terça-feira, 17 de julho de 2012

Empresa “enrola” nas negociações enquanto pede ação policial para despejo de indígenas

Índios afetados por Belo Monte dizem que negociações não atenderam demandas. Empresa pediu policia em despejo, exigiu multa e punição, e, enquanto não cumpre condicionantes, alegou danos com eventuais atrasos nas obras.



Publicado em 10 de julho de 2012
Movimento Xingu Vivo


Nesta segunda, 9, a empresa Norte Energia realizou a primeira de duas reuniões agendadas para a semana com o grupo de indígenas que ocupa a ensecadeira do canteiro de obras de Pimental desde o dia 21 de junho. Os indígenas montaram um acampamento na barragem e têm impedido o trabalho dos operários no local para exigir o cumprimento de uma série de medidas de mitigação de impactos, previstas por lei, além de outras demandas de compensação pelos danos já sofridos e futuros.

De acordo com Mukuka Xikrin, uma das lideranças mais jovens do acampamento, a empresa não teria dado nenhuma resposta concreta às reivindicações nesta primeira conversa. “Não foi decidido nada, não apresentaram nada e não ficou acertado nada. Pode ser que amanhã seja diferente”, explica o xikrin, cujo grupo (as comunidades do rio Bacajá) foi o primeiro a se reunir com a Norte Energia, junto com os arara e juruna das aldeias da Volta Grande. Nesta terça, devem ser ouvidos os Xypaya, Arara, Kayapo e Curuaia das aldeias do rio Iriri, e Assurini, Arawetê e Parakanã da chamada Rota Xingu.

Outra fonte, que não quis ser identificada, afirmou que a empresa teria prometido que as obrigações pré-existentes no Plano Básico Ambiental Indígena (PBA) e nas ações emergenciais seriam eventualmente cumpridas, e que resolveriam as questões ligadas à saúde, educação e navegabilidade dos rios. As demais demandas compensatórias (carros, casas, motos, e indenizações, entre outros) teriam sido negadas. Uma resposta mais definitiva teria sido prometida para o início da semana que vem.

Enquanto negocia, consórcio solicita despejo com força policial

Apesar de ter se comprometido a negociar as reivindicações apresentadas pelos índios logo no início da ocupação, em 23 de junho o Consórcio Construtor Belo Monte (CCBM) impetrou uma ação de reintegração de posse com pedido de liminar, que solicitou à justiça que “determine a utilização de força policial, dentre ela a Policia Militar, Polícia Federal e a Força de Segurança Nacional para garantir a segurança do Autor [CCBM], de seus funcionários, sua posse e o trabalho dos oficiais de justiça que cumprirão a medida liminar a ser deferida”. Também foi pedida a imposição de uma multa diária, pagamento das custas do processo e dos honorários dos advogados, e o pagamento de prejuízos causados pela impossibilidade de acesso de funcionários e fornecedores ao canteiro de obras.

Com o indeferimento da liminar pela juíza Priscila Pinto de Azevedo no dia 25, no dia 29 o CCBM reiterou o pedido, argumentando indignação diante dos métodos reivindicatórios: “a invasão de áreas do empreendimento com lesão ao patrimônio alheio não é o meio adequado e democrático para movimentos sociais obterem suas reivindicações. Destarte, a cidadania não pode ser vista apenas na perspectiva das reivindicações indígenas (…)”.

Segundo o CCBM, o despejo dos indígenas deveria configurar tanto um castigo quanto um exemplo aos que apresentam “desvio” da conduta considerada adequada pelo consórcio. “A concessão da medida liminar [de despejo] configurara o restabelecimento da ordem social, com caráter não apenas punitivo mas, sobretudo, exemplificativo das corretas condutas que devem nortear o país (…)”, afirma o documento.

A despeito de situação de completa ilegalidade no que tange o cumprimento das condicionantes indígenas e os prazos estabelecidos por lei, e das conseqüentes violações dos direitos, das doenças decorrentes da alteração da qualidade da água e dos impactos no cotidiano das aldeias, o CCBM também buscou inverter a lógica da vitimização no processo, alegando que “a situação de calamidade no caso objurgado poderá ser criada em razão dos prejuízos advindos da paralisação do empreendimento, eis que elevadíssimos e, quiçá, imensuráveis hodiernamente, impactando não apenas no atraso do cronograma da obra, mas nos encargos consectários, podendo ocasionar demissões em massa, rescisões de contratos de subcontratadas, devolução de imóveis e equipamentos, além de desmobilização instantânea dessas questões ponderadas”.

No momento, concomitante ao alegado processo de negociações, corre no Tribunal Regional Federal, em Brasília, um pedindo revisão do indeferimento da liminar, impetrado pelo CCBM no último dia 4 de julho.

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