu pensei: “Bem feito!”. Mas eu não tinha coragem de dar minha opinião, porque era menino recém-chegado. Mas os bispos também achavam que o progresso estava chegando… Altamira era uma cidade esquecida, no meio da mata.

- É muito simbólico derrubar uma castanheira, uma árvore gigante, como símbolo da chegada do progresso e do desenvolvimento, não?
Dom Erwin – Depois se falava em “benefício”. Tem que “beneficiar” a terra para você encaminhar, por exemplo, um crédito bancário. Então tinha que derrubar.

- O que era Altamira antes da Transamazônica?
Dom Erwin - Era uma cidadezinha esquecida. De dia faltava água, de noite faltava luz. Tinha um motor da prefeitura que tinha funcionado pela última vez nos 15 anos da filha do prefeito. Nos anos 60 queriam fazer uma picada para Santarém para ligá-la ao mundo e mataram não sei quantos índios. Depois veio a Transamazônica. Um compadre meu, que trabalhava como telegrafista naquele tempo, disse: “Olha, compadre, agora vem o progresso. Tinha um telegrama de um tal de Incra dizendo que vão construir uma estrada. Estão dizendo que vai chover dinheiro”.

- Um discurso muito parecido com o de agora, não? Vai “chover dinheiro”, o progresso vai chegar…
Dom Erwin – Essa é a ideia: o “progresso” vai desbravar toda essa região. Então, de fato, começou no quilômetro 5, com a derrubada daquela árvore, onde tudo era mato. E hoje você vê tudo descampado. O traçado da Transamazônica já foi feito assim porque se pensou em futuras hidrelétricas, como Belo Monte. Nos anos 70 já fizeram toda a pesquisa. Em 1950, Altamira tinha 1.200 habitantes. Em 1960, 2.800. E depois, acho que de 1965 em diante, uns 4 mil, 5 mil. Mas depois veio o boom… o pessoal veio do Nordeste, primeiro, depois do Sul. Aí Altamira ganhou outras feições. E com a Transamazônica, em 1975, se falava numa possível hidrelétrica, mas era uma coisa muito distante. Nos anos 80, então, a coisa já pegou mais vulto, até que, em fevereiro de 1989, vieram os índios…

- O senhor estava presente no I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu, em 1989? (Na ocasião, Tuíra, índia kayapó, encostou a lâmina do seu facão no rosto de Antonio Carlos Muniz Lopes, da Eletronorte, para expressar sua indignação contra o projeto de Belo Monte, naquela época chamado de Kararaô. A foto da cena correu o mundo).
Dom Erwin – Não. Eu estava na Suíça… Os índios vieram falar comigo. Queriam marcar o I Encontro dos Povos Indígenas do Xingu. Então eu encontrei, naquele tempo, não vou dizer o primeiro escalão, mas o segundo escalão do Banco Mundial, em Berna. E me avisaram: o Banco Mundial só vai fornecer o crédito (para a obra) se a cláusula indígena e a cláusula ambiental forem observadas e cumpridas. Isso, para mim, foi o sinal de arquivamento. Pensei: esse perigo já passou. Enquanto eu estava lá, ocorreu o episódio com a Tuíra, aqui. Eu conheço muito bem esse Antonio Carlos Muniz…

- Como o senhor o conheceu?
Dom Erwin – Ele me convidou, quando estive em Brasília, nos anos 90, para o gabinete dele, e me mostrou todas as coisas. Ele queria cativar-me, conquistar-me para o projeto. Fui muito bem tratado, sabia? Mas quando a gente é tratado tão bem, com beijinho etc, é preciso ficar cismado. Quando é assim, tem boi na linha. Não é porque te querem bem, mas eles querem te preparar, querem aproveitar que você está sozinho e te convencer.

- Brasília o assusta, nesse sentido?
Dom Erwin – Sim, me assusta. Meu Deus! Estive duas vezes com o Lula, também, e com outras pessoas. Eu tinha contatos bons, gente boa em Brasília que estava no nosso lado. Agora, ultimamente, estamos num certo isolamento. Porque aquele povo que antigamente lutava conosco, que estava do nosso lado, que defendia a mesma coisa, que lutou pela mesma causa, agora defende o contrário.

- Quando o Lula foi eleito, o movimento social da Amazônia tinha certeza de que Belo Monte estava definitivamente sepultada. Como foram seus encontros com o Lula?
Dom Erwin – A primeira vez foi em 19 de março de 2009. Fui com um advogado do CIMI (Conselho Indigenista Missionário), amigo meu de longa data, e com um assessor político do CIMI, que agora foi conquistado para ser membro do gabinete da presidente. Fiquei com o Lula uns 20 minutos, talvez meia-hora. Apresentei as nossas angústias e as nossas preocupações, e ele foi o primeiro a insistir que houvesse um diálogo construtivo, que se avaliasse os prós e os contras. Eu disse: “Olha, eu queria que o senhor ouvisse o povo”. Ele perguntou: “Que povo?”. Eu disse: “O povo do Xingu, os representantes do povo do Xingu”. Ele disse (Dom Erwin imita a voz e o jeito de Lula): “Manda chamar!”. Acertamos então uma segunda visita. Lembro que, ao final desse primeiro encontro, eu disse: “Lembranças para Marisa, sua esposa”. O Lula ficou até assustado, porque não estava acostumado a receber saudações para sua esposa. Quando alguém se encontra com o presidente, não lembra que ele é casado. Senti o Lula como alguém muito amigo, simpático.

- Foi a primeira vez que o senhor o viu?
Dom Erwin – Não, já tinha visto em campanha.

- Como o senhor percebeu o Lula?
Dom Erwin - Ele era aquele trator, falava pra cá e pra lá. A gente via que ele estava em campanha, que a gente era uma peça lá daquela campanha. Dá a mão, tira foto… Mas, em 2009, foi um encontro… muito amistoso. Eu ainda esperava que ele fosse se convencer de que não era por aí. Até escrevi: “Graças a Deus, Lula entendeu”. E nós marcamos outra audiência, em 22 de julho do mesmo ano. Foi muito interessante. Levamos dois índios, dois ribeirinhos, a Antonia Melo (uma das principais lideranças do Xingu), dois procuradores da República e o professor Célio Bermann (do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP). Mas o Gilberto Carvalho (chefe de gabinete do então presidente Lula, hoje ministro da Secretaria Geral da Presidência da República no governo Dilma) queria que só eu falasse em nome de todos. Do outro lado havia o setor energético do governo, todos os figurões… Nós, de um lado, humiiildes, coitados, nos sentindo como um peixe fora d’água e, do lado de lá, essa gente que mandava e até hoje está mandando… Mas a gente tinha segurança daquilo que nós queríamos. E, quando o Lula chegou, ele sentou-se ao meu lado. Eu disse: “Presidente, o senhor vai ter que ouvir esse povo. Esse povo veio de longe, quer falar com o senhor. Não pode pegar só dois que representem os outros, porque eles vão sair com uma frustração que não tem tamanho!”. O Lula então disse (e Dom Erwin imita o vozeirão do então presidente): “Deixa comigo! Vamos fazer!”. Então, de fato, ele deu a palavra a todos.

- O que eles disseram?
Dom Erwin – O povo falou de sua angústia, de que não podiam deixar a sua terra. Depois, os procuradores da República falaram das inconstitucionalidades do projeto de Belo Monte, de que os índios não tinham sido ouvidos. O Célio Bermann colocou então os pontos técnicos e financeiros que tornavam o projeto inviável. E aí é que eu vi o Lula levando susto. Ele olhou para a turma dele, dizendo: “Vocês vão ter que dar uma resposta imediata para o professor”. Mas esta resposta não veio até hoje.

- O senhor acha que o Lula estava sendo sincero ou era teatro político?
Dom Erwin – Era teatro, jogo político… Depois ele me segurou no braço e disse (imitando a voz): “Dom Erwin, nós não vamos empurrar esse projeto goela abaixo de quem quer que seja. Conte comigo. O diálogo tem que continuar. Segundo: o Brasil tem uma grande dívida com os atingidos por barragens, e essa dívida, até hoje, não foi sanada. Tem muita gente perambulando por aí que não recebeu a indenização, e a vida praticamente foi cortada para eles. Terceiro: Nós não vamos repetir (a hidrelétrica de) Balbina. Balbina é um monumento à insanidade. E quarto: o projeto só vai sair se for vantagem para todos”.

- O Lula disse isso?
Dom Erwin - Disse! Textualmente, sentado ao meu lado, me segurando nesse braço (mostra o braço esquerdo). Eu pensei, bom… o presidente não iria falar isso se não fosse verdade. Mas, as mulheres têm mais sensibilidade, têm mais intuição. A comadre Antonia Melo não quis nem tirar retrato. Os outros todos bateram foto com o Lula. Eu fiquei até estranhando, mas ela sentiu, naquele tempo, que era apenas um show. Engraçado, as mulheres, neste ponto, têm uma intuição que os homens não têm. Eu pensei: “Não, o Lula não vai mentir na minha cara!”. E ainda por cima segurando no meu braço… (Imita novamente a voz de Lula): “Dom Erwiiiin….”.

- O senhor imita bem a voz do Lula… O senhor saiu aliviado?
Dom Erwin – Aliviado não vou dizer, mas muito esperançoso, porque no final ele ainda disse: “O diálogo vai continuar, nós vamos nos encontrar de novo”. E aí, de repente, eu me dei conta de que não houve diálogo nenhum. Porque ele falou, mas não perguntou quais eram as nossas ideias, não perguntou o que nós achávamos, nem como pensávamos que seria possível resolver certos impasses.

- Como foi o clima dessa reunião?
Dom Erwin – A primeira parte da audiência com o Lula foi sem ele. Só com o setor energético, Funai e outras instâncias do governo. Esse pessoal do governo xingou os procuradores da República, dizendo que eles não entendiam nada, que não era do ramo deles, que estavam se metendo em assunto que não dizia respeito a eles. E até foram alteando a voz, viu? Fiquei até assustado, pensando que a educação tinha passado muito longe daqueles senhores. Lembrei-me de que quem grita revela que não tem argumentos para convencer o interlocutor. No fundo, essa turma tinha que admitir que a razão e o bom senso estavam do nosso lado. Assim, optaram por atitudes autoritárias e de prepotência, querendo nos intimidar, dizendo que não entendíamos nada do assunto. Do nosso lado, ninguém perdeu em nenhum momento a compostura. Não respondemos aos gritos. Os berros saíram da goela deles. Neste exato momento, o Lula entrou “em cena”, perguntando: “Vocês estão vivos?”. Porque era um berreiro, não era diálogo. A entrada do Lula na sala parecia uma ducha de água fria em cima da turma dele. De repente, eles se recompuseram. Achei ridículo! Pareciam meninos briguentos na sala de aula que, quando o professor entra de repente, ficam com medo de algum castigo ou de nota baixa e então se ajeitam. Aí o Lula me cumprimentou efusivamente, como se fôssemos amigos de longa data, “companheiros” de luta desde a primeira hora. E, não nego, me senti bem à vontade e agradeci a ele por ter nos recebido, elogiando esse gesto aberto de busca de “diálogo”. Pois naquele momento acreditei realmente no diálogo.

- E não foi?
Dom Erwin - Só caí na real quando, em outubro do mesmo ano, passei uma semana em Brasília esperando a continuação desse diálogo. A audiência foi adiada de uma manhã para a tarde, de um dia para o outro, até que, finalmente, recebi um telefonema na sexta-feira à noite em que Gilberto Carvalho me pedia desculpas, dizendo que não era mais possível ser recebido pelo presidente, pois ele tinha precisado viajar para a Venezuela. Essa viagem certamente já estava programada no início daquela semana e servia de pretexto para evitar o constrangimento de ser obrigado a me dizer que o presidente e seu staff não estavam mais interessados na continuação do “diálogo”. Em 23 de setembro de 2009 eu tinha escrito uma carta ao Lula, tratando-o ainda de “meu presidente”. Nunca recebi resposta.

- O senhor tinha acreditado na promessa de diálogo feita pelo Lula?
Dom Erwin – Eu acreditei. Havíamos dado um passo importante, porque havíamos chegado até lá. E agora, aquele setor do governo, embora tenha gritado antes, teria que dar resposta por ordem do presidente. Mas nunca houve diálogo. Naquele encontro nós mostramos o que ia acontecer, o absurdo dessa obra em todos os sentidos, inclusive em sua viabilidade financeira. E ninguém nunca nos respondeu nos provando que estávamos errados. O Célio Bermann falou, e eu entreguei para o Lula um resumo da posição do Oswaldo Sevá Filho (professor e pesquisador de Engenharia Mecânica da Unicamp), que não pôde nos acompanhar porque estava doente, assim como a posição de outros grandes professores e pesquisadores dessa área no Brasil. E todos mostravam a inviabilidade de Belo Monte, assim como a destruição que ela vai provocar. Por que esse povo não recebeu uma resposta?

- Por quê?
Dom Erwin – Porque não há resposta. Os argumentos são imbatíveis. Tem que desmontar a opinião das maiores cabeças dessa área no Brasil, tem que ter argumentos fundamentados na realidade, mas o governo não tem. E, se não tem, precisaria assumir: “Nós temos que fazer isso. É uma decisão política, e não técnica”. Se a decisão fosse técnica, Belo Monte jamais seria feita. Por isso, o diálogo foi abortado desde o início. Aquilo que Lula fez era só um show para agradar ao bispo.

Dom Erwin Kräutler: “Há gente do PT que parece fanático religioso” – parte 4

Movimento Xingú Vivo

 
- No caso de Belo Monte, o governo defende que os índios não serão atingidos. Mas muitos ambientalistas e pesquisadores refutam essa afirmação, mostrando que não é possível barrar um rio sem que isso afete as comunidades que vivem em torno dele. Como o senhor vê essa questão?
Dom Erwin - Se o projeto de Belo Monte se concretizar, esses povos que moram na Volta Grande do Xingu serão atingidos. O governo nega, porque, para o governo, atingir o povo indígena é só quando se inunda, alaga a aldeia. A inundação, de fato, não vai acontecer. Mas o contrário acontece: corta-se a água. Se você observar o mapa, vai perceber que, nos 100 quilômetros da Volta Grande do Xingu, vai se chegar a um mínimo de água. Tenho absoluta certeza de que não haverá mais condição de pescar e de abastecer esses povos. Depois, será prejudicada a agricultura. E, por fim, eles não terão como se locomover. Ficarão barrados. Um povo submetido a uma vida nessas condições não sobrevive. Ou sobrevive por um tempo, depois acaba. Vão se esfacelar. Talvez se tornem índios citadinos. Perderão a cultura, perderão a língua. Estarão aqui, em algum subúrbio de Altamira. Não vou dizer que deixarão de serem índios, mas já não serão mais indígenas que vivem dentro de seu próprio contexto, com suas organizações e com a sua língua.

- É uma cultura que morre, um jeito de estar no mundo que morre, é isso?
Dom Erwin – Temos que fazer uma distinção: existe a morte física e existe a morte cultural. E aqui no Xingu, por causa de Belo Monte, poderão acontecer as duas coisas. A morte cultural, porque arrancarão deles a possibilidade de sobreviver em determinado espaço que, para eles, é muito significativo, porque é o chão de seus mitos, de seus ritos, é onde enterraram seus antepassados. Se você arranca isso dos indígenas, você corta o cordão umbilical deles com a terra. Precisamos compreender que eles têm outro relacionamento com a terra, diferente do nosso. Para nós, a terra é coisa que se compra e se vende. Para eles, não. Além da morte cultural, é provável que também aconteça a morte física, porque eles não estão preparados para viver na cidade. Os Arara, por exemplo, foram dizimados por doenças depois de serem contatados. Essa história nunca foi bem contada.

- O senhor afirma que Belo Monte é só a primeira de muitas barragens, uma forma de vencer a resistência para impor um projeto que é muito maior e que vai destruir o Xingu por completo. Como o senhor tem tanta certeza disso?
Dom Erwin – Todos os argumentos científicos sérios mostram que essa hidrelétrica não vai funcionar durante o ano todo. No verão, o Xingu baixa muito de nível e não existirá volume de água suficiente para fazer funcionar as turbinas. Portanto, vão investir bilhões e bilhões de reais em uma hidrelétrica que durante meses não funciona. Isso é um absurdo. E o governo sabe perfeitamente que é um absurdo. Então, é lógico que Belo Monte será só a primeira barragem. É preciso fazer tudo para que a população aceite essa primeira barragem, depois de décadas de resistência. Para, então, virem as outras. Porque só com as outras Belo Monte será um bom negócio. A segunda, a terceira e a quarta vão barrar o rio até lá em cima, em São Félix do Xingu. E aí, todas essas áreas que estão nas margens esquerda e direita do Xingu, que são áreas indígenas já homologadas, vão sofrer. E aí, os Assurini, os Araweté, os Paracanã, os Arara, e os Kayapó vão ser atingidos. É por isso que os Kayapó lá de cima, até mesmo os do Parque Nacional do Xingu, estão contra, embora estejam a mil quilômetros de distância. Eles já conhecem essa história. Depois de construir a primeira barragem, a tempestade passa, a resistência diminui – e aí completar a obra fica mais fácil. Esta é a estratégia do Governo. E aí eu afirmo: é o golpe fatal. Vão matar os índios, cultural e fisicamente.

- Parte da população brasileira acredita que os índios têm terra demais e há, inclusive, aqueles que acreditam que os indígenas são um entrave para o desenvolvimento. Por que parte dos brasileiros pensa assim?
Dom Erwin – Bom, primeiro precisamos entender que, para os índios, a terra não é uma mercadoria. Vou contar uma história real para que as pessoas entendam melhor essa relação totalmente diversa que o índio tem com a terra. Um branco mostrou um papel em que estava escrito: “República Federativa do Brasil, Título Definitivo de Terras, deste igarapé até o outro, fazendo frente com o rio Xingu e de fundos 2, 3, 5, 10 quilômetros”. Então, o índio perguntou: “Como você pode, com esse papel, dizer que é dono? Como? É um papel. Você fez a mata? Não. E a caça que está dentro da mata? Não. Você fez o rio e os peixes que estão no rio? Não. Você faz chover? Não. Você faz o sol brilhar? Não. Então, como você pode me mostrar um pedaço de papel e dizer que é dono?”.

- São formas de ver o mundo totalmente opostas, né? Só que uma delas tem o poder de impor sua visão de mundo como verdade única…
Dom Erwin - Essa cultura se choca com a cultura da sociedade majoritária, que trata a terra como mercadoria. E como mercadoria a terra tem de ser aproveitada, porque ela só faz sentido se for exaurida. Então, “aproveita” até arrasar a terra. Enquanto não tiver tirado a última gota de sangue, isto é, enquanto não tiver arrancado o minério e todas as riquezas do solo e do subsolo, o homem forjado nessa mentalidade não estará satisfeito. É claro, portanto, que as pessoas que veem a terra como mercadoria, num sistema de livre mercado, vão achar que o índio tem terra demais. O interessante é que essas mesmas pessoas nunca disseram: “Tal fazendeiro tem terra demais”. Não, isso não. Quando um fazendeiro bota uma placa e diz que a terra é dele – e aqui a grilagem de terra, como se sabe, é enorme, essas mesmas pessoas não reclamam. Mas, quando se faz a demarcação de uma área indígena, todo mundo grita. E, o mais curioso, há cidadãos que de repente aprendem geografia: “Eles têm uma terra do tamanho da Bélgica! Têm uma terra do tamanho de Portugal, uma terra do tamanho da Suíça!”.

- O que é terra, para os índios?
Dom Erwin – Para os índios, terra é vida. E, para o sistema da maioria dos brasileiros, terra é mercadoria. Talvez se consiga ainda fazer com que uns e outros entendam, pelo menos, que, ao demarcarmos as áreas indígenas na Amazônia, nós salvamos um pedaço da Amazônia.

- O senhor acredita que parte da Amazônia ainda está preservada por causa desse embate de visões de mundo?
Dom Erwin - Sim. E as pessoas precisam lembrar que a Amazônia tem uma função reguladora do clima mundial. Quer dizer: se a Amazônia acaba, o gaúcho lá embaixo, o mineiro, o capixaba vão sofrer as consequências. E nós ainda não sabemos qual é o alcance real dessas consequências. Se a temperatura aumentar três ou quatro graus, só para ficar num exemplo, será terrível! A verdade é que as consequências da destruição da Amazônia não cessarão nas fronteiras nem do Norte, nem do Brasil. Assim, os brasileiros de todas as regiões deveriam agradecer que há áreas de preservação indígena, há reservas extrativistas e há parques nacionais. É só porque existem essas reservas que há uma parte da Amazônia ainda preservada. Mas, infelizmente, as pessoas não percebem que a destruição da Amazônia também atingirá a sua vida.

- É curioso como as pessoas se sentem a salvo, não?
Dom Erwin – Pelas informações que recebi, estão planejadas 61 hidrelétricas para o Brasil, a maioria delas aqui na Amazônia. E mesmo a EPE (Empresa de Pesquisa Energética) não nega que serão atingidas diretamente áreas indígenas e também parques nacionais. Falam na maior cara de pau. Então, eu gostaria de saber o que vai sobrar.

- A maioria dos setores da sociedade, inclusive o governo, fala em “desenvolvimento sustentável”. Ninguém diz que não quer o desenvolvimento sustentável. Mas, na prática, o discurso que atravessa a sociedade é o de uma oposição entre desenvolvimento e meio ambiente. Por que o senhor acha que essa visão ainda persiste com tanta força?
Dom Erwin – É um mito. Que desenvolvimento é esse? Quem vai ser beneficiado com esse desenvolvimento? Basta ver hoje a situação em que está Altamira. E a obra está só no começo. Das condicionantes prometidas, nada. De 40 condicionantes colocadas pelo próprio Ibama, e outras 24 da Funai, quase nada. Não tem infraestrutura, nem habitação, nem saúde, nem educação. Para mim, desenvolvimento é dar à população a possibilidade de viver com dignidade. Ou seja: vamos aplicar em saúde, em educação, em transporte, em habitação, em saneamento básico e em segurança. Mas, aqui, desenvolvimento é fazer dinheiro, é garantir energia para as grandes multinacionais e exportar matérias-primas. Vai beneficiar a quem esse desenvolvimento? O pessoal ainda não acordou. E esses grupos, a favor de Belo Monte e dos grandes projetos para a Amazônia, disseminam a falsa ideia de que a gente é contra o desenvolvimento, contra o progresso. Mas nós sempre lutamos pela saúde nessa cidade, pela educação, pelo saneamento básico. Esse desenvolvimento que pregam é para uns poucos, não é para o povo.

- A população tem medo de um “apagão”…
Dom Erwin – Sim. Esses grupos, favoráveis às grandes obras na Amazônia, ficam também operando com o fantasma do blecaute, do apagão. Ficam dizendo: “Olhe, os gaúchos que se cuidem, porque no inverno gaúcho não terá mais chuveiro elétrico, e depois não vão mais poder ver a novela das oito”. Mentira! Essa energia será exportada em forma de lingotes de alumínio. E ela não é nada limpa… E muito menos barata. Nós não temos excelentes universidades, cientistas de primeira classe, tecnologia de ponta? Por que não se investe agora para procurar fontes alternativas de energia? Aqui, nós temos sol das seis da manhã às sete da noite. No sul da Alemanha, por exemplo, não há mais uma casa que não tenha placa solar. E olha que eles têm um inverno comprido. Lá, em dezembro, o sol nasce às 9h, 10h, e às 5h da tarde já está escuro. E nós, aqui, às 6h já assistimos ao sol nascer. Temos sol até às 7h da noite. Por que não aproveitamos essa dádiva divina? E depois existe o litoral… O Brasil tem um litoral enorme, que não tem fim. Por que não aproveita um pedaço, pelo menos, onde não há turismo, para investir mais em energia eólica? E, ainda, grande parte dos linhões de transmissão está obsoleta. Perde-se uma enormidade de energia por causa dessa deterioração. Por que não investir no reparo e no restauro dos linhões de transmissão?

- Por que o senhor acha que o governo quer tanto fazer Belo Monte?
Dom Erwin - Esta é minha grande pergunta. Eu não tenho resposta. Apenas vou adivinhando. Por que o Lula era contra e de repente está a favor? Por que o PT era contra Belo Monte e depois de chegar ao governo passou a defender exatamente aquilo que antes combatia? Por que os deputados que nós elegemos aqui hoje são a favor e não sabem nem por quê? O que há por trás? Por que essa metamorfose camaleônica? Na campanha era contra, como é o caso do deputado Zé Geraldo (PT-PA), que andava aqui embaixo, na beira do rio, dando as mãos e rezando, de camisa branca, participando de místicas. E agora, meu Deus! Ele defende exatamente o contrário: “Belo Monte tem que sair, a gente não pode colocar a Amazônia debaixo de uma redoma”. Ninguém está propondo uma Amazônia intocável. O que nós que nos unimos na posição contra Belo Monte defendemos é que as riquezas da Amazônia sejam usufruídas de uma maneira inteligente – e não de uma maneira burra.

- Historicamente, o movimento de resistência à Belo Monte sempre apoiou o Lula. O que aconteceu?
Dom Erwin – Aqui, a resistência contra Belo Monte se identificou com o PT, ou o PT se identificou com a resistência contra Belo Monte. Isso até o Lula tomar posse. Quando descobrimos que o Lula tinha mudado de ideia, caímos das nuvens. Meu Deus, como é que pode? E então os petistas daqui também mudaram de lado. Começaram, inclusive, a hostilizar as pessoas que ainda defendiam o Xingu contra esse monstro. Há gente que antigamente sentava aqui nesta sala e que hoje não aparece mais, porque sabe que o bispo permanece na sua posição contra Belo Monte. Há gente do PT que parece fanático religioso. Fanático religioso é terrível, né?

- Por quê?
Dom Erwin – Porque não tem discussão, não tem diálogo. Com fanático você nunca vai entabular um diálogo que preste, ele já se julga dono da verdade, tem a sua certeza. Então, o PT diz: “As razões defendidas pelo partido têm que estar acima da própria consciência dos partidários”. E muita gente reza pela cartilha do PT porque acha que aí está tudo resolvido. Na realidade eu não posso, por causa da minha filiação partidária, ter opinião própria, ou opinião divergente. Aqui, quem tinha opinião própria e não quis trair a sua consciência, como Antonia Melo, se desfiliou do partido.

- Foi um golpe muito grande essa mudança de posição com relação à Belo Monte?
Dom Erwin - Foi uma traição, um golpe tremendo. É muito duro você ser traído por pessoas a quem você deu as mãos. Inclusive foram perguntar, à boca pequena: (fala baixinho): “Bispo, em quem vai votar? O senhor não pode falar isso no sermão, mas em quem o senhor vai votar?”. Eu disse: “Eu vou votar no Lula. Afinal de contas, é o partido que nasceu e surgiu das bases, etc. Temos que lutar por outro Brasil, gente”. Tempos depois o povo passou a dizer: “Agora o bispo está engolindo…”.

- Está sendo difícil engolir o que o senhor chama de “traição”?
Dom Erwin – Eu nunca falei em público sobre o meu voto, mas todo mundo sabia que nós queríamos um Brasil diferente, um Brasil justo, fraterno, sem corrupção, um Brasil com ética e com todos esses ideais que nós tínhamos e ainda defendemos. Mas os caciques do PT da primeira hora foram embora. Quem está aí dos antigos? Se afastaram. Notaram que foram traídos também. Eu me sinto traído. Agora dizem: “O bispo era a favor dessa petezada”. E agora eu tenho que engolir os sapos…